Pecuária

Ivermectina: sob controle?

Após a instrução Normativa, como será que os resíduos do medicamento acima dos limites tolerados na carne estão sendo vigiados pelo governo brasileiro?

Há nove meses o governo brasileiro decidiu colocar um ponto final em uma discussão que sobrava para a pecuária brasileira. No dia 29 de dezembro de 2011 foi publicada, no Diário Oficial da União, a Instrução Normativa (IN) 48, que colocou uma restrição do uso da medicação para o bovino de corte criado em regime de confinamento e semiconfinamento e também para os animais criados em sistema de produção a pasto e que estejam em fase de terminação.

A partir da IN estava proibido o uso de produtos antiparasitários que continham ivermectinas. Embora vista como uma solução positiva, para o setor, a normativa foi considerada ainda insuficiente.

A padronização do uso de produtos antiparasitários tinha como intenção diminuir os problemas do controle de resíduos na proteína, questão que chegou a suspender as exportações de carne industrializada do Brasil para os Estados Unidos. Autoridades sanitárias daquele país devolveram lotes da carne processada pelo grupo JBS, em 2010. O mercado americano manteve-se fechado à carne brasileira por sete meses (junho a dezembro de 2010). Em 2011, um outro lote da multinacional brasileira foi devolvido pelo mesmo motivo.

A medida determinada pelo governo brasileiro ajudou a minimizar os riscos da comercialização dos produtos industrializados, na visão de alguns especialistas. Já na opinião de outros, “restringir o uso não muda nada, é preciso investir em educação sanitária”. De acordo com Egon Vieira da Silva, fiscal federal agropecuária do Ministério da Agricultura, desde que os antiparasitários foram colocados no mercado nunca houve a preocupação em orientar o produtor sobre o uso correto. “O medicamento não é indicado para utilização em animais em lactação, em vacas no início da gestação e em animais que serão enviados para abate. Os resíduos tóxicos do produto são encontrados no leite e na carne dos animais tratados, se não forem observados os períodos de carência indicados”, afirma Silva.

Até então, no Brasil, não havia um limite máximo de dias determinados, e cada laboratório tinha sua própria dosagem, o que implicava em prazos que poderiam necessitar a espera de até 150 dias entre o uso do produto e o abate do animal. “Sem se atentarem para as diferenças entre as marcas dos remédios, muitos produtores acabavam abatendo os bovinos antes do período correto após a aplicação do vermífugo. Daí, a falta de orientação por parte dos pecuaristas”, diz.

Para entender o complexo sanitário e os seus efeitos, todos os animais, independentes da espécie, são acometidos pelo problema verminose e os prejuízos decorrentes são fatores limitantes ao potencial de produção em todo o mundo. A verminose traz grandes prejuízos, como: baixos índices de crescimento dos animais, perda de peso e retardo nas idades reprodutiva e de abate, diminuição na conversão alimentar e, consequentemente, diminuição nas produções de carne e leite, predisposição a outras doenças e até baixa performance reprodutiva. “A ivermectina tem grande aplicação no controle de endo e ectoparasitos de amplo aspecto, derivado das avermectinas. As ivermectinas são substâncias isoladas de culturas de um microorganismo Streptomyces avermitilis. Esses medicamentos incidem no sistema nervoso e alteram as concentrações de substâncias específicas, que levam à paralisia e à eliminação dos parasitas. Devido ao seu amplo espectro de ação, eles têm sido usados rotineiramente em rebanhos de carne e leite. Após a ingestão, a sua concentração máxima é em quatro horas. A meia-vida é de aproximadamente 22 a 28 horas e sua maior concentração é no fígado e no tecido adiposo. Baixos níveis de ivermectina são encontrados no cérebro por ser uma droga muito lipossolúvel e normalmente não atravessam em grande quantidade a barreira hematocefálica e são excretados quase que exclusivamente nas fezes em um período de 12 dias”, explica a pesquisadora Márcia Cristina de Sena Oliveira, pesquisadora da Embrapa Pecuária Sudeste.

Segundo a pesquisadora, devido a sua lipossolubilidade, a ivermectina, apesar de ter uma farmacocinética definida e um prazo aproximado de 12 dias para sua eliminação, esses dados não são totalmente confiáveis, pois drogas que tem grande atração por gordura, são estocadas no tecido adiposo e uma pequena quantidade pode não ser eliminada no prazo adotado, em animais com metabolismo mais lento ou que praticam pouco exercício. “Além do possível retardamento na eliminação desse fármaco, o mesmo estava sendo usado indiscriminadamente e não estava sendo respeitado o período correto para o abate”, diz.

Paulo Cançado, pesquisador da Embrapa Gado de Corte, a ivermectina é uma substância pouco tóxica para o ser humano, utilizada na pecuária bovina para controle de parasitas, sendo oficialmente aprovada para uso em países como Estados Unidos e Brasil. “Porém, os Estados Unidos se utilizou de regras para próprias e não o uso de padrões internacionais, para colocar barreiras na exportação. No entanto, os sistemas para averiguar a quantidade dessa substância na carne bovina diferem em cada um dos países”, diz. “Contudo, há uma necessidade de um controle mais rigoroso e frequente em relação aos medicamentos. O governo deve estabelecer um período para que as em empresas que indicarem prazos de carência inadequados apresentem trabalhos que justifiquem as orientações dadas nas embalagens dos produtos” diz. Segundo ele, a contradição do mercado brasileiro gira em torno de que o Brasil não se tem nenhum controle. “Antigamente avermectinas foram introduzidas no Brasil existia a regra “579”, que representava os meses indicados para uso do medicamento: maio, julho e setembro. “Hoje, se faz necessário, maior fiscalização e monitoramento, e alerta para a resistência às avermectinas em bovinos e ovinos”, afirma.

Na opinião do médico veterinário Marcos Malacco, gerente nacional de produtos para ruminantes da Merial, empresa de saúde animal, o Brasil é um país com uma grande extração de produtos de origem animal e para esse extenso mercado são necessárias regras para uma produção organizada e métodos unificados visando o bem estar animal e dos futuros consumidores, os humanos. “As boas práticas de manejo e as devidas orientações são essenciais para evitar qualquer tipo de problema”, diz Malacco. “Novos produtos disponíveis no mercado oferecem combate e controle de uma série de parasitas, como o berme, a bicheira e a mosca-do-chifre, entre outros. Comprovadamente eficazes, esses produtos mostram eficácia no controle dessas verminoses e, principalmente, não há período de carência ou retirada para o abate dos animais tratados”, afirma.

E para garantir o resultado desse trabalho, pecuaristas como José Romero, proprietário da Fazenda Água Boa, localizada em Mato Grosso, ressalta que é preciso respeitar a época em que este controle começa intensivo. “Um período de muita chuva e calor, com pasto abundante, quando a infestação destes ectoparasitas costuma ser maior”, diz Romero. “Hoje, seguir o correto manejo sanitário e as normas estabelecidas podem garantir espaço no mercado”, afirma o pecuarista que possui 17 mil cabeças de gado, em criação a pasto e em confinamento.

Já o pecuarista Marcos Corteletti, aplica ectoparasiticida no seu gado holandês e até mesmo em vacas ½ sangue, usadas como receptoras. “Fazendo isso conseguimos outras vantagens, já que, após a transferência, a receptora vai para o pasto e só volta a mangueira entre 45 a 60 dias depois, para o toque”. O criador não vê exagero nisso, “Tudo que pudermos fazer para melhorar os resultados temos que fazer e continuar a qualidade do leite. Além disso, 2% a mais que conseguimos no índice de prenhez já cobre com folga o custo de aplicação do produto”, diz o pecuarista que há mais de 40 anos se dedica à atividade leiteira. Nas suas três fazendas, situadas no Estado do Espírito Santo, são produzidos 15 mil litros de leite por dia. Segundo ele, o Brasil, como país de clima predominantemente tropical, “é um ambiente propício para o desenvolvimento de bernes, carrapatos e moscas-dos-chifres. A utilização de substância correta também é prioridade quando o assunto são esses ectoparasitas”.

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