Sustentabilidade

Agroflorestal – consciência ecológica

Garantir a preservação dos recursos da natureza é hoje uma questão de importância crucial e que envolve autoridades das áreas política, científica e da sociedade civil ligadas ao terceiro setor. A exploração desenfreada, fato que se estendeu por varias décadas, causou tamanha destruição que a sociedade se viu obrigada a tomar alguma atitude que pelo menos começasse a reverter o problema.

O agronegócio, segmento que atua na base da cadeia produtiva, foi o primeiro a sentir os efeitos da falta de consciência do homem que aparece na forma de erosões, compactação do solo dentro das áreas de plantio, além dos inúmeros danos ambientais graves, que começaram a fazer parte do cotidiano das propriedades rurais brasileiras e a causar enormes prejuízos.

Por conta dessa realidade que afeta diretamente à cadeia agroindustrial, de uns anos para cá a consciência ecológica se tornou tema recorrente nas mesas de discussões dos especialistas, em varias partes do mundo.

O conceito de produção orgânica que prega o mínimo de intervenção do homem dentro das áreas de cultivo já é um indicativo de que as coisas começaram a mudar no campo e pegando carona nessa filosofia um grupo de produtores rurais da região do Vale do Ribeira, próximo ao litoral Sul do estado de São Paulo, já quase na divisa com o litoral do Paraná, estão dando um exemplo de consciência ambiental, aderindo a um sistema de manejo agroecológico para seus bananais.

O fruto que é tradicional em todo o vale durante século vem sendo explorado dentro de métodos convencionais, modelo que é condenado pelos ambientalistas, ainda mais numa área de Mata Atlântica, onde a necessidade de preservação é total e isso pode causar danos à flora e a fauna local que podem ser irreparáveis no futuro, afirma Edegar de Oliveira Rosa, Engenheiro agrônomo e responsável pela parte de orgânicos da Organização Internacional Agropecuária, (OIA), certificadora que atua em conjunto com outras empresas na certificação dos produtores do baixo e alto Vale do Ribeira. Ele diz que o conceito de agrofloresta é bastante acertado, sobretudo, para regiões onde a mata se mostra abundante e a necessidade de preservação fundamental. “A folhagem funciona como um excelente adubo orgânico natural, basta o produtor aprender a manejar corretamente”, enfatiza o técnico da certificadora.

Os produtores antigos da região e que praticam a agrofloresta contam que a falta de interesse dos outros produtores, está ligada a facilidade que a produção convencional oferece. Para o empresário Joacir Rossi, sócio na União Eco industrial Cajati, que recebe o nome de “Simplesmente Banana”, observa que quando o produtor deixa de usar um herbicida para dissecar o mato, o manejo se torna mais trabalhoso. “A roçada é feita apenas com o uso da enxada, facão ou até mesmos com as mãos”, lembra. E, não é só isso. Para começar a ter um retorno na sua produção, o agricultor tem de esperar um tempo maior. E, nesses casos, o imediatismo, que não é diferente das grandes cidades, acaba pesando na hora de escolher o modelo de produção a ser utilizado.

Agora para quem deseja optar por uma produção agrícola mais saudável, os entrevistados são unânimes: a gama de tecnologias disponíveis para uso no manejo desde o trato do solo, sem precisar usar fontes de adubação com alta solubilidade até o controle de pragas e doenças do banal é enorme.

Produtores seguem normas a risca

No Sítio Lavras o produtor rural Juvenal Pereira de Moraes, administra uma plantação de bananas, junto com outro sócio, o produtor Joaquim Clementino Neto, no sistema agroecológico. Lá o conceito de preservação da natureza é levado muito a sério, em alguns momentos quase como uma filosofia de vida. A propriedade, que recebe o nome da cidade, onde está localizada, possui uma área de 25 alqueires, aproximadamente e fica dentro do Parque Estadual do Jacupiranga, segunda maior reserva ambiental do estado de São Paulo, com uma área aproximada de 150 mil hectares de Mata Atlântica, totalmente preservada.

Filho de produtores de banana da região desde antes da área se tornar de preservada pelo Ministério do Meio Ambiente, Juvenal parece trazer no sangue o amor pela natureza e por cada palmo de terra da sua propriedade. O manejo do bananal, explica ele, é todo dentro das normas do sistema de produção orgânica – que tem na agrofloresta uma de suas vertentes – que foi regulamentada pela portaria nº 07 de 1999, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).

O manejo como numa lavoura comum começa com o manejo do solo. Para garantir o aporte de nitrogênio necessário o agricultor pode se valer de varias fontes, explica Joaquim que é o responsável em fazer o manejo diário de todo bananal. A adubação verde através de cobertura vegetal é o ponto forte da propriedade que mantém uma enorme variedade de espécies vegetais.

Na eventual falta de algum nutriente, outras fontes são utilizadas, porém nada pode fugir às normas do manejo biológico, conforme mostra o agrônomo da OIA. Ele mostra que nesses casos existem adubos naturais, como a torta de mamona e o esterco feito a partir de compostos orgânicos que dão excelentes resultados. O Fósforo (P), outro importante macro nutrientes é encontrado em rochas fosfóricas como o fosfato de Araxá, por exemplo. Já o Potássio (K) é um pouco mais complicado, ele explica, mas pode ser obtido nas cinzas de compostos vegetais como cana-de-açúcar ou lenha comum mesmo.

O produtor Joaquim bate o tempo todo na tecla da cobertura vegetal. Para ele quanto mais mato houver em volta do bananal melhor. Esse trabalho, no entanto, precisa ser consciente e é fundamental manter uma variedade de espécies vegetais numa mesma área de preferência espécies que possam ser exploradas comercialmente. Essa diversidade de plantas é que melhora as condições gerais do terreno, evitando a erosão. No sitio Lavras, o bananal fica quase todo numa área bastante acidentada perto de uma encosta, por isso lá ele optam por espécies de raiz mais cumprida. A relação de espécies plantadas no meio da lavoura é bastante ampla. São mini lavouras de mamona, palmito, laranja, tangerina, limão, cana-de-açúcar, castanha do Pará, além de plantas medicinais cultivadas e nativas da região.

Juvenal conta que a roçada completa do bananal é feita pelo menos uma vez por ano e isso é uma necessidade. As culturas ficam divididas por glebas para facilitar o acesso. Tudo é feito sem o auxílio de maquinários ou de produtos químicos, observa o produtor. A trabalheira é grande explica o lavrador Joaquim, mas todo esforço é recompensado pela satisfação de oferecer um produto limpo ao mercado e pelo preço diferenciado que eles recebem dos empresários locais, por cada cacho de banana colhido que, em alguns casos, pode chegar três vezes mais que o convencional.

Manejo do fruto garante qualidade

Além dos cuidados com o terreno a conservação dos frutos também requer alguns cuidados e esses começam logo na floração. Um primeiro paço é a colocação de um saco plástico em volta do cacho, manejo que segundo o lavrador é necessário para a padronização dos cachos, além de evitar o aparecimento de manchas escuras na casca da banana, provocadas por uma lesma que se alimenta dos frutos que ficam expostos ao tempo. A proteção serve também para evitar ataques de passarinho e morcegos que vivem na região.

O manejo de pragas e doenças, no sistema agroecológico, é outro fato que chama a atenção, pela criatividade do agricultor de aliar técnicas agrícolas com uma enorme dose de criatividade. O controle feito sobre uma praga conhecida como broca, e/ou moleque da bananeira, que pode causar sérios danos ao bananal se não tratada adequadamente é feito através da aplicação de um produto natural chamado pelos produtores de “Boveria”. Esse produto chamado comercialmente de Boveril WP age no controle biológico das fêmeas da espécie que, após colocarem seus ovos na base da bananeira, promovem o nascimento de inúmeras larvas. As larvas penetram na planta formando galerias, enfraquecendo-a e impossibilitando com isso a rebrota.

Segundo os próprios produtores a eficácia do produto é bastante grande. Só que para ampliar ainda mais o controle sobre a broca eles desenvolveram um método auxiliar que tem o poder de enganar suas presas. Como o agente causador da contaminação é, basicamente, as fêmeas adultas do inseto e que elas precisam voar até bananal para botar seus ovos eles pensaram que uma isca funcionária muito bem como armadilha, explica Juvenal. E foi exatamente isso que os produtores fizeram. Um pedaço do tronco da bananeira que é cortada após a retirada do cacho é posta sobre uma segunda parte e, no meio desse sanduíche é colocada uma quantidade do produto Boveril WP. Como os insetos que chegam dão logo um jeito de entra na primeira bananeira que avistam a contaminação e grande. O resultado está na ação que o produto tem sobre as fêmeas de inibir seu ciclo reprodutivo. Com isso as populações diminuíram bastante e hoje a broca não causa mais problemas, explica.

Agora, nos casos de grandes populações a aplicação no bananal deve acontecer três vezes ao mês, durante a fase critica da infestação e diminuir na medida que a população de insetos for se exaurindo até a proporção de três insetos por pé explica, o proprietário do Sitio Lavras. Outras pragas como, o Mal do Panamá, a Sigatoka Amarela e a Sigatoka Negra, são combatidas através da rotação anual de culturas e da própria floresta, que cria uma proteção natural. Em casos extremos de focos de Sigatoka eles aplicam um óleo agrícola adicionado ao biofertilizante, pratica que consta nas normas da certificadora, lembra o produtor.

Fonte de riqueza da região

Os primeiros registros mostram que a banana tem suas origens na Índia e sua chegada ao país se deu pelas mãos dos primeiros comerciantes árabes, ainda durante o período colonial. Hoje, o Brasil já detém a segunda maior produção mundial da fruta e a região Sudeste tem forte participação. Para as comunidades de ribeirinhos e “quilombolas”, que há séculos vivem do comércio da fruta, a banana é a principal fonte de riqueza. Hoje, o comércio se estende às margens da rodovia Regis Bitencourt, responsável pela ligação entre as regiões Sul e Sudeste do País. De acordo com o proprietário da empresa Simplesmente Banana, um ferrenho defensor da produção orgânica e da agroecologia, a produção de banana é a principal fonte de sustento dessas famílias e responsável por fazer girar grande parte da economia local.

Juvenal destina 50% da sua produção para venda direta in-natura e diz que muitas vezes a demanda supera a oferta. O produtor que chega a colher 110 pencas de banana por semana, mantém cinco tipos diferentes de banana, desde de a nanica, prata e maça que são as mais conhecidas até as variedades ouro e banana da terra, espécies mais exóticas.

Os produtores dizem que o apoio dos empresários da região está sendo determinante para o andamento do negócio. O motorista carreteiro Darci Guarda de Porto Alegre, RS, diz que toda vez que passa pela BR-116, mesmo quando está com a carga atrasada, dá uma paradinha para comprar um cacho de banana. Quando perguntado sobre a qualidade da fruta, o motorista responde quase que sem pestanejar: “É muito boa!”. Muitos motoristas param e levam em grandes quantidades, dos mais diferentes tipos. Para Juvenal, a liberação da certificação e do selo de produto orgânico, vai melhorar bastante o comércio nos bolsões, além de trazer um retorno maior aos empresários que hoje investem na idéia.

Indústria aposta na banana agroecológica

O conceito de produção orgânica que ganha adeptos em todo o país tem agroecologia uma vertente de grande importância e que começa também a se tornar interessante para empresários que vislumbra um futuro lucrativo para esse tipo de fruta no mercado interno e de exportação. A União Eco Industrial Cajati, SP, que recebe o nome do município onde está localizada, mantém sua produção de doces de banana, toda ela mantida pela banana agroecológica produzida pelos agricultores do Vale do Ribeira.

De acordo com Joacir Rossi, sócio proprietário na empresa, o próprio nome ‘Simplesmente Banana’ dá uma idéia da filosofia de rege o negócio. O projeto teve início, em 2001, e hoje mantém sua linha de produção dentro dos rígidos padrões exigidos pelas certificadoras. As normas abrangem a sanidade, a preservação ambiental, mas, principalmente o consumidor final, enfatiza o proprietário.

A banana assim que chega até a fábrica segue para uma estufa onde é conservada em temperatura apropriada aguardando o momento de ser processada. Antes de ser cozida em dois tachos enorme a fruta passa por uma dupla lavagem. Após realizado o cozimento, o doce descansa por um período antes de seguir para o corte. Tudo é feito com o mínimo contato, justamente para minimizar os riscos, lembra Fabiane Jesus de Almeida, assistente administrativa da empresa. A preocupação com a assepsia envolve também os funcionários que trabalham com roupas especiais e equipamento de proteção individual.

A Simplesmente Banana possui uma linha de doce em tabletes de 100 gramas, pacotes de balas de 50 e 100 gramas, além dos doces comercializados à granel. A empresa já conta com clientes no estado de São Paulo e no Paraná, incluindo, grandes redes de supermercados e casas especializadas. Ao todo, são mais de 50 pontos de comércio, número que se depender do entusiasmo dos produtores e da vontade do seu proprietário para realizar negócios deve se ampliar certamente.

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