Pecuária

Pecuária leiteira: um brinde ao Leite

“Com o advento da pecuária leiteira em Eldorado do Carajás, outras regiões pegaram carona no bem sucedido projeto”.

Há quase 15 anos, o município de Eldorado do Carajás (localizado a 100 quilômetros a sudoeste de Marabá e a 754 quilômetros da capital Belém) entrou para o registro do País como a região demarcada por grandes conflitos de posse de terra, que resultaram em mortes. Hoje, um bom tempo depois, o município tenta escrever uma nova história, mas desta vez com final feliz para as famílias que lá residem.

E tudo aconteceu porque aos poucos, por meio de parcerias, união e força de vontade, Eldorado do Carajás começou a despontar com forte potencial para a pecuária leiteira – que se tornou a atividade principal às condições da região – ao propiciar melhoria de renda às centenas de famílias dos assentamentos. Além disso, a atividade veio contribuir para o auxílio da preservação do meio ambiente, por meio de tecnologia que aos poucos ainda chega nas mãos dos produtores. “Um exemplo é a preconização da tecnologia da Embrapa de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta que vêm sendo difundida em parceria com a Secretaria de Agricultura do Estado do Pará, Sebrae e Embrapa Amazônia Oriental, proporcionando capacitações para técnicos e produtores na região, além de implantação de unidades demonstrativas junto aos produtores modelos. É importante destacar que a grande maioria de áreas onde esses produtores foram assentados já era de pasto”, descreve Andreos Leite, gerente executivo de modernização de produção leiteira do Estado, vinculado à Secretaria de Agricultura do Estado do Pará (Sagri).

O projeto lá em Eldorado do Carajás, denominado Programa Mais Leite, surgiu em 2007 em parceria com prefeitura, a Sagri e a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado do Pará (Emater). Depois vieram outros parceiros, como o Sebrae. Hoje, além de Eldorado do Carajás, o programa – que em outras regiões recebeu o nome de Leite e Derivados no Sudeste do Pará -, abrange também as famílias residentes em projetos de assentamentos localizados nos municípios de Canaã dos Carajás e Jacundá, totalizando 170 produtores participantes dos ciclos de capacitação do Sebrae. Em média, as famílias atendidas produzem de 50 a 300 litros de leite/dia, com rebanhos de 15 a 70 vacas.

O fato é que o projeto de pecuária leiteira deu muito certo e isso se deve há alguns motivos, segundo aponta o gerente executivo. “A atividade está na sua grande maioria aqui no Estado nas mãos dos produtores da agricultura familiar. O pequeno produtor não tem condições viáveis de produzir gado de corte devido à necessidade de grandes áreas para esta atividade e em comparação com outras atividades agropecuárias, o leite tem o advento de garantir remuneração ao produtor no mínimo mensalmente, ao contrário de fruticultura e horticultura, por exemplo”, justifica. “Outro fator é a mudança nacional da geografia do leite. A pecuária leiteira tem sido ’empurrada’ para a parte Norte do Brasil por encontrar terras mais baratas que no Centro-Sul, por exemplo, e essas regiões experimentarem momentos mais propícios para outras atividades. Mais um fator é a política agrária. É visível a estreita ligação entre a política de reforma agrária e o aumento de produção de leite devido também aos dois motivos supracitados. Um exemplo pode se visto nas cinco microrregiões do Pará, que mais receberam assentamentos. Elas aumentaram em 15 anos 549% a produção leiteira passando a responder por 46% da produção estadual contra 17% de participação antes de receber tais assentamentos”, salienta.

De acordo com Leite, diante das potencialidades do Estado com áreas para a atividade bem como ótimo fotoperíodo para a produção de pastagem além do tipo de política agrária, o Pará começa a se “enxergar” como potencial produtor lácteo. Tanto que recentemente foi criada a câmara setorial do leite do Pará. O Estado também recebe o primeiro laboratório de qualidade de leite da Região Norte que está sendo concebido numa parceria entre governo do Estado, Ministério da Agricultura e Universidade Federal Rural da Amazônia. Houve em junho de 2010, o primeiro evento de amplitude estadual para a pecuária leiteira, o Pará Fest Leite, com participação de palestrantes da Embrapa Gado de Leite, Embrapa Amazônia Oriental e Universidade Federal de Lavras, em Eldorado do Carajás, sendo que o do ano que vem será em Canaã dos Carajás.

No mês de dezembro, até um Workshop de Inovação Tecnológica, na cadeia da Produção Artesanal de Derivados Lácteos do Estado do Pará foi realizado, com o foco de iniciar o processo de proposições estruturantes em torno de um decreto para regulamentação dos produtores artesanais lácteos do Estado do Pará, que terá influência direta para pequeno produtor que poderá ter maior facilidade de verticalização de sua produção a partir de laticínios artesanais.

Com toda essa estrutura, Eldorado do Carajás e outras regiões já colhem resultados contados pelos próprios personagens desta história: Em Jacundá (sudeste do Estado) o projeto Leite e Derivados, leva a produtora Jane Moreira uma grande satisfação da sua produção, que segundo ela não está ainda no ponto ideal, por enquanto. “São entre 200 e 250 litros/dia, mas já chegou a 380 litros/ dia. Agora, estamos dividindo os piquetes e organizando as pastagens. Selecionamos o gado e fizemos o curral correto. Queremos dar mais um passo na compra de equipamentos, precisamos de outros maquinários para melhorar a produção, as cercas elétricas já temos”, diz.

Na propriedade de 27 alqueires, 43 vacas de raças mistas são mantidas para a produção de leite, que começou há seis anos. Com a ajuda e as parcerias, a produtora conta que os resultados melhoram muito. Hoje toda a produção da fazenda é destinada a um laticínio, localizado a 23 quilômetros da propriedade.

Outro produtor satisfeito com a renda do leite é Welinton Alexandrino Ribeiro. Na sua propriedade são 68 animais em lactação, com uma produção que já chegou a 500 litros/dia. A estrutura na fazenda de Ribeiro, que possui 23 alqueires e é bem diferente. Há ordenha mecânica e todos os equipamentos para o leite sair fresquinho e chegar a cinco quilômetros para o laticínio. A raça predominante é o cruzamento Holandês. A família se divide e se desdobra para dar conta da produção. “Com as palestras e acompanhamentos melhoramos a qualidade do rebanho e, consequentemente, a da reprodução e a tecnologia como a inseminação artificial que chegou aqui rapidinho”, conta.

Hoje, em torno de R$ 0,48 litros são pagos ao produtor que chegou a receber R$ 0,58 pagos pela qualidade superior do leite, conseguida graças a uma boa criação do gado devido ao manejo correto.

Estrutura leiteira

Segundo o gerente executivo, hoje ainda existe muito a chamada “mestiçagem”, ou seja, como o Estado se consolidou como grande produtor de gado de corte, sendo o atual quinto colocado no ranking nacional, e com taxa de crescimento constante nos últimos anos os produtores familiares, que são a grande maioria de produtores de leite no Pará, tinham sua fonte de animais para produção de leite, razão pela qual ainda se tem uma baixa produtividade de leite por vaca no estado (1,73 l/vaca). “Porém, visualizou uma mudança neste cenário. Com o crescimento da pecuária leiteira no Estado muitos produtores já se especializa na atividade leiteira e assim há a inserção de raças como Gir Leiteiro, Guzerá e Girolando nos planteis”, destaca ele.

“E os resultados já são contabilizados pelos produtores, que têm visto sua produtividade aumentar. Cresceu tanto que eles pensam em realizar mais investimentos como adquirir ordenha mecânica, tanques de resfriamento, manejo nutricional e de saúde animal”, conta Maria Luzineuza Maia, gestora do Projeto Leite e Derivados do Sudeste do Pará, do Sebrae-PA, que atua em parceria no projeto.

Com o foco em aumentar a renda de famílias, que vivem na região. O Sebrae se propôs a ajudar as famílias. “As ferramentas utilizadas para alcançarmos as metas do projeto são até hoje as capacitações por meio de cursos, consultorias, seminários e palestras, além de visitas técnicas em outros municípios e Estados e propriedades que também desenvolvem esse trabalho. Os equipamentos são adquiridos pelos produtores e o Sebrae entra com a educação na gestão da propriedade. Uma vez corrigida as falhas no processo, os produtores conseguem lucrar mais com a atividade”, conta. “Hoje, 80% deles já compraram tanques de resfriamentos e comercializam o leite resfriado. Os exemplos de melhorias são os tanques de resfriamentos, ordenhadeira mecânica, trituradores, currais, implantação de cerca elétrica”, pontua Maria Maia.

Em Eldorado do Carajás existem 32 assentamentos, os quais ocupam 64% da extensão do município. Hoje, 53% da população vivem na zona rural. Dos grupos que o Sebrae atende na região, 80% compraram terra de assentados com o propósito de tocar alguma atividade agrícola ou pecuária, porém trazendo pouca ou nenhuma experiência. O programa também orienta os produtores a se organizarem em grupos para formar associação ou cooperativa com o objetivo de comprarem insumos em conjunto, ganhando maior poder de barganha nas negociações.

Hoje, explica Maria Maia que muitas foram as mudanças que se dão na melhoria da qualidade de vida destas famílias, principalmente, na moradia. “Antes alguns produtores residiam em casas humildes de madeira e hoje em sua maioria são construídas. Houve melhoras também na educação das crianças. Temos produtores que os mantêm estudando em escolas particulares nas cidades próximas da região”, diz. “Todos os objetivos pactuados no início do projeto foram atingidos, principalmente a organização do setor produtivo. Atualmente a maioria dos produtores atendidos comercializa o leite em grupo organizado, e compram insumos para as propriedades em conjunto, esse foi um grande desafio superado para o bom andamento do projeto”, diz. “Conseguimos aprovar dois projetos junto ao Colegiado do Território da Cidadania (MDA) e outro pelo Pará Rural, para Cooperativa Agropecuária de Canaã dos Carajás, ambos para equipamentos, com o valor aproximado 700 mil reais”, conta.

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