Agricultura

Cana: expansão da cana em Goiás

A chegada da cana trouxe ganhos sociais e econômicos nos vários municípios goianos que recebem investimentos do setor sucroalcooleiro. O que para uns poderia trazer prejuízos, para outros, só gerou grandes benefícios.

A chegada do setor sucroalcooleiro promoveu uma transformação no panorama econômico, o que já se reflete nas cidades do sudoeste goiano.

Dados:
Aumento da área em relação à safra 2008/2009 e 2009/2010
Rio Verde 32,6%
Jataí 1428%
Mineiros 467,45%

Dados do Estado de Goiás:
28 municípios com usinas instaladas
60 municípios têm plantio
Área total de plantio de 600 mil hectares

Aumento da área em relação à safra 2008/2009 e 2009/2010
Rio Verde 32,6%
Jataí 1428%
Mineiros 467,45%

Fonte: Faeg

O Brasil é um dos mais tradicionais produtores de cana-de-açúcar do mundo. Está também em posição privilegiada em relação aos demais países produtores, pois detém avançado conhecimento do processo produtivo da cultura e ao mesmo tempo utiliza-se das tecnologias como o uso do etanol, como alternativa agroenergética.

Só nos últimos anos, a expansão da cultura se deu além das Regiões do Sudeste (com destaque para o Estado de São Paulo) e chegou às localidades da região central do País. Recentes dados da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) mostram que a moagem de cana na região centro-sul do Brasil atingiu 39,67 milhões de toneladas (t), na primeira quinzena de julho e – mesmo com uma ligeira queda de 4,95% (se comparado com a quinzena anterior) – o acumulado desde o início da safra até o dia 15 de julho, a moagem totalizou 255,19 milhões de toneladas, um crescimento de 20,26% em comparação com o mesmo período da safra 2009/2010.

Com solo fértil, sol forte e abundância de terra agricultável, o Estado de Goiás favoreceu a expansão da cultura canavieira. “O clima mais seco, com chuvas abaixo da média em comparação às outras regiões, variedades adaptadas, para o clima e solo, mais produtivas e resistentes a doenças e pragas permitiram o avanço da cultura, nesses últimos anos”, revela Tadeu Andrade, diretor de Pesquisa e Desenvolvimento Agrícola do Centro de Tecnologia Canavieira (CTC).

Espaços que originalmente abrigavam plantio de soja, de sorgo e do milho, além da pecuária, cederam espaço para a cana. De fato, a paisagem começou a se modificar há cerca de quatro anos, quando o preço dos grãos caiu muito e os produtores viram na cana uma nova possibilidade de produção rentável. Há cinco anos, o Estado abrigava 12 usinas, hoje são 35 instaladas em Goiás, sendo que 25 delas estão nas regiões grandes produtoras de grãos. Dados da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg) apontam que no Estado são ao todo 28 municípios com usinas instaladas e o plantio se estende, por pelo menos 60 municípios, em uma área plantada total de quase 600 mil hectares.

A chegada do setor sucroalcooleiro promoveu uma transformação no panorama econômico, o que já se reflete nas cidades do sudoeste goiano, e trouxe consequências positivas, como o aumento da população, geração de emprego e movimentação da economia local em quase todos os municípios. Até Rio Verde (a 250 quilômetros de Goiânia) consagrado como o maior produtor de grãos do Estado, com destaque para a soja, sentiu os efeitos da invasão canavieira. Em 2006, o prefeito da cidade decretou as leis municipais 5.200/2006 e 5.206/2006 que estabeleceram limites para o plantio de cana, em 10% da área agricultável do município, ou seja, lá a cultura teve sua área limitada em 50 mil hectares. No entanto, toda a área já estava ocupada ou reservada para as usinas existentes no município e para os primeiros grupos de produtores que solicitaram registro de reserva.

A medida precipitou a discussão do assunto pela sociedade e revelou a existência de fortes interesses contrários e a favor da rápida e expressiva expansão do setor sucroalcooleiro no Estado. “O prefeito, anterior a essa gestão, restringiu o plantio da cana. Colocou-se limite para beneficiar outras culturas como a soja e o milho. A lei protegeu às grandes agroindústrias que já estavam na região. Talvez, o maior prejuízo foi perder a oportunidade de receber novas usinas, como a Cosan, que seguiu para o município de Jataí”, comenta a secretária de Agroindústria de Rio Verde, Marion Kompier. Hoje, Rio Verde mantém empresas como Cargill Agrícola, Mosaic Fertilizantes e a Perdigão (grandes agroindústrias instaladas na região e geradoras mão de obra na cidade).

Na opinião do engenheiro agrônomo, Alexandro Alves dos Santos, assessor técnico da Faeg, para a área de cana-de-açúcar e bioenergia, a polêmica de Rio Verde se arrastou por um longo período. “Por um lado vimos que foi positiva no sentido de se pensar sobre a rápida expansão da cultura não somente no município, mas como também em todo Estado, visto que um crescimento desordenado pode trazer, talvez, mais problemas que benefícios, principalmente, por ser uma atividade sujeita a intempéries climáticas e econômicas, atingindo principalmente a área social. Por outro lado, vimos o aspecto negativo, pois não se pode impor ao produtor aquilo que ele deve plantar, pois entendo que isso é uma escolha exclusivamente dele”, argumenta o assessor técnico da Faeg.

Ainda segundo Santos, a cultura se expandiu rapidamente e as usinas começaram a se instalar, com isso houve um grande temor do estabelecimento de uma monocultura na região, como ocorreu em Rio Verde. No entanto, a lei municipal foi derrubada e logo em seguida foi divulgado o Zoneamento Agroecológico para a cana-de-açúcar em todo território nacional o que, coincidentemente, conferiu ao município de Rio Verde como tendo as maiores áreas aptas a cultura em todo Estado. “Mesmo com toda polêmica, as áreas de cana continuam crescendo na região. Em Rio Verde, por exemplo, o aumento de área em relação à safra 2008/2009 e 2009/2010 foi de 32,6%. Em Jataí, o crescimento no mesmo período foi de 1.428% e em Mineiros registrou-se 467,45%. Mesmo com a lei sendo derrubada a polêmica continua”, pontua. “Outras alternativas na tentativa de conter o avanço da cultura na região estão sendo estudadas. Mesmo com esse crescimento notório e expressivo da cana, a cultura ocupa apenas 3% da área agricultável no Estado, enquanto que a soja preenche 11,6% e as pastagens para criação de animais ocupam 79,2% do total, portanto, vemos com isso o descarte total e absoluto de que a cana, em nível estadual, é competidora com produção de alimentos e uma monocultura”, pontua.

Porém, se por um lado houve uma restrição, outros municípios viram a oportunidade de se expandir com a cultura. Cidades, como Serranópolis, Quirinópolis, Jataí, Montividiu, todas no sudoeste goiano, e Itumbiara, mais ao sul, são algumas das localidades onde a cana foi bem vinda. “Não há dúvidas que o crescimento da demanda por áreas irá aumentar ano após ano e existem projetos engavetados que, em um momento propício no cenário econômico, sairão do papel e demandarão de cana-de-açúcar para se transformar em etanol, açúcar e energia”, afirma Santos.

Marco de Investimentos

Na cidade de Serranópolis (localizada a 372 quilômetros de Goiânia), a transformação ocorreu há quatro anos. Segundo o chefe de gabinete da prefeitura, Elton Rocha, as ruas onde há comércio são movimentadas, os restaurantes estão cheios e não há vagas nos hotéis. “Nesses últimos anos, houve também uma redução significativa no número de rebanho. No município havia 338 mil cabeças de gado, hoje existem 208 mil. Muitos pecuaristas viram na cana uma boa oportunidade de renda. Esse foi o primeiro sinal das transformações por aqui”, diz. “A chegada da cana e a instalação de uma usina foram um marco nos investimentos para o município e só trouxeram benefícios. Atualmente, há falta de mão de obra na cidade. Hoje, a prefeitura e o Sebrae se unem para oferecer curso para a população, que foi absorvida pelas grandes usinas da região”, diz Rocha.

Serranópolis abriga a Usina Energética Serranópolis, administrada pelo grupo pernambucano Ipojuca, que emprega mil funcionários. Para uma cidade com população de pouco mais de sete mil pessoas, o número é bastante significativo. A estrutura já está no local há décadas, mas estava desativada há mais de dez anos. O grupo nordestino assumiu os negócios em 2005 e teve sua primeira safra no ano seguinte. Hoje, testa pela primeira vez a colheita mecanizada, que representará 20% desta safra.

Geração de empregos

Com a chegada das usinas São Francisco e Boa Vista, abriu-se a oportunidade para o município de Quirinópolis (localizado a 293 quilômetros da capital) receber mais investimentos e mudar o seu perfil econômico, que sempre viveu de grãos e da pecuária.

Desde da implantação das usinas, todos os segmentos se expandiram, o volume de dinheiro circulando se tornou maior, o que fortaleceu o comércio em geral, principalmente setores de lojas de roupas, de calçados e até de oficinas mecânicas. “Houve reflexos de crescimento, de geração de novos empregos, o que para o comércio foi altamente positivo. Nos restaurantes, por exemplo, o movimento cresceu 50%, o que levou os empresários a ampliarem seus negócios”, comenta o atual prefeito da cidade Gilmar Alves.

Com a nova política econômica implantada, a partir de 2005, Quirinópolis deu um salto de crescimento. Segundo apontam os dados da prefeitura, o município é um dos empregadores do Estado. Novas empresas e indústrias foram instaladas na cidade, fortalecendo a economia e propiciando até uma significativa melhora na qualidade de vida da população. E em breve, a cidade ganhará novos investimentos, como por exemplo, a Petrobrás, que por meio da sua subsidiária Petrobrás Biocombustível, anunciou parceria estratégica com o Grupo São Martinho S.A. com os investimentos já realizados e a realizar, ela terá sua capacidade de moagem ampliada dos atuais 2,5 milhões de toneladas de cana para sete milhões de toneladas na safra 2014/15.

Futuro garantido

Em maio deste ano, no município de Jataí, a Cosan Centro-Oeste S/A instalou uma das mais modernas usinas de etanol. O empreendimento será responsável pela produção de cerca de 370 milhões de litros de etanol por safra, quando estiver em pleno funcionamento. A usina contou com investimento de aproximadamente R$ 1 bilhão, distribuídos entre as áreas agrícola, industrial e administrativa, sendo que R$ 639 milhões deste montante foram contratados por meio de financiamento com o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

A unidade chegou ao Estado atraída pela infraestrutura e rápido crescimento da região. Além disto, o município conta com parceiros estratégicos que garantem o fornecimento da empresa em todas as suas atividades. A produção de cana, por exemplo, será realizada em grande parte por meio de fornecedores da região. Além da Cosan, outras usinas têm previsão de serem instaladas nos próximos anos.

Novas Usinas

A Destilaria Serra do Caiapó chegou há dois anos, em Montividiu, vizinho próximo a região de Rio Verde. A proposta da usina era o processo da moagem de 500 mil toneladas de cana para produção de 42 milhões de litros de álcool. Na cidade, além da Serra do Caiapó, outras foram atraídas e estão com previsão de funcionamento nos próximos anos. “A maior preocupação da sociedade quanto à instalação das usinas e da cultura da cana era em relação às queimadas. Porém, a grande parcela delas estão sendo mecanizadas, uma das exigências de liberação e de funcionamento conforme às leis ambientais, evitando assim as queimadas e o uso de mão de obra”, revela o gerente da Usina Serra do Caiapó, Indiomar de Paiva.

Segundo ele, a chegada das usinas em Montividiu trouxe novas oportunidades para a população. “São 1.500 contratados, só a folha de pagamento registra que 70% da mão de obra vêm do próprio município”, justifica.

Além da cana

A cidade de Itumbiara (a 206 quilômetros de Goiânia) há cinco usinas dentro de sua área – algumas delas já estão em funcionamento e outras em fase de implantação. Existe ainda uma unidade em negociação e oito nas proximidades do município. Com a presença do setor sucroalcooleiro, outras empresas resolveram se instalar na cidade como laboratórios de bioinseticidas e uma companhia de irrigação.

Dados apontam

No ano 2000 foram gerados quase 20 mil vagas no setor sucro energético em Goiás, enquanto que em 2008 foram mais de 92 mil (um salto em oito anos de 360% no número de empregos). “Apesar desses e outros benefícios, vemos também que as expansões sem projetos e discussões mais apuradas podem trazer problemas aos municípios, principalmente no quesito mão de obra qualificada que constituem um problema sério no Estado, assim esses trabalhadores tem que ser ‘importados’ de outras regiões e o município não tem estrutura de saúde e educação para comportar essas famílias oriundas de outras localidades”, analisa o assessor técnico da Faeg. “Outro agravante é em relação aos contratos dos proprietários rurais com as usinas que, na sua maioria no Estado, se caracterizam por arrendamentos de terras, o que provoca em grande parte um certo ‘êxodo rural’ desses proprietários para outras cidades ou mesmo fora do País”, pontua Santos, que acredita que novos estabelecimentos de novas unidades industriais nos municípios goianos deverão ser seguidos de um bom planejamento de implantação.

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