Pecuária

O futuro da carne e do leite

O FUTURO DA CARNE E DO LEITE

Para conseguir atender a demanda mundial por alimentos de maneira sustentável, a pecuária brasileira terá de se adaptar. Esta conclusão é consenso entre os técnicos e pecuaristas.

 

Uma das alternativas é a utilização de sistemas integrados e a adoção de novas tecnologias na atividade para garantir a qualidade das pastagens. Há a necessidade de modificação do entendimento de que basta jogar a semente e esperar o capim crescer. Para eles é preciso tomar a planta forrageira como uma lavoura.”Não há boa pecuária sem boa pastagem, pois o pecuarista deve ser antes de tudo um bom agricultor. Se fosse realizada a recuperação das pastagens com eficiência, a produção de carne e leite poderia dobrar”, declara o pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental Moacyr Bernardino Dias Filho.

Questões como o manejo, escolha da planta forrageira, melhoramento genético, redução das emissões de gases de efeito estufa e a arborização de pastagens são hoje fundamentais. Para o pesquisador da Embrapa Agrossilvipastoril Bruno Pedreira, é preciso que a pecuária seja inserida em um sistema de produção e seja trabalhada de maneira estratégica. “Vamos precisar olhar para o sistema não só com o olhar para o retorno financeiro imediato. Se não planejarmos e olharmos para o sistema a longo prazo, não teremos longevidade da produção”, afirma. A utilização de sistemas integrados, seja ele agropastoril, silvipastoril ou mesmo agrossilvipastoril servem não só como estratégia para recuperação de pastagens degradadas, mas também como forma de melhor conservação e aumento da matéria orgânica no solo, redução das emissões de gases de efeito estufa, melhoria do conforto térmico para os animais e aumento das fontes de renda para o pecuarista. Os sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (iLPF) também são apontados como alternativas para problemas como a síndrome da morte da braquiária (Brachiaria brizantha cv. Marandu), uma vez que a diversidade de componentes pode contribuir para melhoria da permeabilidade dos solos. “Acho que temos de trabalhar com sistemas integrados. A iLPF pode ser uma boa opção. Colocando-se árvores junto à pastagem, a profundidade das raízes pode facilitar a infiltração de água neste solo”, sugere o pesquisador da Embrapa Meio Ambiente Celso Manzatto.

Simpósio

O I Simpósio de Pecuária Integrada, realizado no mês de outubro, em Sinop, MT, marcou o lançamento do Zoneamento Edáfico de Risco da Síndrome da Morte da Braquiária. O trabalho aponta as regiões de Mato Grosso com maior chance de ocorrência do problema. Para elaboração deste zoneamento foi feita uma interpretação de características de solos relacionadas à baixa permeabilidade e excesso de água, com base em mapas pedológicos da Amazônia Legal, o levantamento do uso de solo e da cobertura vegetal em Mato Grosso, o regime pluvial de cada região e ainda foram realizadas duas expedições a campo para identificar pontos de ocorrência de morte do capim Marandu.

Os dados do zoneamento mostram que 29,5% das áreas usadas em atividades agropecuárias em Mato Grosso têm risco forte ou muito forte de apresentarem a síndrome da morte da braquiária. Isto equivale a 26,5 milhões de hectares que estão em sua maioria situados na Amazônia mato-grossense.

Estas informações ajudam não só ao pecuarista, que terá de buscar outras opções de plantas forrageiras diferentes do braquiarão. “O zoneamento mostra a urgência da necessidade de intervenção por parte dos pecuaristas em algumas áreas e orienta o desenvolvimento de políticas públicas, como as linhas de financiamento e ações como o Plano ABC (Agricultura de Baixo Carbono)”, explica Celso Manzatto.

A realização do I Simpósio de Pecuária Integrada também foi importante para consolidar o Grupo de Pesquisa em Pecuária Integrada (Gepi). O grupo é formado por cerca de 30 alunos de graduação e pós-graduação da UFMT e conta com a participação de professores e pesquisadores da Embrapa. Há seis meses realiza reuniões semanais.

“Este grupo nasceu de uma necessidade nossa de capacitar alunos em uma área tão importante como a pecuária integrada, tanto pecuária de corte, de leite e na agricultura e floresta. O evento serviu como o lançamento deste grupo.

Foram feitos vários contatos e a nossa tendência é fomentar ainda mais a existência e permanência deste grupo”, afirma o professor Dalton Pereira.

Pesquisas realizadas pela Embrapa apontam alternativas para os pecuaristas que sofrem com a síndrome da morte da braquiária, um dos principais responsáveis pela degradação de pastagens em Mato Grosso. Estima-se que dos 25,8 milhões de hectares com plantas forrageiras do estado, mais de 2 milhões de hectares apresentem algum tipo de mortalidade, sendo este problema responsável por boa parte dos danos.

A síndrome, também chamada de morte súbita, é conhecida desde a década de 1990, quando começou a ocorrer no estado do Acre. Ela acomete, sobretudo, as pastagens com a Brachiaria brizantha cv. Marandu (braquiarão ou brizantão). O problema é comum na região Norte do país e em algumas áreas do Centro-Oeste mais próximas da Amazônia, como o norte de Mato Grosso. Estes locais possuem um regime intenso de chuvas, passando dos 2.000mm anuais, e solos mal drenados ou de baixa permeabilidade. Desta forma, ocorre o alagamento ou encharcamento do solo, reduzindo a oxigenação das raízes do brizantão. Como esta planta tem baixa adaptação a estas condições, fica mais suscetível ao ataque de fungos causadores de doenças presentes no solo. A ação destes microrganismos faz com que as folhas fiquem amareladas e murchem, o que resulta na mortalidade em touceiras e em grandes reboleiras. De acordo com o pesquisador da Embrapa Agrossilvipastoril, Bruno Pedreira, são dois os motivos para que o problema tenha se intensificado nos últimos anos. O primeiro é a mudança no uso da terra na região e o segundo é a mudança da relação entre os patógenos (fungos e a planta).

“Tínhamos floresta densa, com alta diversidade. Isso foi retirado e hoje temos áreas contínuas de monocultivo de pastagens. As raízes exploravam cinco a dez metros de profundidade, enquanto hoje exploram de 20 a 30 centímetros. Isso fez com que a dinâmica de água no perfil do solo se alterasse ao longo dos anos. Além disso, houve redução na biodiversidade, o que fez com que a relação fungo/hospedeiro ficasse mais próxima e quando eles encontram uma planta suscetível, junto a um ambiente favorável, resulta no problema”, explica.

De acordo com Bruno Pedreira, a única alternativa para evitar a morte da braquiária é a substituição do capim Marandu nas áreas onde o problema ocorre. Para dar maior subsídio ao produtor no momento da escolha de qual forrageira utilizar nessa substituição, foi desenvolvida nos últimos três anos uma pesquisa que buscou validar o conhecimento existente sobre a síndrome e testar o comportamento de diferentes materiais em três Unidades de Referência Tecnológica nos municípios de Terra Nova do Norte, Nova Guarita e Alta Floresta (MT).

Em termos de desempenho em acúmulo de forragem, os capins do gênero Panicum, como Mombaça e Tanzânia, com aproximadamente 30 e 22 toneladas/ha respectivamente, obtiveram o melhor resultado na avaliação feita na Fazenda Maringá, em Alta Floresta. Entretanto, o pesquisador ressalta a necessidade de adequar o sistema de produção quando estes materiais são utilizados. “Quanto maior a produção, mais estacional é a planta. Ou seja, significa que ela produzirá pouco durante a seca e será necessário ter outras fontes de alimento na fazenda”, explica o pesquisador. Os capins Xaraés, Piatã, Massai, Llanero e Mulato II ficaram num segundo patamar, variando a produção de forragem entre 18 e 16,8 toneladas/ha. O Marandu teve a menor produtividade, com 12,2 toneladas/ha, ficando atrás da Ruzizienses e do Estrela.

Os testes mostraram ainda que além do Marandu, o Piatã e o Mulato II apresentaram o problema da síndrome da morte da braquiária, o que mostra que eles também não seriam indicados para a substituição do braquiarão nos locais com a mortalidade.

O pesquisador Bruno Pedreira ressalta ainda que ao fazer a substituição, o pecuarista deve diversificar as plantas forrageiras. O uso de várias espécies traz maior segurança, reduzindo a chance de insucesso. “Não se recomenda que um capim seja plantado em mais de 40% da área de uma propriedade, portanto, é aconselhável a utilização de pelo menos três plantas forrageiras numa propriedade. No caso dos capins, esses sempre devem ser plantados em pastos diferentes, isto é, não se deve misturar mais de um tipo de capim no mesmo piquete”, alerta Pedreira.

Outra ferramenta que irá ajudar o pecuarista mato-grossense a evitar perdas é o zoneamento edáfico das áreas de risco da ocorrência da síndrome da morte da braquiária. Este trabalho acaba de ser lançado pela Embrapa e irá orientar sobre as áreas com maior chance de haver o problema.

Para elaboração deste zoneamento foi feita uma interpretação de características de solos relacionadas à baixa permeabilidade e excesso de água, com base em mapas pedológicos da Amazônia Legal, o levantamento do uso de solo e da cobertura vegetal em Mato Grosso, o regime pluvial de cada região e ainda foram realizadas duas expedições a campo para identificar pontos de ocorrência de morte do capim Marandu.

O resultado é um mapa que aponta o risco de ocorrência da síndrome em cada região de Mato Grosso, orientando as decisões do produtor. “Identificar as áreas com risco de ocorrência é a primeira informação que o pecuarista precisa para definir qual forrageira usar em sua propriedade. A partir daí entram as informações sobre qual cultivar é mais indicada para a substituição e quais técnicas usar para fazer a reforma da pastagem”, afirma o chefe-geral da Embrapa Meio Ambiente e responsável pela elaboração do zoneamento, Celso Manzatto.

Os dados do zoneamento mostram que 29,5% das áreas usadas em atividades agropecuárias em Mato Grosso têm risco forte ou muito forte de apresentarem a síndrome da morte da braquiária. Isto equivale a 26,5 milhões de hectares que estão em sua maioria situados na Amazônia mato-grossense.

“Em regiões como o noroeste do estado o problema é grave. Isso deverá mudar a forma de uso da terra. São quase 20 anos usando o mesmo capim e, partir de agora, os produtores terão de lançar mão de outras forrageiras. Para viabilizar financeiramente, terão de usar outras estratégias na reforma, como o uso de culturas anuais. Nestas regiões com risco muito forte a forma de uso terá de ser repensada”, alerta Manzatto.

De acordo com o pesquisador, o zoneamento também será um importante instrumento para o direcionamento de políticas públicas, como o Plano ABC (Agricultura de Baixo Carbono). “As informações deste estudo irão orientar os locais onde deve haver esforço adicional para recuperação de pastagens e uso de sistemas integrados, como a integração lavoura-pecuária-floresta, por exemplo”, explica Manzatto.

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