Negócios

Dedo de prosa: Antonio Jorge Camardelli

Em setembro, Antonio Jorge Camardelli assumiu a presidência da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec). Entre suas propostas diante do cargo está de elevar o Brasil a retomar o mercado europeu e a exportação de carne processada para os Estados Unidos. Em entrevista concedida à repórter Fátima Costa, o atual presidente fala sobre os novos desafios da cadeia produtiva e os trabalhos que estão sendo realizados pela entidade.

Revista Rural – Qual o “peso” de assumir um cargo como esse, que representa uma cadeia produtiva com grande destaque no cenário internacional e com grande contribuição para o PIB do nosso País?

Antonio Jorge Camardelli – Fui diretor executivo da Abiec na gestão do ex-ministro Marcus Vinícius Pratini de Moraes (2003-2008). Foi um período em que a carne brasileira ganhou e conquistou os mercados com os quais trabalha hoje. É preciso ter presente a necessidade de vencer desafios, pois nossos agentes da cadeia produtiva da carne bovina são os grandes merecedores do reconhecimento de que o Brasil faz a diferença no mercado internacional. Como presidente da Abiec estarei sempre pronto a ajudar a alcançar patamares mais altos.

Rural – Ao assumir a presidência da Abiec, o Senhor ressaltou que um dos desafios do setor seria procurar alternativas para manter a competitividade em relação a outros países. De que forma é possível conseguir essa ação?

Camardelli – O Brasil possui todas as condições de produzir carne com qualidade, sanidade e preço competitivo. Hoje, estamos diante de uma situação adversa em que o preço da matéria-prima está muito alto. Ao longo dos últimos cinco anos, os frigoríficos puderam se consolidar no mercado, pois o preço da arroba do boi era muito competitivo. Agora é preciso fazer com que a indústria se adapte a uma nova realidade. Nosso desafio é fazer um trabalho para diminuir o custo da produção.

Rural – O senhor também apontou que uma das plataformas do seu mandato na entidade é buscar alternativas com a União Europeia para os cortes nobres bovinos produzidos no Brasil. Como pretende fazer isso?

Camardelli – A União Europeia foi, até fevereiro de 2008, um mercado importante para o Brasil, principalmente porque comprava cortes nobres em grande quantidade. Com a decisão de limitar o número de fazendas habilitadas, nossas exportações caíram para mais da metade. Nosso objetivo é fazer com que as autoridades europeias entendam que nos últimos dois anos a cadeia produtiva fez a “lição de casa” e, portanto, não há mais argumentos para limitar nossas exportações. Vamos seguir na luta para retomar o mercado europeu, que é muito importante. Para isso, contamos com a ajuda fundamental dos ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e das Relações Exteriores. Sabemos que a situação econômica da União Europeia está muito delicada, mas nós importamos muitos produtos daquele bloco e não impomos restrições. Comércio exterior é uma via de mão dupla. Se cada vez que um país ou a união de países tiver uma crise e adotar o protecionismo como alternativa para sair da crise, a economia mundial entra em colapso.

Rural – Hoje, é complicado para o Brasil cumprir as exigências do mercado internacional?

Camardelli – O Brasil cumpre as exigências do mercado internacional. Na verdade quando somos impedidos de vender em algum mercado, é preciso perguntar ao país que restringe nossa carne, porque ele não a compra. Se o Brasil vende para mais de 150 países, há mais de cinco anos e é o maior exportador do mundo, nossas credenciais são mais do que conhecidas. Não há registro na história do comércio mundial de carne de qualquer episódio em que a carne brasileira tenha causado mal aos rebanhos bovinos ou mesmo aos consumidores nos mercados onde é comercializada.

Rural – Na sua opinião as exigências e certificações, tais como a Globalgap, auxiliam o Brasil a derrubar as barreiras sanitárias?

Camardelli – É preciso ficar claro que boa parte das barreiras sanitárias nasceu em reuniões cujo objetivo era criar alguma forma de protecionismo. O Brasil já sofreu com barreiras tarifárias, mas como se mostrou competitivo, conquistou mercado mesmo com tarifas altas. Vieram as barreiras sanitárias. Governo, pecuaristas e indústria se uniram para criar mecanismo de controle sanitário. Estamos bem avançados nessa área. Não existe risco zero, mas o Brasil deu um salto enorme nas questões sanitárias. Agora, o novo nome do protecionismo é sustentabilidade ambiental. A cadeia produtiva da carne sabe dos seus problemas e tem feito o máximo para resolvê-los. Não somos o maior do mundo por acaso. Portanto, se qualquer país adotar medidas protecionistas contra nossa carne, não há certificadora que resolva. Agora, se jogarmos com regras claras, toda ajuda será bem vinda.

Rural – Quais são os mercados que o Brasil ainda pode explorar?

Camardelli – Apesar de vender para mais de 150 países, o Brasil ainda está fora de mercados importantes como Japão, Estados Unidos, Coreia do Sul e Taiwan. São grandes consumidores, os quais devemos estar sempre atentos e prontos a fechar um acordo sanitário.

Rural – Há pouco tempo, uma missão americana veio inspecionar a carne brasileira e por sinal eles aparentemente aprovaram. É possível em pouco tempo o Brasil começar a exportar para os americanos?

Camardelli – O relatório preliminar das auditorias do Serviço de Inspeção e Segurança Alimentar (FSIS), do Departamento de Agricultura Norte-americano (USDA), em frigoríficos de carne bovina apontou significativa melhora na avaliação das garantias da certificação de produtos brasileiros. O Mapa tem sido incansável na busca da retomada da exportação de carne processada para os Estados Unidos. Acredito que as vendas para aquele país sejam retomadas em breve.

Rural – O senhor chegou a pouco da Rússia. Esse país sinalizou uma certa confiança no Brasil. A Abiec acredita que já é possível melhorar as condições de entrada das carnes brasileiras no mercado russo?

Camardelli – A Rússia é nosso maior importador. É um excelente mercado. Quando entramos no mercado internacional é ingenuidade acreditar que o jogo vai ser fácil. A Rússia compra, em média, US$ 1 bilhão por ano de carne do Brasil. É natural que essas exigências sejam feitas. Cabe ao Brasil atendê-las e até julgar se o negócio continua lucrativo. Não conheço empresa que venda para ter prejuízo.

Rural – A expansão e a abertura de novos negócios internacionais das empresas como o Marfrig e Friboi ajudarão a melhorar a imagem do Brasil, no exterior? De que maneira?

Camardelli – São duas empresas com alto nível tecnológico e produtos de qualidade reconhecida. Portanto, a presença de empresas do porte dos dois frigoríficos ajuda a construir uma imagem positiva da carne brasileira.

Rural – Na sua visão a febre aftosa é um problema já resolvido?

Camardelli – Não há risco zero em epidemiologia. Mas o Brasil é reconhecidamente o país que tem o melhor trabalho de combate à febre aftosa. Num país continental com rebanho perto de 200 milhões de cabeças e cujo último foco foi há cinco anos, é realmente de se comemorar. O Japão, que é um país menor em extensão geográfica e com rebanho pequeno, se comparado ao Brasil, notificou foco de aftosa recentemente. É sempre bom lembrar que eles não compram nossa carne porque o Brasil não é livre de aftosa sem vacinação.

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