Pecuária

Aftosa ainda é barreira séria para conquista do mercado externo

E este não é único motivo para comemoração da atividade. Os preços da arroba do boi gordo mantiveram-se superiores a US$ 20 durante todo o ano e a produção superou 6,5 milhões de toneladas. Com todos estes indicadores não é surpresa que a pecuária fosse o destaque do agronegócio brasileiro em 2000, com crescimento de 5%.

Outros números, no entanto, tiram um pouco o brilho da bovinocultura. E números igualmente expressivos. Em 2000 foram quase 50 focos de febre aftosa e sacrifício pelo menos 11 mil animais infectados. Obviamente que os fabricantes de vacina estão satisfeitos com a comercialização de 290 milhões de doses de vacina. Afinal, trata-se de um recorde: quase 20% a mais do que em 1999. Mas, a indústria também vê com desconfiança a freqüente ocorrência de focos de aftosa, especialmente os verificados no Rio Grande do Sul, Argentina e Paraguai. Esses casos, aliás, encobrem uma realidade preocupante e trazem à tona uma questão absolutamente fundamental: por que ainda enfrentamos tantos casos de febre aftosa no Mercosul?

A resposta é complexa. Falando especialmente dos focos corridos no Rio Grande do Sul, há alguns fatos que merecem comentário. O primeiro deles, diz, a demora para a comunicação oficial dos casos. Aparentemente, a fiscalização falhou e a tardia identificação no município de Jóia para cidades vizinhas. Tão importante quando isso, ao que parece que os pecuaristas da região não estavam levando a vacinação com a seriedade necessária. Rio Grande do Sul e Santa Catarina foram rebanhos em maio, pela Organização Internacional de Epizootias (OIE). Desde 1996, eram áreas livres com vacinação; neste ano, ganharam novo status sanitário. Mas, ao que parece, pequena parcela de criadores havia decidido por si mesma parar com a imunização antes da chancela da OIE.

Os números comprovam. O Ministério da Agricultura previu, ainda em 1999, que o Rio Grande do Sul consumiria 8,8 milhões de doses de vacina contra febre aftosa na primeira etapa da campanha de 2000, em janeiro. A indústria vendeu 7,4 milhões/doses no estado. Ou seja,1,4 milhão de doses a menos do que o previsto, ou redução de 16%. Santa Catarina está exatamente na mesma condição sanitária do estado vizinho, já que parte do circuito Pecuário Sul. Porém, apesar de menor rebanho bovino, manteve-se dentro das expectativas: antes á previsão de consumir 2,5 milhões de doses em janeiro, adquiriu 2,4 milhões.

O Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Saúde Animal (Sindan), entidade que representa os laboratórios veterinários do País, alertou o Ministério da Agricultura dessa redução da vacinação no rio Grande do Sul ainda no primeiro semestre. Seja como for, os focos ocorridos em agosto jogaram por terra o sonho de tornar quase todo o Centro-Sul livre da aftosa em 2000. Mesmo Assim, ainda seria possível contornar a situação, caso a identificação dos animais positivos fosse feita rápida e eficiente. Aí entrou em cena um ingrediente preocupante, mas extremamente importante dessa questão.

O governo gaúcho e o Ministério da Agricultura passaram a se agredir mutuamente, desviando-se de duas funções mais elementares, a rápida e eficaz erradicação da aftosa da região de Jóia. Vejam vocês que alguns dias antes do anúncio oficial dos focos no interior gaúcho, divulgou-se a ocorrência de aftosa no interior da Argentina. Entretanto, os argentinos não reconheceram que houve efetivamente casos clínicos de aftosa no país, alegando que havia apenas reações sorológicas em alguns animais. Mas a verdade é que foram sacrificados mais de 5 mil animais no país vizinho e ninguém de bom senso pode acreditar que tratam apenas das propaladas reações sorológicas.

Na ocasião, houve quem reclamasse da Organização Internacional das Epizootias, que manteve o status de área livre da Argentina, mas suspendeu no Circuito Pecuário Sul (RS e SC). Mas, sejamos corretos: os argentinos foram mais esperados que nós perante o mundo, em que pese não terem sido levados a sério pelas autoridades sanitárias dos demais países do Mercosul. 2000 realmente não é um ano para ser lembrando no Mercosul como exemplo de saúde animal. Todos os quatros países ( Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai) foram, de uma maneira ou de outra, atingidos pela febre aftosa. Mas a diferença fundamental entre as nações foi a forma como o assunto foi conduzido. Imediatamente após a confirmação dos focos no Brasil, o Uruguai fechou sua fronteiras como o nosso país e apenas agora está renegociando a compra de carne suína.

Os pecuaristas do Paraguai vêm há vários meses adquirindo vacina de revendedores brasileiros, certamente para aplacar problemas. A Argentina, como já dissemos, agiu rápido. Mas estes dois países têm em comum o fato de não terem reconhecido os focos de aftosa em seus territórios, apesar de veterinários terem visto claramente lesões típicas da doença, já cicatrizadas até, em dezenas de animais. Apesar de tudo, Brasil e Uruguai tiveram a coragem de comunicar os casos ocorridos internamente á OIE e enfrentaram de peito aberto os prejuízos econômicos dessa decisão. Que fique bem claro que o Brasil é um país sério e que não age furtivamente, escondendo seus problemas. Mas que o ocorrido sirva de lição para 2001, ano em que todo o Circuito Pecuário Leste (TO, RJ, ES, BA e SE), além das zonas-tampão do Centro-Oeste e o MS deverão ser consideradas áreas livres da aftosa. Serão mais 55 milhões de bovinos livres da doença.

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