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Dedo de prosa: a espera de novos mercados

“O Brasil ainda não exporta para a União Europeia. Entendíamos a importância de estar habilitado visando não somente o acesso à pequena quota que abrirá para o Brasil quando aprovado, como também esse lado de chancela”.

Mercado europeu, a questão da sanidade, os entraves nas negociações da Argentina são os assuntos que mais se discutem atualmente na suinocultura brasileira. Ao mesmo tempo, o setor se prepara para novos mercados. “Estamos aprovados na China e muito perto de concluir a abertura dos mercados no Japão e na Coreia do Sul”, é o que diz o presidente da Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (Abipecs), Pedro Camargo Neto.

Em entrevista à repórter Fátima Costa, o doutor em Engenharia de Produção pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Camargo Neto, comenta sobre os novos desafios do setor.

Revista Rural – No mês passado, o setor foi surpreendido por duas notícias. Primeiro, a Argentina permitiu a importação de carne suína brasileira. O fim do embargo argentino foi anunciado pelo Ministério da Agricultura. A segunda, é que a China liberou a entrada de carne da suína sem osso. Podemos dizer que são duas boas notícias?

Pedro de Camargo Neto – Não sabemos exatamente o que o governo do Brasil combinou com o da Argentina, mas o que existe até agora não pode ser chamado de “liberação de comércio”. Há uma insegurança jurídica e há falta de transparência na relação comercial. A gente não sabe o quê, quando e como será liberado [o comércio de carne suína para o país vizinho], embora o governo brasileiro tenha informado que os entendimentos entre as equipes técnicas estão em andamento.

Rural – Por que essa situação é ainda complicada?

Camargo Neto – A Argentina está em crise econômica muito séria. A carne suína é importante para nós, porém, para o futuro do Mercosul a questão é muito maior. Infelizmente, caminham na direção errada. Vale destacar que a suspensão da importação da carne suína brasileira pela Argentina começou em fevereiro deste ano. Por mês, as exportações brasileiras variavam entre quatro mil e 4,5 mil toneladas e agora estão em 500 mil toneladas. Em 2011, na lista dos 10 maiores destinos da carne suína brasileira, a Argentina ocupava a quarta posição em volume e receita com participação ao redor de 8%. No primeiro trimestre deste ano, aparece em nono lugar em receita, com percentual de 1,09%. No ranking por volume, sequer aparece.

Rural – No mercado interno quem poderá sofrer maior impacto com as negociações?

Camargo Neto – O Estado do Rio Grande do Sul é o que mais sente o impacto dos entraves com a Argentina.

Rural – Em sua opinião, qual a interferência que o governo brasileiro poderia fazer?

Camargo Neto – O governo está fazendo o que pode. O ministro da Agricultura, Mendes Ribeiro tem grande boa vontade. Mostrou-se um pouco crédulo demais em relação ao que disseram as autoridades do vizinho, porém, aprendeu. Acreditamos que fará o possível.

Rural – O Sr. mencionou sobre o mercado argentino e como é fica a questão do mercado chinês?

Camargo Neto – Em matéria de carne suína, apenas iniciamos as exportações para a China. Os números são ainda muito pequenos.

Rural – Recentemente, outra questão importante de cenário internacional diz respeito à desaceleração da economia chinesa, importante comprador de produtos do agronegócio brasileiro. O desaquecimento desse mercado pode desfavorecer o nosso setor?

Camargo Neto – Não acreditamos que mesmo desacelerando a China reduzirá suas compras de alimentos. Existe um processo irreversível de urbanização e melhora de poder aquisitivo que acarreta na demanda de alimentos. Precisaríamos de uma confusão muito grande naquele país para que se reduzisse a sempre crescente ampliação da demanda.

Rural – Já que estamos falando em mercado. Há seis anos, a Europa não representava uma receita significativa para o Brasil. Uma vez que eles também produzem carne suína e impunham uma série de tarifas e quotas para a importação. Na época, a exportação funcionaria como uma espécie de chancela, para facilitar o acesso a outros mercados e reduzir a grande dependência (naquela época) da Rússia…

Camargo Neto – O Brasil ainda não exporta para a União Europeia. Entendíamos a importância de estar habilitado visando não somente o acesso à pequena quota que abrirá para o Brasil quando aprovado, como também esse lado de chancela. Inúmeros países da Europa oriental seguem a União Europeia (UE). Seria importante avançarmos com a aprovação.

Rural – O que já mudou neste cenário?

Camargo Neto – De certa maneira, o cenário permanece. Avançamos pouco. Entretanto, com outras habilitações. Finalizamos o processo nos Estados Unidos, que também é chancela. Estamos aprovados na China e muito perto de concluir a abertura do mercado no Japão e na Coreia do Sul.

Rural – Quanto representa a Europa na questão da exportação de carne suína brasileira?

Camargo Neto – A União Europeia nunca será muito significativa, como falamos acima.

Rural – E quanto representa as vendas para a Rússia do total de carne suína brasileira?

Camargo Neto – A Rússia já foi o mercado dominante. Ficou em segundo lugar em 2011, porém, acredito que será o maior mercado este ano, mesmo que muito menor do que foi no passado.

Rural – Existem novos mercados em vista para o produto brasileiro?

Camargo Neto – Os maiores importadores são Japão, Rússia, Coreia do Sul, México, Hong Kong e China. As perspectivas em relação a Hong Kong e China são excelentes, e hoje já é nosso maior destino.

Rural – Falando de mercado interno. Hoje, quais os problemas que setor enfrenta?

Camargo Neto – O setor sente muito a crise do milho, que tem sido permanente. Vale lembrar que o grão é responsável por 80% do custo de produção da carne suína. Mas o Brasil também evoluiu muito na produção. Dez anos atrás, não se exportava milho – ele era importado –, mas hoje o Brasil exporta volumes consideráveis. Quando se é exportador, o preço interno equivale ao preço internacional menos alguns custos de logística. Quanto se é importador, ocorre o contrário. Por outro lado também, o problema é a precariedade da infraestrutura de transporte, que encarece nossos produtos. E também a interferência do governo no mercado, com os tais Planos de Escoamento da Produção, que às vezes valorizam a exportação do milho e não necessariamente sua função de alimento para a avicultura e suinocultura nacionais.

Rural – Durante muito tempo, a principal barreira à carne suína no mercado externo era a febre aftosa. Isso ainda persistente?

Camargo Neto – Sim, ainda persiste. A febre aftosa nos bovinos é o que prejudica o suíno.

Rural – No mercado interno, o brasileiro ainda demonstra certo preconceito em relação à carne suína ou isso já mudou?

Camargo Neto – O preconceito quanto ao equívoco de ser uma carne gordurosa continua. Porém, vem crescendo o consumo de cortes in natura e os processados têm seu espaço garantido.

Rural – Para finalizarmos, durante o “Outlook Brasil 2002 – Projeções para o Agronegócio” – a entidade se mostrou otimista com o mercado de modo geral. O que podemos esperar ao longo de 2012 no mercado interno?

Camargo Neto – O futuro é promissor, embora a realidade conjuntural seja pesada. Se o país de fato conseguir “abrir” os mercados japonês e coreano, o que poderá acontecer ainda neste ano, esta fatia tende a alcançar pelo menos 20% de crescimento para o setor. Os dois países são o primeiro e o terceiro maiores mercados do mundo para a carne suína. Aguardamos, principalmente, a retomada do nível de encomendas da Argentina e da Rússia. E para finalizarmos os produtores ainda estão se queixando também da elevação de custos causada pela quebra da safra de milho, no Rio Grande do Sul.

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