Esse é o resultado de uma alimentação rica em proteína, energia e mineral para ter, no final da terminação, um boi de arroba competitiva no mercado. Dentro do sistema de produção de carne bovina, a alimentação – aliada às boas práticas agropecuárias de manejo e sanidade – tem um papel fundamental para o desenvolvimento de uma atividade que preza por maiores resultados de engorda de animais, num menor tempo possível.
E o produtor brasileiro está bem servido quando o assunto é pesquisa nessa área. Um exemplo disso é o trabalho desenvolvido na unidade de bovinocultura de corte do Departamento de Zootecnia, da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, da Universidade de São Paulo (Esalq/USP), em Piracicaba (SP).
Lá, as linhas de estudo guiam um sistema intensivo de produção de cria, recria, seleção de reprodutores e terminação em confinamento que, através de uma alimentação rica e balanceada em energia, proteína, fibras, minerais e vitaminas, ao final de 90 dias, resulta num animal na faixa de 18 a 24 meses de idade, com 500 a 520 kg de peso vivo.
A partir de experiências e pesquisas da própria instituição de ensino, bem como pelos resultados obtidos na prática em fazendas acompanhadas pelos pesquisadores da universidade, a alimentação do rebanho, constituído pelas raças Nelore e Canchim, teve uma atenção especial. Em cinco anos de estudos, considerando a necessidade de cada categoria animal (vaca, novilha, bezerro, boi magro ou mesmo reprodutor), a nutrição de melhor desempenho mostrou-se através da oferta de um pasto de qualidade, bem adubado, como fonte protéica; uma suplementação de concentrado energético disponibilizado ainda em pasto, no qual o milho e os derivados dele podem ser a grande fonte; e a oferta balanceada de mineral, equilibrando a dieta para uma produção satisfatória de carne.
Vaca bem nutrida é vaca fértil
Os estudos começam com a parição de bezerros. Para o produtor que tem o sistema de cria como parte do processo produtivo, é essencial a disponibilidade de uma boa alimentação para novilhas e vacas. “O fator mais importante para a lucratividade, nesse sistema”, aponta Flávio Augusto Portela Santos, pesquisador Esalq/USP, “é a vaca parir um bezerro todo o ano. Essa fertilidade da vaca, essa habilidade de desmamar um bezerro pesado, em boas condições, depende em grande parte do manejo nutricional”.
Pasto bem manejado, adubado e farto, com alta lotação, e suplementação com mineral, durante o verão, e suplementação no cocho com cana-de-açúcar, ureia e sal mineral, na seca, é a dieta que essa vaca receberá para garantir a produção da bezerrada. De acordo com Santos, o fundamental para isso é o pecuarista ter essa vaca em condições corporais adequadas no momento do parto. Numa escala visual de 1 a 9 – na qual, 1, é uma vaca muito magra, e 9, obesa – o ideal ter esse animal em condição corporal 6. “Isso vai garantir que ela vá parir e ter reserva suficiente para produzir bastante leite para o bezerro, para que se possa desmamá-lo pesado lá na frente. E essa reserva de alimento também terá um impacto muito grande na fertilidade dela, garantindo que a vaca fique prenhe, de forma efetiva, na próxima estação de monta”, explica Santos. Com esse trabalho, num período de monta de 90 dias com 100 vacas, estima-se que, no mínimo, 85 delas fiquem prenhes no final.
Recria
Com a desmama a partir de maio a junho, dentro do sistema de produção da Esalq/USP, os bezerros são recriados no inverno, com oferta de pasto e suplementação, e entram no período das águas, a partir de outubro, no sistema intensivo de recria, com pasto altamente adubado mais suplementação com concentrado energético no cocho. Segundo Santos, o bezerro entra nesse sistema com 200 quilos (kg) ou mais, aproximadamente, e é recriado com um ganho que vai de baixo a moderado, durante a seca. No verão, o animal mantém um ganho médio próximo a 900 gramas (g) por dia.
O manejo adequado com as forragens garantirá a riqueza em proteína. Uma variedade, como a Brachiaria brizantha cultivar (cv.) Marandu, comumente conhecida como ‘braquiarão’ – uma das culturas estudadas pela Esalq/USP – quando bem manejada e adubada, produz um alto teor de proteína bruta, quando colhida no ponto certo. “Ao contrário do que o pecuarista acredita, e que muitas vezes a indústria vende a ideia de que o teor de proteína bruta está relacionado a tal cultivar, ou a tal espécie de gramínea, na realidade, isso depende basicamente de dois fatores: (1) a dose de nitrogênio que se põe no adubo (adubo nitrogenado, como ureia, nitrato de amônio, sulfato de amônio); (2) e o ponto ideal de colheita desse pasto”, esclarece Santos. No caso do ‘braquiarão’, esse ponto ideal de colheita será com 25 centímetros (cm) de altura e a retirada do lote do pasto quando a cultura estiver com 15 cm. Cada variedade ou espécie terá um ponto específico de colheita (que se refere à entrada dos animais para pastejo) e saída dos lotes. A Brachiaria bizantha cv. Xaraés pode ser manejada de 30 cm (entrada) até 15 cm (saída). No gênero Panicum, por exemplo, o capim Tanzânia está bom com 70 cm de altura (entrada) e saída com 30 cm; já o Mombaça pode ser pastejado com 90 cm de altura e com a saída dos animais quando atingir 30 cm.
Se a adubação é zero em nitrogênio, o teor de proteína bruta na planta vai ficar entre 8% a 12%, colhido pelo animal. Mas como se quer por uma lotação alta por hectare, a adubação com nitrogênio deve chegar a 300 kg por hectare no período das águas. “Nós chegamos a jogar, 600 a 800 kg de ureia por hectare, ou 1.000 kg de nitrato de amônio por hectare, com isso a planta chega a ter 20 a 22% de proteína bruta”, calcula Santos.
Aliado ao pasto, o lote de recria intensiva da Esalq/USP também recebe uma suplementação energética durante as águas. “Quando suplementamos esse animal o que nós damos a ele é uma fonte energética, à base de milho ou polpa cítrica, pode ser a mistura desses ingredientes, ou casquinha de soja, ou sorgo, ou farelo de trigo mais milho, enfim, uma série de combinações, para se aproveitar ao máximo a proteína do pasto”, explica. Esse processo garante a melhor conversão alimentar do bezerro.
Custos
Uma área rica em adubação nitrogenada poderá comportar uma lotação alta no verão, com a disposição de seis a nove Unidades Animais (UA – que corresponde a um animal de 450 kg) por hectare – isso significa de 10 a 14 bezerros, de 200 kg por hectare. Num ciclo de sete meses, no período das águas (que pode ser compreendido de outubro a abril, ou de novembro até o final de maio), com uma lotação próxima a 10 bezerros por hectare, a adubação poderá custar R$ 1.200 por hectare, R$ 120 por animal (95% disso é função do custo do fertilizante, inclusos ainda – os 5% restantes – a mão-de-obra, o maquinário, a manutenção de cerca e água, e a formação do pasto).
Com a oferta do concentrado energético o custo diário por animal poderá ficar próximo a R$ 0,50. Dependendo da região do País, o bezerro poderá comer 1.800 g de concentrado, em média – já incluindo o mineral e um promotor de crescimento nessa mistura.
No final das contas, os custos totais ficam próximos a R$ 260 reais, por animal, nesses sete meses, com a suplementação e a adubação. Isso, de acordo com Santos, faz algo entre 180 a 200 kg de peso vivo (ou seis a sete arrobas). “Esse custo tem se reproduzido em condições comerciais, em grande escala, como a gente tem observado. E pode ser implantado tanto para o pequeno e médio produtor. Não é porque esse sistema é adubado, que é caro, que não é viável para produção. Ele produz uma arroba altamente competitiva, e torna a produção de carne por área, e a rentabilidade por área, da pecuária de corte, competitiva com os sistemas modernos de agricultura, aqui na região de São Paulo, por exemplo, como a cana-de-açúcar, e em outras regiões, como a soja e o milho”, compara Santos.
Terminação em confinamento
Por receber uma alimentação suplementada enquanto estava a pasto, o animal garantirá melhores resultados na fase de terminação em confinamento. “Quando esse animal recebe essa suplementação com concentrado durante as águas, antes de entrar no confinamento final, ele entra mais adaptado a esse sistema”, observa Santos. “Ele se torna um animal mais manso, não sentirá a diferença na dieta de alta energia disponibilizada durante o confinamento. Além disso, esse animal, ao entrar no piquete, não vai ficar no fundo do confinamento nos primeiros dias, assustado. Ele já vai saber o que tem no cocho para comer”, relata o especialista. Esse tipo de comportamento será o diferencial desse animal, o que lhe garantirá maior vantagem em termos de ganho de peso diário em relação aos que não receberam essa suplementação.
No confinamento, de acordo com o pesquisador, o maior custo será da própria compra do boi magro – isso no caso de quem só fará a terminação do animal. No entanto, se for analisado o custo operacional da atividade, será o manejo nutricional que trará maiores custos ao pecuarista, que pode variar de R$ 3 a R$ 4 reais por boi ao dia, dependendo da região do País e dos preços praticados no mercado.
Dois fatores são essenciais para a garantia de rentabilidade no negócio de confinamento, segundo o pesquisador Flávio Santos: (1º) é o comercial, com uma boa compra do boi magro, ou bezerro. “Se ele comprar uma arroba muita cara, ele já vai ter dificuldade de diluir esse custo – por isso ele tem de comprar bem e saber vender bem, com todos os recursos que existem hoje de garantia de preço e mercado futuro”, aconselha; (2º) é necessário o melhor desempenho técnico da atividade, o qual se refere ao manejo nutricional dos animais, a uma dieta bem formulada e o tratamento adequado aos animais.
Dieta balanceada
Dependendo das condições de mercado, dos preços praticados e das opções da própria fazenda, o pecuarista faz a decisão sobre como vai disponibilizar a ração de cocho, para a terminação dos animais. A opção de oferecer concentrado aos animais nessa fase tem se mostrado favorável devido à viabilidade de mercado atual, segundo Santos. Nesse sentido, também segue a produção lá no setor de confinamento da universidade. No cocho, a ração é constituída de 12% de volumoso (que pode ser a silagem de milho, sorgo ou capim, cana-de-açúcar picada ou ensilada, ou até mesmo o bagaço dela) e 88% de concentrado, no qual o milho e os derivados dele apresentam-se como fontes principais nos estudos da Esalq/USP.
Nada a mais e nada a menos – o equilíbrio nutricional tem de dispor aos animais energia, proteína e mineral para o desenvolvimento de ganho de peso. Com base nas especificações nutricionais da ração, poderá avaliar o que sobra e o que falta no sal mineral. Em termos gerais, os minerais mais importantes, que tem de estar presente nessa mistura, são cálcio (Ca), fósforo (P), sódio (Na), zinco (Zn), cobre (Cu), iodo (I), cobalto (Co) e selênio (Se), de acordo com o pesquisador e especialista em nutrição de ruminantes da Embrapa Gado de Corte, em Campo Grande (MS), Sergio Raposo de Medeiros.
A quantidade necessária de cada um desses minerais na composição do sal, ou mesmo se há outros mais que necessitem entrar na mistura, como o enxofre (S), por exemplo, vai depender da quantidade e da qualidade de matéria seca ingerida pelo animal. A matéria seca corresponde simplesmente a todo alimento consumido pelo boi descontado a água (o capim, por exemplo, tem uma porção de água nele, quando dessecado se torna apenas a matéria seca). “Assim, por exemplo, se um animal ingere 10 kg ao dia de matéria seca e sua exigência é de 0,11% de sódio, significa que ele deve ingerir 11 g de sódio por dia”, explica Medeiros.
Outra atenção que se deve ter também, na composição da mistura do sal, está na relação de quantidade de Ca por P. “Ainda usando o exemplo de consumo diário de 10 kg de matéria seca, se o animal tiver exigência de 0,4% de Ca, significa que essa dieta precisaria ter 40 g de Ca e, portanto, o P deveria, idealmente, ficar próximo a 20 g, para dar uma relação 2:1 [duas partes de cálcio para cada uma parte de fósforo]. Na verdade, dietas com até 7:1 não apresentariam problemas. O mais importante é não deixar a relação menor do que 1:1, e, outra coisa, mais importante que essa relação entre Ca e P é, obviamente, o atendimento das exigências nutricionais dos animais”, declara.
Fontes alternativas
Dependendo do que for oferecido de concentrado, as quantidades disponibilizadas no sal mineral poderão variar. “Por exemplo, uma ração com alto teor de concentrado, onde o energético é o milho e o sorgo, isso é rico em fósforo, então um boi que tem uma dieta como essa, com alta concentração de milho, ou quem usa sorgo, fósforo já está sobrando na ração. O mineral dele não precisa ter fósforo na composição, ele precisa ter cálcio, além dos outros minerais, então é isso que ele tem de fazer para economizar”, diz o pesquisador da Esalq/USP. Outro exemplo, é o concentrado a base de polpa cítrica, como fonte energética. Segundo Santos, ela é rica em cálcio, mas pobre em fósforo. “Não há uma fórmula milagrosa e o pecuarista não pode formular algo de cabeça. Tem de ter todo um acompanhamento técnico para isso, e hoje as próprias indústrias que vendem esse mineral fazem esse tipo de trabalho, fornecendo o que realmente for necessário ao rebanho do produtor”, explica.