Agricultura

Dedo de prosa: Este será o ministério do diálogo

Em cerimônia realizada dia 5 de janeiro, a senadora Kátia Abreu recebeu, pelo ex-ministro, Neri Geller, a chefia do Ministério da Agricultura. Ela, que é senadora do PMDB pelo estado do Tocantins e presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, é a centésima vigésima pessoa a ocupar o posto e a primeira mulher no cargo, e falou para a Revista Rural sobre os desafios que a esperam no cargo e como pretende vencer a desconfiança de alguns setores e movimentos sociais com a sua indicação.

Revista Rural – A senhora é vista há tempos como grande defensora da classe ruralista e acaba de assumir o Ministério da Agricultura, podendo, a partir de agora, ser promotora de uma série de mudanças que julga necessárias para o desenvolvimento do agronegócio. Como a senhora recebe essa incumbência e o que pretende fazer prioritariamente?

Kátia Abreu – Ao assumir esse cargo, passo a fazer parte de uma história valorosa, que começou ainda durante o Império, sob comando de Dom Pedro II, em 1860, quando foi criada a Secretaria de Estado de Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Assumo a função com o compromisso com a organização, estruturação e implantação da Escola Brasileira do profissional da Agricultura e Pecuária. Uma escola que capacite, forme e fortaleça os profissionais do sistema público da agricultura dos municípios, estados e do Ministério da Agricultura.

Rural – No discurso de posse, a senhora falou sobre a necessidade de melhorar as condições de vida e acelerar o enriquecimento da classe produtora. A senhora tem esse como seu principal desafio no momento?

Abreu – Esse desafio foi determinado pela própria presidenta (sic) da República, Dilma Rousseff, e visa ampliar a classe média rural brasileira. Vamos estabelecer como meta dobrar a classe média rural nos próximos quatro anos. Hoje o Brasil tem mais de 5 milhões de produtores, sendo que 70% nas classes D e E, 6% nas classes A e B, e apenas 15%, algo em torno de 800 mil produtores, na classe C. O agronegócio deve estimular pequenos, médios e grandes produtores a se desenvolverem e permitir que o país se transforme em um “continente de prosperidade”, e não apenas em “ilhas de prosperidade”. Este ministério terá os olhos voltados todo o tempo para a mais importante das peças, a mais eficiente, os produtores rurais. Se eles tiverem sucesso em sua atividade, ganha a sociedade como um todo.

Rural – Então, qual o seu principal desafio pessoal nesse início de trabalho?

Abreu – Precisamos consolidar um planejamento nacional de defesa agropecuária, construído por meio de parceria do poder público, iniciativa privada e nossa valorosa Academia. Os fóruns de secretários de agricultura e de órgãos serão parceiros e orientadores. Queremos solidez técnica para garantir confiabilidade para os nossos consumidores no Brasil e no mundo. A meta é garantir padronização, transparência e segurança.

Rural – Como a senhora analisa o momento vivido pelo agronegócio?

Abreu – A produção de grãos no Brasil, na safra 2014/2015, deverá ser de aproximadamente 202,18 milhões de toneladas. O volume é 4,5% superior à safra passada, o que representa 8,75 milhões de toneladas a mais do que o registrado anteriormente. O agronegócio não tem decepcionado. São sempre boas notícias. O aumento da produtividade superou as expectativas. Os produtores podem co-memorar, pois estão em situação confortável com o aumento na produtividade e lucratividade nas exportações. O PIB Agro de 2015 tem grandes chances de ser melhor que o de 2014. O produtor tem crédito disponível. Nesses cinco meses de Plano Agrícola e Pecuário, já foram tomados R$ 70 bilhões do crédito rural disponível, 14% a mais se comparado ao Plano passado. Existe a possibilidade de aumento dos custos. Entretanto, acredito que isso ocorrerá somente para a safra 2015/2016, já que para esta safra já foi plantada e a venda antecipada. Mas certamente vamos agilizar ações estruturais em conjunto com as diversas entidades do governo federal para que essas questões sejam solucionadas da melhor maneira, sem prejudicar o agricultor. Afinal, a demanda por alimentação é grande e, por isso, creio que o governo não fará reduções no setor que traz mais resultados para o país.

Rural – Quais os setores que se mostram hoje mais promissores?

Abreu – A soja continua como desta que entre as culturas, com incremento na produção na ordem de 11,4%, chegando a uma produção de 95,9 milhões de toneladas. Apesar do atraso do início das chuvas, o que afetou o começo do plantio, a lavoura está apresentando bom desenvolvimento. Entretanto, as questões climáticas influenciaram de maneira negativa a produção do trigo, afetando a qualidade e produtividade do grão. Com isso, a produção estimada no início da safra caiu. Já a expectativa para o milho é de uma pequena queda, deixando a produção próxima da estabilidade. Entretanto, é natural que haja uma redução na produtividade do milho. Isso ocorreu devido ao aumento significativo na área plantada de soja, por conta do cenário mais vantajoso no mercado. A área desse grão avançou sobre as demais culturas, como milho e feijão de primeira safra.

Rural – A sua indicação ao cargo causou um certo desconforto em alguns setores e não agradou movimentos sociais como o MST e a Comissão Pastoral da Terra. Como pretende lidar com os grupos contrários a sua indicação?

Abreu – Estamos dispostos a abrir um diálogo construtivo com movimentos sociais como o MST e a reforma agrária. Aliás, este será o ministério do diálogo, mas nenhuma luta, nenhuma guerra que venha trazer conflitos e que possam puxar o país para trás terá a minha participação. Não vou aceitar nenhuma tipo de provocação. Minhas posições a respeito das principais questões ligadas ao agro são claras, objetivas e já conhecidas por todos.

Rural – Sobre suas posições, a senhora disse em uma entrevista a um jornal de São Paulo que “não existe latifúndio” no Brasil. A senhora acha que foi mal interpretada?

Abreu – Primeiramente, é bom deixar claro que o tema reforma agrária não é de minha responsabilidade. Para isso existe o Ministério do Desenvolvimento Agrário, que passou a ser comandado pelo ministro Patrus Ananias. Nós temos competências em cada ministério e eu pretendo respeitar essa competência. Porém, disse que no quadro atual do país a definição de latifúndio, como nos primórdios dos movimentos de reforma agrária, já não se enquadram mais e que o processo de reforma agrária não precisa ser feito em massa e deve ser dirigida apenas a quem tem vocação para trabalhar a terra. O governo deve dar não apenas a terra, mas garantir recursos para infraestrutura e a qualidade dos assentamentos. Há exemplos de projetos de assentamento muito bons e produtivos que podem servir de modelo. O que não pode é usar aquele discurso velho e fora da realidade para justificar invasão de terra. Se for assim, sou contra.

Rural – Se-tores ex-pressivos do agronegócio, como os grandes frigoríficos, também ficaram incomodados com algumas declarações da senhora. O que a senhora tem a dizer sobre isso?

Abreu – O que eu fiz foi condenar a concentração de mercado nas mãos dos grandes empreendedores. As empresas menores também têm direito de exportar seus produtos. O que precisamos fazer é dar oportunidade para que mais frigoríficos possam exportar, sem enfraquecer ou desmerecer nenhum deles. O que temos é um imenso mercado lá fora e as nossas empresas e as nossas indústrias precisam estar preparadas e totalmente liberadas para exportar para esse grande mercado consumidor, quer seja de carne em geral, quer sejam de outros produtos como café e leite. A nossa obrigação é viabilizar, abrir as portas e dar condições para que todas as empresas possam estar aptas para exportar.

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