Pecuária

S.O.S carrapato

Estudo mostra que ao longo dos últimos anos o carrapato-do-boi está resistente aos acaricidas, e vem tirando o sono dos criadores brasileiros.

O carrapato-do-boi (Rhipicephalus microplus) é o principal ectoparasito hematófago dos bovinos, e está presente em diversas regiões do País. Além de ser transmissor da Tristeza Parasitária Bovina, ele causa de enormes perdas econômicas em função dos danos e incômodos que esse tipo de parasito causa ao animal. Segundo dados da pesquisa divulgada em 2010, de autoria Renato Andreotti, médico veterinário em biologia molecular e pesquisador da Embrapa Gado de Corte, localizada em Campo Grande (MS), o principal método de controle utilizado atualmente nos bovinos é o químico, porém, é crescente o número de relatos que apontam um aumento das populações resistentes de carrapatos a diversos princípios químicos presentes nos acaricidas. Hoje em dia, as bases moleculares da resistência de Rhipicephalus microplus ainda não são totalmente conhecidas e o estudo dos mecanismos de defesa no carrapato aos acaricidas é de fundamental importância para a eficiência da manutenção do rebanho.

O carrapato causa prejuízos econômicos na pecuária brasileira levando a perdas na produção de leite, e carne e danos no couro causados por reações inflamatórias nos locais de fixação do carrapato e pela transmissão de doenças, de acordo com Andreotti. “Economicamente falando, o impacto no sistema de produção de bovinos foi avaliado e levado a uma estimativa de perda de US$ 2 bilhões, nos últimos anos”, estima.

O pesquisador explica que a resistência ocorre de forma natural ou por mutações dentro de uma população de carrapatos. Isso acaba permitindo a esses indivíduos uma maior capacidade metabólica que, ao estar relacionado com a base química que está sendo utilizada como carrapaticida, proporciona uma resistência à ele considerando a dose aplicada. Desta forma, aumenta-se o número de resistências numa determinada população de carrapatos dentro de uma propriedade, fazendo com que ao passar do tempo um produto comercial não apresente resultados no seu controle.

O criador da raça zebuína Sindi e da taurina Caracu, Paulo Salgado, é proprietário da Fazenda Barra da Vereda, localizada no município de São João da Ponte (MG). Ele diz concordar com as declarações de Andreotti, e comenta que a maior resistência deve-se ao uso indiscriminado de produtos, em subdosagens. “Isso ocorre principalmente quando se pretende combater a mosca-do-chifre utilizando esses mesmos produtos em menor dosagem”, diz Salgado. O criador, que é membro da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ), comenta que a maior infestação é notada principalmente em animais taurinos ou seus cruzamentos. “Cabe salientar que animais enfraquecidos, adoentados, debilitados ou mesmo sofrendo uma restrição alimentar estão sujeitos a maior infestação”.

Outros problemas que este ectoparasito acarreta aos pecuaristas são os prejuízos relacionados à mão de obra, aquisição de carrapaticidas e de equipamentos de suporte para aplicação nos rebanhos, além das despesas com instalações. “De uma maneira geral, a contaminação com resíduos químicos da carne e do leite, assim como do ambiente, tem sido para a sociedade uma das maiores preocupações quanto ao uso de pesticidas químicos”, diz Andreotti. O pesquisador conta que a resistência ocorre nas regiões onde mais uma determinada base química é utilizada mais intensamente.

A pesquisa aponta que atualmente no Brasil são utilizados sete grupos de acaricidas que lutam para controlar o carrapato. São eles os produtos a base de organofosforados, amidinas, piretroides, fipronil, thiazolina, lactonas macrocíclicas e fluazuron (inibidor do crescimento). Segundo a pesquisa, o carrapato tem sido mais estudado e tem seus registros na Região Sul, onde a pecuária é baseada em animais de origem europeia causando situações de instabilidade para doenças transmitidas por carrapatos. Na região Sudeste, na qual o setor é mais preparado, e, mais recentemente, na Região Centro-Oeste, devido a grande expansão da pecuária. No Nordeste, há poucas informações a respeito e no Norte do País, não há relatos.

Procurando uma saída

Para aqueles que já têm seus animais infectados, procurar saídas para resolver este problema se torna a principal prioridade. Pensando nisso, Andreotti diz que é fundamental para o produtor que trabalha com bovinos sensíveis ao ectoparasito, realizar o teste de eficácia de produtos para saber quais bases químicas não apresentam resistência para a população de carrapatos na propriedade. Tais testes necessitam de cuidados na hora da coleta e do transporte das amostras como, por exemplo, verificar as condições do laboratório para onde serão levadas as amostras, realizar o teste de imersão de adultos (AIT), o teste de pacote de larvas (LPT), o teste de imersão de larvas (LIT) e a detecção de atividade esterásica.

“Fazer esses procedimentos anualmente e o controle dentro de padrões técnicos dará maior fôlego a esses produtos químicos”. Ele explica que essa situação está estabelecida no sistema de controle de carrapato e que é necessário aprender a lidar e conviver com ele. Em relação à tendência de aumento da resistência aos produtos químicos, Andreotti diz acreditar que por meio das pesquisas deverá ser desenvolvida alternativas viáveis ao controle para que isso não aconteça. Na opinião do criador Paulo Salgado, é recomendável fazer controle estratégico do parasito de acordo com as orientações do veterinário ou mesmo de acordo com recomendações que são divulgadas pela Embrapa.

Miguel Domingues Júnior , gerente de produto da linha de Endectocidas da unidade de negócios Bovinos da Pfizer Saúde Animal, explica que os medicamentos e tecnologias atualmente disponíveis no mercado são essenciais para que o pecuarista vença a guerra contra esses ectoparasitos que causam tantos prejuízos à pecuária nacional. “Quando utilizados de forma correta e estratégica, observando-se o ciclo de vida do parasito, as condições ambientais, as condições dos animais e o grau de infestação, os antiparasitários hoje disponíveis são bastante efetivos no controle do carrapato bovino”, diz Júnior. Ele comenta que a tendência natural é que, ao longo dos ciclos de tratamento, as infestações diminuam e mantenha-se sob controle, sem causar grandes prejuízos aos pecuaristas. E, para que o programa de controle seja eficaz e bem sucedido, é fundamental que o pecuarista consulte um médico veterinário para criar um programa que seja customizado às necessidades e exigências de sua propriedade e rebanho.

Quanto ao futuro tecnológico, Júnior declara que os caminhos alternativos que se vislumbram são os de associações de princípios ativos com diferentes mecanismos de ação. “Além disso, pesquisadores de todo o mundo têm dedicado maior atenção a novas vias de administração, buscando mais comodidade, facilidade de manejo e menos estresse aos animais. Outros campos de pesquisa são o desenvolvimento de biológicos (vacinas) e o controle biológico (fungos)”, finaliza.

Detalhando os cuidados!

Baseado nos estudos de Renato Andreotti, veja os detalhes sobre os cuidados necessários na hora da coleta e do transporte das amostras dos carrapatos.

Condições do laboratório. Ao chegar ao laboratório, as fêmeas ingurgitadas (cheias de ovos) devem ser lavadas com água para remover os ovos provenientes de postura durante o transporte. A condição de incubação das teleóginas, ovos e larvas antes e durante o teste deverá ser de 27°C a 28°C e 85% a 95% de umidade relativa (UR) e sem iluminação.

Teste de imersão de adultos (AIT). O AIT com dose de discriminação tem sido recomendado como um ensaio preliminar para a resistência porque é relativamente simples. O método é um bioensaio aplicado em fêmeas com maiores volumes (ingurgitadas) de carrapatos.

Teste de pacote de larvas (LPT). Baseia-se na utilização do carrapaticida em diferentes concentrações e no índice de sobrevivência de larvas expostas a estas concentrações. Os resultados deste bioensaio de larvas para o diagnóstico de resistência em Rhipicephalus microplus levam cerca de seis semanas. Neste teste, as larvas são expostas a papéis de filtro impregnado quimicamente e sua mortalidade subsequente é quantificada após 24 horas do desafio.

Teste de imersão de larvas (LIT). Esse bioensaio de larvas não é tão amplamente utilizado para o diagnóstico de resistência. O método proporciona um resultado em seis semanas, mesmo tempo que o LPT. Estudos comparativos têm indicado que os resultados do LIT podem ser comparados com os resultados LPT. A incapacidade do LPT para diagnosticar a resistência potencial para fluazuron também se aplica ao LIT.

Detecção de atividade esterásica. A relação entre o aumento na atividade da enzima caralizadora com resistência aos organofosforados em linhagens de carrapato foi desenvolvida através de um teste para avaliar carrapatos baseado na atividade esterásica extraída a partir de teleóginas e inibida na presença do propoxur (carbamato). Este ensaio pode ser usado para diagnosticar insensibilidade para organofosforados e segregar os resultados em genótipos resistentes e susceptíveis.

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