Agricultura

Uva: a poda que salva a parreira

O manejo mais prático e que diminui consideravelmente os riscos de incidência de doenças na cultura da uva está na poda verde.

Na região Sul, do final de novembro até o início de janeiro, a parreira passa da fase reprodutiva para a vegetativa. De acordo com Henrique Pessoa dos Santos, especialista em fisiologia vegetal e pesquisador da Embrapa Uva e Vinho, em Bento Gonçalves (RS), é justamente nesse período que a uva para de crescer e aí se dá o desenvolvimento do estágio de maturação das bagas, seja na conversão de água em açúcar como na degradação dos ácidos tartárico e málico.

É na fase vegetativa que o vitivinicultor precisa estar atento, pois é justamente nela que serão garantidas as qualidades enológicas da uva. Nesse sentido, o manejo ideal a ser adotado é o da poda verde, o qual ajustará o microclima das videiras, propiciando maior ventilação, incidência de luz e controle da umidade do ar na planta. “As bagas se desenvolverão melhor recebendo radiação solar nos frios mais frios do dia, especialmente, no período da manhã”, diz Santos. “Aí, entra a poda verde, com a desfolha, desponte ou corte da ponta do ramo e amarração das brotações. Isso permitirá a incidência maior de raios solares entre os cachos e o controle do microclima na videira”.

Entre as vantagens desse tipo de manejo está o favorecimento de variedades tintas, por exemplo. A exposição dos cachos influencia a síntese e acúmulos de pigmentos e substâncias aromáticas. “Para a produção de vinhos, por exemplo, a casca da uva tem um valor alto, pois nela se encontram os principais compostos que vão agregar mais valor ao produto final. E isso pode ser notado na própria garrafa pela tonalidade e textura do vinho. Temos vários experimentos aqui na Embrapa que dá para diferenciarmos o vinho de uvas vindas de parreiras que receberam mais luz de um que foi feito a base de uva sem esse tipo de manejo”.

Além de garantir uma melhor uva para a vinificação, a poda verde também resulta um microclima ideal para a menor incidência de doenças. Tirando o componente de retenção de água pela planta, o risco do desenvolvimento de infecções cai drasticamente. Santos estima que a redução em pulverizações possa chegar de 50% ou até 60%. “A doença precisa de água livre para se instalar e se desenvolver. Então, o que influenciará isso é o tempo de permanência de gotas d’água pela planta. Elas seriam as portas de entrada de doenças, em especial, as causadas por fungos como o míldio e podridões (glomerella e bodritis)”.

A vantagem de maior aeração e incidência de luz na planta também propiciará melhores condições para o manejo de aplicações no parreiral. Os produtos a serem pulverizados atingirão os alvos com maior facilidade. Como não haverá muitas folhas juntas, ou cobrindo os cachos não haverá retenção do produto pelo meio ambiente. A segurança do trabalhador nessas condições também será maior em função da baixa exposição e aplicação de defensivos agrícolas.

Estágios de maturação.

A evolução completa da maturação da uva compreende os períodos herbáceo, mudança de cor e maturação. O herbáceo abrange desde a formação do grão até a mudança de cor da película da baga. A mudança de cor, nas variedades tintas, a cor das bagas varia do verde ao roxo-azulado e, nas brancas, do verde ao verde-amarelado. A mudança de cor vem acompanhada de mudanças físicas; a baga adquire elasticidade e amolece, à medida que a maturação avança. A maturação em si se caracteriza pelo período que inicia com a mudança de cor da uva e termina na colheita. Pode durar de 30 a 70 dias, dependendo da cultivar e da região de cultivo (no Sul, as uvas Vitis vinifera são colhidas de janeiro a março; a época de colheita varia com a cultivar, a região de cultivo, a safra e o manejo agronômico do vinhedo). Durante a maturação, as bagas amolecem progressivamente, devido à perda de rigidez da parede das células da película e da polpa; ocorre um aumento no teor dos pigmentos antociânicos (nas variedades tintas) e de açúcares (glicose e frutose), assim como uma diminuição pronunciada da acidez.

Dependendo do uso fruta para cada tipo de vinho, por exemplo, o produtor tem de considerar as variações de maturação. São descritos três tipos, a tecnológica, a fisiológica e a fenólica. A maturação tecnológica é o ponto a partir do qual não há acúmulo significativo de açúcares na baga de uva, nem expressiva queda da acidez. De acordo com Santos, esse tipo tem mais a ver com o tipo de vinho a ser produzido. Um espumante fino, por exemplo, teria uma maturação tecnológica mais cedo, por necessitar de um fruto de maior acidez. Na maturação fisiológica, o que destaca é a maturação da semente, que se apresenta mais escurecida e dura. Já a fenólica diz respeito ao maior acúmulo de pigmentos pela casca – os fenóis –, e nesse caso o fator ambiental é bastante influenciador.

Colheita

A partir de um monitoramento preciso, o produtor poderá identificar os estágios de maturação e assim realizar a colheita no momento mais adequado à máxima expressão do seu potencial de qualidade em determinada safra ou região. Nesse sentido a Embrapa Uva e Vinho destaca alguns cuidados básicos a serem observados nesse momento.

Primeiramente, o ideal é efetuar essa tarefa pela manhã, evitando as horas mais quentes do dia e reduzindo assim o calor de campo, indesejável para as fases iniciais de elaboração dos vinhos. A opção de colheita manual preserva mais a integridade física da uva, em relação à colheita mecânica.

Proceder à seleção da uva colhida, de modo a vinificar lotes semelhantes e sem problemas de podridão ou de desuniformidade de maturação. Acondicionar a uva colhida em caixas plásticas especiais, limpas, com capacidade máxima de 20 quilos. Manter a uva colhida à sombra e manuseá-la o menos possível.

Encaminhar a uva à unidade beneficiadora imediatamente após colhê-la, pois a mesma não se mantém em boas condições por muito tempo após ser colhida. O ideal é iniciar seu processamento em no máximo 12 horas após a colheita. Evitar transportes a longas distâncias, bem como a utilização de veículos de transporte que trepidem ou sacolejem demasiadamente, danificando e reduzindo a qualidade da uva.

Se possível, resfriar rapidamente a uva na vinícola, antes do esmagamento da mesma. Este procedimento tem a vantagem de reduzir a atividade enzimática oxidativa na fase de esmagamento e prensagem, limitando o desenvolvimento e a ação de bactérias acéticas. A consequência é a limitação da produção de acidez volátil e a preservação da qualidade do vinho.

Os procedimentos da poda verde

Eliminação de gemas. A prática é importante na formação das plantas, eliminando-se as gemas onde não se deseja que ocorram brotações, como por exemplo, no tronco.

Desbrota. Nesse caso tem de se eliminar os brotos do tronco, dos braços, dos esporões e das varas que brotaram, mesmo após a eliminação de gemas. Também é preciso tirar os brotos improdutivos, brotos frutíferos (controle de produção), netos (brotos laterais).

Desponte. Se feito muito cedo, a poda pode estimular brotações laterais. O ideal é efetuá-la no início da maturação.
Desfolha. As épocas indicadas são antes da floração, no início da compactação do cacho, na mudança de cor das bagas (início da maturação) e alguns dias antes da colheita. Para a desfolha é importante considerar as necessidades mínimas em número de folhas. Para a espécie Vitis vinifera (na qual estão incluídas as principais cultivares de vinhos finos, tais como Cabernet Sauvignon, Chardonnay e Merlot) o limite mínimo é de 12 cm²/g de frutos. Como regra geral, recomenda-se 1,0 a 1,3 m² de folha por quilo de uva ou 10 a 15 folhas por cacho. Valores superiores a esses podem comprometer o microclima e prejudicar a qualidade. Valores inferiores podem restringir a qualidade pela falta de superfície foliar em relação a demanda por carboidratos (sintetizados nas folhas pela fotossíntese).

Amarração de ramos herbáceos. Nesse caso é preciso manter um espaçamento entre ramos, de seis a dez centímetros. Igualmente é preciso evitar sobreposição de ramos, além de conduzir essa prática desde o início da brotação. A amarração é importante e deve ser feita antes do desponte dos ramos, com o intuito de evitar que ramos fiquem dispostos horizontalmente sobre outras plantas e não sejam despontados.

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