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Restrições à compra de terras por estrangeiros geram insegurança jurídica

As restrições à compra de terras por estrangeiros no Brasil ainda persistem no Brasil e geram insegurança jurídica. Foram parar no Supremo Tribunal Federal (STF), com a ADPF 342, em que ruralistas questionam a Lei 5.709/1971 que veda a aquisição de imóveis rurais por empresas brasileiras com capital estrangeiro.  Há o Projeto de Lei 2.963, que facilita a compra, aprovado pelo Senado, ainda a ser votado pela Câmara dos Deputados e sancionado pela Presidência da República.

“Esta questão sempre foi delicada, pois existe o receio de que a transferência de grandes propriedades para pessoas estrangeiras comprometa a soberania do país sobre seu território, ou mesmo a segurança nacional, no caso de terras localizadas em áreas de fronteira”, diz o advogado Luiz Felipe Calábria Lopes, do escritório Lima Netto Carvalho Abreu Mayrink. Ele explica que a Lei 5.709 condicionou a aquisição de imóveis rurais por estrangeiros à prévia aprovação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Nos casos de terras localizadas em áreas de fronteira, segundo o advogado, também é necessário obter autorização do Conselho de Defesa Nacional (CDN). Além disso, a lei prevê limites máximos para aquisição de imóveis rurais por estrangeiros em cada município, para evitar a concentração de terras em nome de não brasileiros.

“Essas restrições aplicavam-se tanto a empresas estrangeiras, quanto a brasileiras controladas por estrangeiros. No entanto, em 1998, a Advocacia Geral da União (AGU) emitiu parecer no sentido de que as limitações não poderiam ser aplicadas a empresas brasileiras (mesmo se elas fossem controladas por estrangeiros) porque esse tratamento diferenciado seria contrário à Constituição Federal de 1988”, explica Luiz Felipe Calábria. Mas, em 2010, a AGU mudou seu entendimento e emitiu novo parecer, no sentido de que as empresas de capital estrangeiro também estariam submetidas aos impedimentos da Lei 5.709.

O advogado lembra que a alteração foi questionada no STF por meio da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), proposta em 2015 pela Sociedade Rural Brasileira. O julgamento do processo começou em março deste ano, com voto do relator, ministro Marco Aurélio, no sentido de que as restrições devem ser aplicadas a empresas brasileiros controladas por estrangeiros. Parou depois que o ministro Alexandre de Moraes pediu a suspensão do julgamento para estudar melhor o caso, antes de proferir seu voto.

“A existência de pareceres contraditórios da AGU, aliada ao questionamento feito no STF, gera grande insegurança jurídica para a aquisição de imóveis rurais por empresas brasileiras controladas por estrangeiros”, afirma Luiz Felipe Calábria. Ele lembra que não há discussão quanto às restrições para empresas estrangeiras, criadas e com sede no exterior. “O risco é de questionamento da validade de todas as aquisições feitas por empresas brasileiras controladas por estrangeiros no período de 2010 até hoje sem prévia autorização do Incra (e, no caso de terras de fronteira, também do CDN). Vale ressaltar que os procedimentos para obtenção dessa autorização foram modificados algumas vezes durante os anos e o tempo de espera não é curto.”

O advogado diz que essa situação não apenas desestimula o investimento estrangeiro no país, como também causa confusão entre os órgãos públicos (cartórios de notas e de registros de imóveis, Incra) sobre os procedimentos a serem adotados. “A principal consequência indesejada das restrições talvez seja o prejuízo para a regularização fundiária: os registros cartoriais e do Incra acabam ficando desatualizados e não representam a realidade”, argumenta. Para tentar resolver esses problemas, em 2019, foi apresentado o PL 2.963, do senador Irajá Abreu (PSD/TO).

O projeto, aprovado pelo Senado no final de 2020, retira a exigência de autorização prévia do Incra para empresas brasileiros controladas por estrangeiros, mas mantém a necessidade de aprovação do CDN em determinados casos e a obrigatoriedade de fornecimento de informações no Cadastro Ambiental Rural sobre a composição do capital social da empresa e a nacionalidade de seus sócios. “O projeto elimina a insegurança jurídica do passado, pois torna válidas as aquisições realizadas sem autorização do Incra no período após 2010”, afirma Luiz Felipe Calábria.

O que o estrangeiro interessado em comprar imóveis rurais deve fazer? O advogado responde que é necessário avaliar se a aquisição será feita por empresa de fora do país ou se é melhor constituir uma no Brasil. Tem também que verificar se a terra desejada atende ao limite máximo de aquisição por estrangeiros previsto na Lei 5.709. “Por fim, deve-se elaborar um projeto de exploração do imóvel, justificando a necessidade de sua aquisição e explicando qual destinação econômica será dada a ele”.

Luiz Felipe Calábria explica que a ADPF no Supremo não impede à compra. De acordo com ele, há outros critérios mais importantes a serem considerados, como a necessidade daquele imóvel e o momento do mercado imobiliário e cambial. “Se, diante desses fatores, a opção for pela aquisição, seria possível dar início ao procedimento de autorização prévia do Incra. Caso o julgamento do STF elimine a necessidade dessa autorização, a compra será facilitada.” Se negativo, não haverá perda de tempo ou de oportunidade.

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