Agricultura

Laranja quer aumentar consumo doméstico

Desestimulados por custos altos e preços baixos, os citricultores brasileiros procuram incluir o suco de laranja nos programas de merenda escolar e no programa de cestas básicas. os líderes do setor acreditam que a união dos produtores e o crescimento do mercado interno sejam soluções para enfrentar a safra e as oscilações do mercado externo.

De cada 10 copos de suco de laranja consumidos no mundo, oito foram produzidos e São Paulo, Brasil. O Estado cultiva laranja em 330 municípios e responde por 80% da produção brasileira de citros e 95% da produção de suco para exportações. Na prática, isso representa divisas de US$ 1,1 bilhão apenas com suco para o país e emprego direto e indireto para aproximadamente 400 mil pessoas no Estado de São Paulo. O Brasil é o maior produtor mundial de laranja e suco de laranja. A rápida análise entusiasma e cria expectativas de futuro sólido para o setor.

A realidade, porém é outra. Valdir Vertuan, presidente da Associação Brasileira de Citricultores (Associtrus), explica que a situação mostra-se desanimadora para os produtores que não têm contrato de venda da produção com as indústrias de suco. Ele acredita que, entre 20% e 30% de pequenos alguns grandes produtores, vão abandonar a atividade, após a safra 2000/2001. O motivo? A falta de preços que estimulem a atividade e os investimentos necessários em tratos culturais e aumento da produtividade.

“Desde 1997, a situação piora para os produtores . E manter-se na atividade torna-se mais difícil a cada safra”, explica. Na verdade, o quadro de dificuldades vem sendo delineado nos últimos 10 anos, com a oscilação freqüente dos preços determinados pela indústria. Devem permanecer na atividade apenas os produtores com contrato.

Na opinião dele, o setor atravessa uma crise conjuntural. Para entender o cenário convém lembrar alguns pontos básicos. Por exemplo, o mercado internacional de suco concentrado está sendo achatado pela procura por suco fresco. Há 10 anos, o suco concentrado respondia por 84% /86% do mercado. Hoje, esse índice baixou para 52%. Vertuan conta que a exigência maior por esse tipo de suco provém da União Européia, embora os Estados Unidos também estejam interessados em alterar os hábitos de consumo de sucos concentrado.

Outro ponto importante a ser considerado são tarifas. A parcela importada pelos Estados Unidos, por exemplo, paga tarifas aduaneiras de US$ 415,00 por toneladas e representa 20% da comercialização brasileira. Já a União Européia, que corresponde a 70% da comercialização, paga tarifas de 15% ad valorem sobre o preço do suco desembarcado. Já a Alca, por sua vez isenta o México de tarifas na comercialização com os Estados Unidos.

Uma tonelada de suco concentrado significa a utilização de 250 caixas de 40,8 kg de fruta. Segundo dados de instituição de Economia Agrícola (IEA), órgão da Secretária da Agricultura e Abastecimento de São Paulo, o custo de cada caixa oscila entre R$ 2,70 e R$ 2,80 para o produtor, que recebia preços em torno de R$ 1,80, no início da safra, de acordo com o contrato com a indústria. “Nessas condições, a exportação brasileira deixa de ser competitiva”, conclui Vertuan.

A situação torna-se mais grave, quando se constata que o país não registra planejamento para o setor. Ele assegura que o quadro atual da produção citrícola é dominada por grandes grupos e indústrias que também são produtores. Nos anos 80, no entanto, havia fomento para produzir laranja, já que o mercado apontava nessa direção.

Nesta safra – 2000/2001, estimada em 365,8 milhões de caixas, 8,6% menor que a safra 1999/2000, conforme o IEA.Convém lembrar que 5% desse total representam perdas normais em cada safra. Mais: dois milhões de caixas de fruta fresca são exportadas. A indústria deve esmagar apenas 260 milhões de caixas, porque tem estoque. A média de esmagamento sempre oscilou 280 e 300 milhões de caixas. Sobram, portanto, 85 milhões para mercado interno, apenas em São Paulo.

Na verdade 70% das frutas produzidas no Brasil são transformados em suco. Os 30% restantes são consumidos no mercado interno – dois terços em São Paulo e um terço em São Paulo e um terço em outras regiões do país. Esse mercado, que já consumiu 100 milhões de caixas, atualmente não ultrapassa 70 / 80 milhões de caixas/ano. Portanto, precisa ser reativado.

Vertuan defende algumas medidas, para permitir maior garantia aos pequenos produtores e ao setor. Salienta, por exemplo, a necessidade de o governo federal reforçar mundialmente o papel do Brasil como produtor de citros e negociar de forma mais rígida na busca por preços atraentes. “O governo federal deveria levar técnicos e produtores no momento das negociações”, sugere.

Acredita que o Custo Brasil, entre os quais impostos como ICMS (Imposto sobre Circulação e Mercadorias) e pedágios, necessita ser minimizado. Mais: não há planejamento e diferenças de benefícios para pequenos e grandes produtores.

Outra medida correta seria a possibilidade de incluir o suco de laranja nos programas de merenda escolar e da cesta básica. “Embora o suco de laranja seja considerado refresco, sabe-se que é alimento”, reclama ele. Para ele, a iniciativa ser adotada pelo governo federal e estadual. Ele acredita, por exemplo, que o programa de merenda escolar absorva 20 milhões de caixas/ano no Estado de São Paulo. Já para o aumento do consumo de suco e de fruta fresca no mercado interno, o governo poderia usar horários em televisão.

Ele reforça complexidade da situação, já que mais árvores em produção, mesmo considerando que a média de produtividade é de 1,8 caixa/pé no Brasil e de 2,1 caixa/pés em São Paulo, enquanto nos Estados Unidos esse índice alcança 3,2 caixas/pés. O mercado interno precisa ser trabalhado para crescer. E as indústrias, por sua vez, têm estoque. A busca por novas culturas poderia ser a saída para os pequenos produtores. Diante do quadro, Vertuan não hesita em afirmar que “normalmente subsidiada no mundo, a agricultura é sacrificada no Brasil”.

Esse cenário e aposta na diversificação de culturas são compartilhados por Marco Antônio dos Santos, presidente do Sindicato Rural de Taquaritinga e da Associação dos Citricultores do Estado de São Paulo (Aciesp). Ele garante que, por orientação do próprio sindicato, os produtores da região mesclam a produção de citros com goiaba, manga, mandioca e maracujá.

Ainda assim, a situação é complexa para a comercialização de citros. Ele afirma que os contratos com as fábricas, com preços de R$ 1,80 a caixa colocada na porta da fábrica, em agosto deste ano, representam 30% dos produtores e aproximadamente 50% da safra. Na contabilidade dele, 300 produtores do Estado detêm acima de 250 mil pés/cada; mil produtores, 40 mil pés cada; 10,9 mil produtores, 40 mil pés cada; 10,9 mil produtores, 5 mil pés cada; 10,9 mil produtores, 5 mil pés cada.

Santos define perspectivas desanimadoras para esta safra a exemplo do que ocorreu em 1999. “Houve um verdadeiro estrago. Da safra de 400 milhões de caixas, 60 milhões de caixas permaneceram no chão”, garante. A causa? Estoque por parte das indústrias. Os preços caíram substancialmente na porta da fábrica. Ele conta que, em janeiro do ano passado, a caixa valia entre US$ 4,00 e US$ 4,50 e US$ 5,00. Em julho baixou para US$ 0,50. “O setor precisa de regulamentação, que estabeleça normas para plantio, exportação e comércio de fruta fresca”, defende. Para ele, a atividade deveria ser conduzida como nos Estados Unidos, com programas de plantio, produção e industrialização. E, principalmente, com a participação de produtores e indústria”.

Para o Brasil, ele aponta produtores desorganizados e falta de vontade política. “Trata-se de um setor marginal e sem regulamentação”, define. A resolução passa pelo preço do suco, que se transformará em hábito alimentar, quando for barato. Na opinião de Santos, as prefeituras municipais podem auxiliar, ao incluírem o suco na merenda escolar.

Mas produção e demanda equilibradas é que representam a real solução para o setor.

Ademerval Garcia, presidente da Associação Brasileira dos Exportadores de Cítricos (Abecitrus) e do Fundo Paulista de Defesa da Citricultura (Fundecitrus) aposta em um tripé para equacionar a citricultura: organização política dos produtores, ampliação do tema.

A exemplo dos demais líderes do setor, ele acredita que a inclusão do suco de laranja na merenda escolar por parte das prefeituras municipais, a possibilidade de venda da laranja em praças e avenidas, a melhoria das estradas vicinais e o combate ao cancro cítricos constituiriam soluções para o consumo da produção brasileira.

Garcia garante que a indústria não tem como absorver o excesso de produção. Aponta como causa do quadro atual a estrutura do setor, que cresceu substancialmente entre 1961 e 1994.

Daquele ano em diante, houve estabilização nos números e o suco concentrado passou a responder por médias de exportação em torno de 1,100 milhão de toneladas/ano. Neta safra, o total deve baixar para 950 mil toneladas.

Nessa safra surge outro problema, além da baixa do total, causada pela seca. Os Estados Unidos, grande comprador, anuncia auto-suficiência, para a próxima safra. Isso coroa os esforços norte-americanos iniciados nos anos 80, após as grandes geadas da Flórida. “O Brasil perde um cliente ganha um com mais suporte e custos mais favoráveis”, afirma Garcia.

Esse panorama completa-se com a política da União Européia, que pratica o que ele classifica como protecionismo criativo. Ou seja, oferece tarifa zero a países sem tradição em citros, como costa Rica e Marrocos.

Paralelamente, convém lembrar que o mercado mundial de suco concentrado continuou crescendo.

Como conseqüência, o Brasil apresenta crescimento de estoques. “Hoje, chegamos a 400 mil toneladas, enquanto o ideal é oscilar entre 100 mil e 110 mil”, explica.

Garcia é cético quanto ao futuro. “Se o Brasil continuar nesse passo, vai morro abaixo. A produção mundial tende a crescer”, assegura. Se o país exportar menos, reduz geração de divisas. Mais: garante a permanência no setor apenas de produtores com produtividade acima de 3 caixa/pé, índice considerado competitivo.

Resta a opção do mercado interno, embora implique em mais trabalho, mais custo e melhor gerenciamento da atividade para o produtor. A capacidade do mercado interno é de 200 milhões de caixas, segundo ele. O consumo brasileiro por capita pode chegar a 30 litros. Nos Estados Unidos, o consumo é de 40 litros per capita.

A criação paralela de um mercado interno do consumo também é atraente para Garcia. Em 1993, esse mercado totalizava um milhão de litros. No passado, somou 200 milhões de litros.

Antonio Ambrosio Amaro, pesquisador do IEA, garante que o país enfrenta uma safra atípica, que deve se estender até fevereiro/março do próximo ano. Do total de 365 milhões de caixas, 80 milhões representam frutas temporonas, segundo ele. Isso complica ainda mais o quadro, pois significa que as fábricas de suco vão esmagar até mais tarde. Por outro lado, o mercado terá suco em pleno verão. Ele partilha o consenso do plantio desmedido de pomares como uma das causas do quadro atual do setor e também enfatiza a necessidade da busca do mercado interno por, meio de campanhas profissionais de marketing. Lembra, porém, que a abertura futura do mercado chinês para suco de laranja pode beneficiar o Brasil.

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