Sustentabilidade

Rio produtivo

Na propriedade de quatro alqueires de Cláudio Huver, localizada no município de Domingos Martins, região norte do Estado do Espírito Santo, existia uma área para o cultivo de café e uma destina para a plantação de banana, mas hoje a “menina dos olhos” do produtor é uma área de meio hectare. E lá, que Cláudio Huver conta, e com orgulho, da criação de tilápias que faz há aproximadamente quatro anos. E hoje, além de criador de peixe, o produtor possui no sítio uma área de pesque-pague e um restaurante, que garante, todo o mês, a renda da família e ainda gera empregos diretos na sua propriedade.

Segundo ele, a criação de tilápias foi uma aposta, assim como a de muitos pequenos produtores rurais da região, e dos demais municípios da região Sul-Serrana, centro e norte do Estado, que hoje fazem da criação uma fonte de renda complementar sustentável, e até, muitas vezes lucrativa, destinando o produto à comercialização nos principais mercados.

Com isto, a criação de Cláudio Huver e de mais 75 pequenos produtores rurais e 70 pescadores artesanais modificou a “cara” do Estado. “Hoje o Espírito Santo é uma referência nacional em termos de organização e desenvolvimento de cadeias produtivas aquícolas, não somente da tilápia, mas também do camarão de água doce e da maricultura, principalmente por causa dos trabalhos desenvolvidos em parcerias entre o SEBRAE/ES, o Centro de Tecnologia em Aquicultura e Meio Ambiente (CTA) e os pequenos produtores”, afirma coordenador técnico, Armando Fonseca do CTA.

E a ação destes trabalhos ganhou mais força. Aliada a uma boa produtividade e infra-estrutura fortalecida através de uma parceria entre o SEBRAE/ES, Bandes (Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo S/A.), GERES (Grupo Executivo para Recuperação Economia do Estado do Espírito Santo), Secretaria Estadual de Agricultura e prefeituras, que integram o Programa de Piscicultura Integrada “Peixe na Mesa”, os pequenos produtores ganharam uma alternativa sustentável de diversificação das fontes de renda, uma melhoria na qualidade de vida, a fixação deles no campo e o mais importante: o aumento no orçamento familiar.

“A realização do projeto teve início na região centro-serrana do Estado do Espírito Santo, identificando produtores que desejavam desenvolver o cultivo comercial de tilápia, nos municípios de Muniz Freire, Marechal Floriano, Domingos Martins e Afonso Cláudio, através do trabalho de profissionais do Instituto Ecos e do Centro de Tecnologia em Aqüicultura e Meio Ambiente (CTA)”, conta Armando Fonseca.

Logo depois, o processo de execução foi desencadeado com o trabalho de diagnóstico e seleção das propriedades aptas ao cultivo, seguido de assistência técnica aos produtores e implantação dos parques de cultivo, alcançando em abril de 2004, seu ponto alto com a implantação da Unidade de Beneficiamento de Tilápias de Muniz Freire (Filetadora).

“O modelo de piscicultura proposto pelo Programa “Peixe na Mesa”, com incentivo ao associativismo, levou aos produtores integrados na criação, por exemplo, a criar a Associação Capixaba de Aquicultores (ACA), sediada no município de Muniz Freire, sul do Espírito Santo, e que atualmente tem uma abrangência estadual e até uma boa quantidade de associados do leste de Minas Gerais. Com cerca de 60 filiados, a instituição foi a principal beneficiada com a implantação da filetadora, entreposto onde se agrega valor ao produto e, através de um trabalho direcionado, o disponibiliza ao mercado consumidor”, conta Armando Fonseca do CTA.

De acordo com Flávio Wruck, um dos responsáveis pelo ACA, o entreposto tem capacidade de beneficiamento de até 1.500 Kg de peixes “in natura” por turno de trabalho de (oito horas), conta com câmara de estocagem para congelados, salas de manipulação, embalagem, estocagem de matérias, despolpadeira mecânica e foi implantado dentro dos padrões exigidos pelo Serviço de Inspeção Federal (SIF), do Ministério da Agricultura. “Isto tudo, para atender somente as demandas internas, destinadas para hotéis e restaurantes. Oferecemos aos produtores, a disponibilidade dos transportes dos peixes até o frigorífico e de lá até o ponto de venda. A Associação é hoje a principal responsável pela qualidade do produto à mesa do consumidor”, diz Flávio Wruck.

E não satisfeitos, os produtores não pararam por aí. “Por não possuir um departamento comercial, a Associação Capixaba de Aquicultores – formada pelos produtores integrados ao Programa “Peixe na Mesa” – fez há três meses uma parceria com a empresa Água Doce – Pescados da Aquicultura Familiar, para a comercialização das tilápias. Além de focar na qualidade do produto a ser ofertado, implementar o mix de produtos, contando com os desdobramentos dos produtos da tilápia, como linguiça , filé defumado, entre outros produtos, buscamos mercado para outros pescados, como lambari pacu e outros espécies comercialmente viáveis”, argumenta o proprietário da Água Doce, Rogério Rigoni.

O milagre do Associativismo

Os trabalhos do Programa “Peixe na Mesa” no Norte do Espírito Santo, caracterizado por relevo plano e clima quente (fatores favoráveis para o desenvolvimento da piscicultura), começaram a tomar impulso com a integração de pequenas propriedades rurais do município de Nova Venécia e associações de pescadores de São Mateus e Serra, no Espírito Santo. “Atualmente os trabalhos desenvolvidos nesta região envolvem hoje mais duas associações de pescadores artesanais, sendo estas: a Associação de Pescadores da Lagoa do Juara (APLJ), localizada no município da Serra, e que está realizando a segunda despesca, e a Associação de Pescadores de São Mateus (APESAM), localizada no Norte do Estado e que fez a primeira colheita no Rio Cricaré, resultando em cinco toneladas de peixes. Juntas, elas beneficiam 72 famílias de pescadores artesanais que apostam no cultivo de tilápias em tanques-rede como alternativa de renda à pesca extrativista. Os trabalhos de capacitação dos pescadores e implantação dos parques de cultivo iniciaram-se em 2004, sendo que em janeiro de 2005 aconteceram os primeiros povoamentos das gaiolas em ambos municípios”, conta Armando Fonseca do CTA.

Projetado para ser uma alternativa de fonte de renda o Programa “Peixe na Mesa” tem como os principais benefícios dentro dos municípios, além da geração de trabalho e renda, a diversificação da economia (seja ela basicamente rural ou pesqueira) e geração de divisas. “Para se ter uma idéia, somente a filetadora implantada em Muniz Freire gera atualmente 18 postos de trabalho diretos, ocupados, principalmente pelas mulheres de agricultores que trabalhavam até como “bóias-frias” na colheita de café. Em Jacaraípe (Serra/ES), o trabalho com a comunidade de pescadores (cultivo em tanques-rede como alternativa econômica à pesca artesanal) deu margem para que um dos pescadores estruturasse uma oficina de produção de tanques-rede, que vem sendo muito solicitados aqui no Estado”, revela Armando Fonseca.

As ações do “Peixe na Mesa”

“As ações do Programa “Peixe na Mesa” são direcionadas pela “Metodologia, desenvolvida e implantada pelo SEBRAE, denominada “Metodologia do Programa SEBRAE Aquicultura”, que tem como principal prioridade o Fortalecimento do Associativismo, a Difusão tecnologia e a comercialização”, conta Carlos Bressan, diretor técnico do Sebrae-ES.

Tal metodologia, de propriedade do SEBRAE Nacional, foi desenvolvida no Espírito Santo a partir das experiências acumuladas pelo SEBRAE/ES e parceiros desde 1992, quando iniciaram-se as primeiras ações de potencialização das cadeias produtivas do camarão de água doce e do mexilhão no Estado.

De acordo com o diretor do Sebrae, o programa atende atualmente diretamente, cerca de 100 pequenos produtores rurais em todo o Estado do Espírito Santo. “E indiretamente, cerca de 100 produtores do Norte do Rio de Janeiro e sudeste de Minas Gerais”, conclui Bressan.

E hoje as ações contribuem principalmente para o favorecimento de melhoria das tilápias. “E o SEBRAE/ES apóia todos os elos da Cadeia Produtiva da Aquicultura. Como a produção do alevino (filhotes de peixes) é uma importante parte deste processo, tendo em vista, que a não disponibilidade deste insumo, inviabilizaria o projeto, ou a dificuldade do mesmo, que aumentaria o custo de produtor, é necessário investimos nesta parte da Cadeia Produtiva, por beneficiar diretamente o produtor rural. Pois quando temos um alevino de alta qualidade, conseguimos que o produtor reduza o ciclo produtivo conseguindo obter até três ciclos ao ano, conseqüentemente, 03(três) receitas ao ano”, finaliza.

Melhoramento das Tilápias Capixabas

Sem dúvida, a inovação no ramo da aquicultura fez com que os produtores se conscientizassem da importância da qualidade na aquisição de insumos ou contratação de serviços técnicos. E o modelo bem sucedido de piscicultura proposto pelo programa, por meio da difusão de técnicas modernas de produção, utilização de rações adequadas a custos compatíveis, oferta de alevinos (filhotes de peixe) de qualidade, despertou o interesse em criadores de outros municípios, objetivando integrar mais 50 pequenos e médios produtores rurais até o final do ano de 2005.

Nos últimos anos também, além de agregar maior número de produtores, houve a necessidade também de implantar projetos de melhoria genética das tilápias, com o objetivo de fornecer um produto que atenda às necessidades do mercado. Para isto há mais de três anos, os produtores contam com o Projeto Bioalevinus.

Segundo o coordenador, Armando Fonseca, o intuito é produzir alevinos de qualidade diferenciada para todo o Brasil e promover o desenvolvimento do mercado regional, suprindo suas carência em produtos e serviços. “O projeto Bioalevinus busca o melhoramento genético na produção de alevinos (filhotes de peixes) sexualmente revertidos de tilápia”, esclarece.

O programa de melhoramento genético batizado de “Tilápia Capixaba” teve suas atividades, coordenadas pelo professor do departamento de Biologia da FAESA, Dr. Aldrin Pires, e pelo Diretor Técnico da Bioalevinus, Armando Fonseca que concentraram esforços no aumento do rendimento em filé, na velocidade de ganho de peso do peixe e automaticamente na redução dos índices de conversão alimentar da linhagem, resultados constantemente buscados pelo mercado por estarem diretamente ligados ao retorno financeiro dos tilapicultores e das indústrias.

Em busca do melhor

Atualmente, boa parte das unidades de beneficiamento de tilápias que produzem o filé deste peixe, remuneram o produtor com base em critérios como uniformidade do lote e rendimento em filé, como é o caso da ACA – Associação Capixaba de Aquicultores. Esta política de remuneração adotada na agroindústria leva a uma constante busca pela profissionalização na produção de peixes, “premiando” economicamente o produtor que obtém os melhores resultados em sua criação.

Com este crescimento, outras formas foram necessárias para melhorar ainda mais o produto final e por isso novos investimentos vem sendo realizados na área de produção de alevinos de tilápia tailandesa da linhagem Thai-Chitralada, revertidos sexualmente através da técnica de coleta de ovos na boca das fêmeas e incubação dos mesmos em laboratório.

Atualmente, em busca desta qualidade, pode se dizer que na propriedade de Cláudio Huver, estes novos investimentos foram feitos. Nos viveiros de engorda, já se pode dizer que as fêmeas não são bem vindas e os tanques contam com a predominância dos machos. “Hoje nos tanques temos 99 a 560 da população de machos. Isto favorece os pequenos produtores, pois a presença de grande quantidade de fêmeas (acima de 3% do lote) nos viveiros de engorda tilápias reduz drasticamente o desempenho produtivo e econômico do lote em questão, devido ao menor desempenho zootécnico das fêmeas (menor crescimento)”, diz.

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