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A arte de produzir o melhor queijo de búfala da ilha de Marajó

Em 2018, o Brasil atingiu o índice populacional de 208,4 milhões de habitantes, segundo a estimativa do IBGE. Em vista desse quantitativo, fatores comportamentais, culturais e biológicos refletem no comportamento de mercado quando o assunto é a motivação, uma vez que a qualidade do produto é prioridade em termos de consumo, e principalmente, tratando-se de alimentos. Contudo, também é cada vez maior, a preocupação com o ambiente e o tratamento dispensados à matéria prima – os animais. Ainda com todo o aparato tecnológico oferecido pela agroindústria para suprir a demanda alimentar, é necessário o despertar, para a qualidade de vida e bem estar dos animais, em prol da alta rentabilidade, e assim, gerar o mínimo de desperdício e obter boa posição no mercado.

Pensando no contexto de qualidade de vida e bem estar animal para oferecer ao consumidor alimento nutritivo, valorizando os benefícios à saúde, além da satisfação das demandas sensoriais, que o casal de produtores do laticínio de búfala – Queijo do Marajó Fazenda São Victor, Cecília e Marcus Pinheiro, de Salvaterra – Ilha do Marajó, adotaram as melhores práticas para a garantia de conforto junto ao rebanho de búfalos da própria fazenda. 

“Nosso trabalho respeita a preservação dos animais e meio ambiente. Medidas que refletem na qualidade do produto final, que é o queijo, proporcionando versatilidade e muito sabor. Temos a satisfação de apresentar um queijo cremoso, leve, saudável, natural, sem adição de conservantes, e com 100% leite de búfala do rebanho da fazenda”, frisa Cecília.

O produtor Marcus que também é bubalinocultor, com ampla expertise em agronegócio, ressalta que um planejamento bem executado, valorizando as condições naturais para que os animais vivam na zona de conforto e sem estresse, é muito importante para obter êxito em qualquer cadeia produtiva, principalmente, quando se trata de laticínios. “Vários fatores influenciam diretamente na produtividade e qualidade do leite, e consequentemente, nos derivados, entre eles podemos destacar a nutrição, a qualidade de vida e o bem estar do animal e capacitação da equipe com um todo”, explica. Outro fator pontuado pelo profissional em bubalinocultura é sobre o trabalho na composição genética dos búfalos em vista de aumentar a qualidade do leite e laticínios. Ele explica que, para a produção do Queijo do Marajó Fazenda São Victor, optou em ter no rebanho, búfalos da raça Murrah, devido à raça revelar saúde e vigor, com constituição robusta e forte prevalência leiteira, além de ser dócil e incluir exigências de aprumos normais, com cascos fortes e bem conformados. Além dos valores e benefícios alcançados com as práticas de bem-estar animal, a importância do método para a cadeia produtiva é a possibilidade de exploração e atendimento de mercados consumidores mais exigentes, por isso, hoje, os interesses estão voltados em alcançar a qualidade final desejada do produto através do bem-estar.

“Não podemos negar que o conceito “bem-estar” apresenta níveis de adoção e valores, os quais variam em função das diferentes óticas éticas, temporais, culturais e socioeconômicas de cada região. Mas, é importante ressaltar que, é um caminho sem volta e, em longo prazo traz melhorias diversas para o sistema de produção”, explana Marcus.

Bem estar animal

De acordo com a Organização Mundial de Saúde Animal, o bem-estar animal é a maneira como o animal lida com o seu entorno, e dessa forma inclui-se comportamento e sentimentos. Quando se trata de animais de produção, atribui-se a boas condições de bem-estar quando são atendidas o que chamam de “cinco liberdades”, nas quais procura-se adotar e incorporar padrões básicos e mínimos de qualidade de vida para os animais, entre eles destacam-se: livres de fome, sede, má nutrição, dor, lesão, doença, medo, angústia e qualquer sensação de desconforto.

“Cada espécie animal tem o seu metabolismo, suas carências e sua forma de responder ao mundo que lhe cerca. Em cada sistema produtivo, as circunstâncias em que são mantidas e o modo como são manejadas serão diferentes. Portanto, partindo dessa premissa, é necessário respeitar e levar em consideração todos os aspectos naturais do manejo. As boas práticas de manejo na ordenha com as búfalas é fundamental para a obtenção de leite com alta qualidade. Ainda é necessário que o ordenhador seja capaz de perceber as necessidades dos animais sob seus cuidados, e que goste dos animais e de seu trabalho”, sintetiza o bubalinocultor.

Estudos também apontam sobre as qualidades particulares do leite de búfala, as quais são provenientes na maioria das vezes da criação dos búfalos em regiões tropicais. Portanto, visando manter a proteção dos animais nesse sentido, na região norte do Brasil, é possível ter produção e manejo mais eficientes.

Pesquisas realizadas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) mostram que o conforto térmico oferecido pelas árvores e águas refletem de maneira positiva nos índices de produção, destaques para o peso, quantidade e qualidade de leite, e inclusive na reprodução animal. Aspectos que refletem nos diferenciais da bubalinocultura brasileira, a exemplo de rebanho e pasto, e assim,  consolidando a agropecuária na região norte do Brasil.

“Os fatores naturais e climáticos da Ilha do Marajó, beneficiam em amplo aspecto na criação e manutenção da maneira mais natural possível dos búfalos, oportunizando uma criação mais saudável, até mesmo pelo baixo uso de medicamentos, e a preservação de todos os princípios do bem estar do animal que, por isso, se tornam mais resistentes a doenças, além de produzir um leite mais saudável, nutritivo e isento de toxinas. Benefícios que se refletem nos derivados”, explica Pinheiro.

Benefícios à saúde

O leite de Búfala é do tipo A2, por isso, possui uma grande quantidade de nutrientes que são essenciais à saúde, tendo características bem peculiares nesse sentido, as quais diferenciam em termos de qualidade se comparadas ao leite de vaca. Além disso, a beta-caseína presente no leite Tipo A2 representa cerca de 25 a 30% do total de proteína do leite. O leite de búfala contém apenas a beta-caseína A2, que é uma composição que faz com que seja mais digerível, se comparado ao convencional leite vaca, uma vez que possui tanto a beta-caseína A2 quanto a beta-caseína A1.

Pesquisas mostram que há 10% mais de proteína no leite de búfala, o que auxilia no crescimento e desenvolvimento de crianças, adolescentes e adultos, por ser um nutriente necessário para quase todos os processos corporais. Também são encontradas as vitaminas A e C, além de quantidades significativas de cálcio, ferro, zinco, antioxidantes, minerais e estimulantes do sistema imunológico.

Arquipélago do Marajó

Localizada no norte do Pará, o arquipélago do Marajó é o maior arquipélago flúvio-marítimo do planeta, e em média tem 42 mil km² de extensão e formado com cerca de 2 500 ilhas. Sua principal característica é que ela é uma ilha costeira do tipo fluvio-marítima, ou marítmo-fluvial, banhada tanto por águas fluviais (rio Amazonas, Pará e Tocantins) quanto por águas oceânicas (Oceano Atlântico).

A ilha é dividida em 12 municípios: Santa Cruz do Arari, Afuá, Anajás, Breves (a capital da Ilha de Marajó), Cachoeira do Arari, Chaves, Curralinho, Muaná, Ponta de Pedras, Salvaterra, São Sebastião da Boa Vista e Soure. Mas as principais cidades da Ilha de Marajó são Salvaterra, Soure e Cachoeira do Arari, na parte oriental da ilha, mais perto de Belém, região onde vive a maioria dos 250 mil habitantes do Marajó. As cidades de Soure e Salvaterra são os principais destinos turísticos na Ilha do Marajó, e por aqui parece que o tempo passa em um compasso diferente do continente e do resto do Brasil, e do mundo.

O Brasil tem o maior rebanho de búfalos do ocidente: 1,8 milhão cabeças, 80% nos estados do Norte. De acordo com dados de Pesquisa Pecuária Municipal (PPM), do IBGE, realizada em 2017, a maior concentração de búfalos do país encontra-se na Ilha do Marajó. Em 2016, a ilha contava com cerca de 520 mil cabeças (38% do total nacional), das quais mais de 320 mil estavam na costa norte e nordeste da ilha. Só o município de Chaves concentra pouco mais de 30% do rebanho do Estado, cerca de 160 mil animais. Considerado o segundo município com o maior número de búfalos no Brasil, é Cutias, no Amapá, onde havia pouco menos de 77 mil cabeças. 

Trabalho reconhecido

Desenvolvida em 2006 por meio do Projeto Desenvolvimento da Cadeia Produtiva do Queijo do Marajó, conquistou certificado de qualidade artesanal do produto. Detentora do selo 013 no segmento de produto artesanal no Pará, com a produção do Queijo Marajó Tipo Creme, conquistou premiações expressivas no gênero alimentício, entre elas o primeiro lugar no XII Encontro Nacional de Criadores de Búfalos e II Marajó Búfalos, tendo o reconhecimento na maior premiação de queijos artesanais, “Medalha de Bronze”, no III Prêmio Queijo do Brasil, e “Super Ouro” no IV Prêmio Queijo Brasil, em São Paulo. Emplacou também, com a categoria “Prata”, da 4a Edição do Mondial du Fromage et des Produits Laitiers, na França.

One Response

  1. Parabéns Cecília e Marcos pelo belo trabalho que vcs vem desenvolvendo com o búfalo leiteiro na Ilha de Marajo. Essa competência e o expertise acumulado muito tem haver com a formação que vocês receberam do berço, aprimorado pelo exemplo profícuo de sempre fazer o melhor em benefício da humanidade. Fico feliz em ver a geração de vocês mudando os paradigmas outrora tidos como dogmas no qual os “pretos” eram uma complementação da Fazenda predominantemente criadora do “gado branco”. Realmente são esses exemplos que irá levar a bubalicultura no Marajo ao marco indelével no qual o búfalo vem se tornando o principal ator na mudança de paradigmas que até uns poucos anos atrás seria impossível. Floreat bubalus. Prof William Vale. IBF Standing Committee. Membro da ACADEMIA BRASILEIRA DE MEDICINA VETERINÁRIA. ABRAMVET

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