Pecuária

Erradicar a aftosa, um sonho possível!

Outras doenças como, o mau da vaca louca, por exemplo, este sim um problema de saúde pública, não recebe a mesma atenção das autoridades internacionais, talvez por esbarrar em questões diplomáticas ou de comércio exterior. O fato é que o Brasil possui, atualmente, um programa de erradicação da Febre Aftosa que é referência para países em todo o mundo.

Segundo dados do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento, MAPA, existem hoje 15 regiões com certificado de erradicação da doença, oferecido pela (OIE), Organização Mundial de Saúde Animal, entidade integrada por 154 países.

Dono do maior rebanho comercial do mundo, com exportações que chegaram a US$ 1,8 bilhão até setembro e que podem fechar o ano com um volume negociado de US$ 2,5 bilhão, o Brasil detém, hoje, cerca de 13% do mercado mundial de carne bovina, negociando com mais de 100 países de todos os continentes. No entanto, o extraordinário crescimento das vendas nacionais do setor, nos últimos anos, resultado de uma conjugação de fatores e esforços de toda a cadeia produtiva, correm um sério risco de escorrer para o ralo por problemas de má administração e gerenciamento das ações internas. Todos os esforços do governo federal e do setor privado no sentido de melhorar a sanidade rebanho bovino brasileiro, criando formas de prevenção e controle das principais doenças bovinas como, a aftosa, brucelose, tuberculose e raiva, dependem sobretudo de uma participação mais ativa dos pecuaristas.

Jamil Gomes de Oliveira, técnico do MAPA, fala que o PNEFA, Programa Nacional de Erradicação da Febre Aftosa, está estruturado de forma a compartilhar essas ações entre os setores públicos e privados. Segundo ele, o controle das doenças virais, caso da aftosa, no Brasil, depende de uma fiscalização em diferentes níveis. ” A atuação descentralizada por meio das Secretarias de Defesa Agropecuária em cada estado e dos órgãos de extensão rural; além de uma participação das empresas fornecedoras de insumos e dos próprios pecuaristas, são pontos fundamentais para garantir um controle sistemático sobre o problema”, diz. De acordo com o técnico do Ministério, nos últimos dez anos, o Brasil deixou uma situação onde, a preocupação era apenas o controle dos focos para, praticamente, erradicar a doenças em três das principais regiões onde se desenvolve pecuária no país.”

Dados do MAPA mostram que no ano de 1992, o Brasil tinha, registrados, 1232 focos da doença em diferentes regiões. Com a implantação do programa de erradicação, em pouco mais de três anos, esse número caiu para menos da metade, 589 focos. De lá para cá, por conta de uma série de exigências dos países compradores da carne brasileira, o controle ficou bem mais rígido, culminando no ano de 2002, com um feito para o país, ao não registrar nenhum caso de febre aftosa em todas as regiões. Apesar das inúmeras especulações, essa condição se manteve até este ano, quando ocorreram casos da doença no município de Monte Alegre, PA e na região do baixo Amazonas, no estado de Roraima.

Atualmente, o controle é realizado através de um zoneamento das áreas que oferecem risco de focos da doença em três níveis (áreas não livres da aftosa). A área de nível 1 (Baixo Risco) compreende os estados do MA, PA, baixo do rio amazonas AC; A região considerada de risco intermediário, reúne os estados de AL, PE, PB, RN, CE, PI, PA ; Já as áreas consideradas de alto risco para ocorrência de focos estão localizadas nos estados do PA, próximo a Ilha do Marajó e AP, AM, RR .

Segundo dados da ADEPARÁ, Agência de Defesa Sanitária do Estado do Pará, os 30 municípios que estão sob sua jurisdição, encontram-se na zona 1 (baixo risco) com 92% de cobertura vacinal, correspondendo a um rebanho de 9 milhões de cabeças. Ainda segundo dados da entidade, os municípios do Nordeste e Sudoeste não apresentam foco desde 2002 e o rebanho tem 88% de cobertura. No Marajó (zona 3), onde predominam os criatórios extensivos e um ecossistema diferenciado com campos naturais e muitas áreas de várzea, a vacinação atinge 82% do rebanho de bovinos e bubalinos.

Em declaração recente o Ministro da Agricultura Pecuária e Abastecimento Roberto Rodrigues disse que o Brasil está em guerra contra a febre aftosa. O comentário foi feito durante apresentação do projeto piloto de mobilização social “Brasil Livre de Febre Aftosa” que o Mapa, juntamente com a Adepará lançam no dia 26 de novembro em Santarém. A campanha será realizada em 13 municípios das regiões do Baixo e Médio Amazonas (considerada de alto risco) e, numa segunda etapa, nos demais estados da Amazônia.

O Ministro concedeu, em dezembro do ano passado, o status de zona livre, com vacinação, ao Circuito Pecuário Centro-Oeste, formado pelo Distrito Federal, Goiás, Paraná, São Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso. A região tem um rebanho bovino de 70 milhões de animais, que somado aos dos estados de SC e RS (15 milhões) elevam o potencial exportador do Brasil para 85 milhões de cabeças. Para proteger sanitariamente a zona livre, a portaria também definiu a criação de zona tampão, (espécie de cinturão de proteção da área livre) incluindo o Estado do Mato Grosso do Sul e partes de São Paulo, Goiás e Mato Grosso.

João Gilberto Bento representante do FUNDEPEC, Fundo de Desenvolvimento da Pecuária da Pecuária do Estado de São Paulo, fala que o controle realizado pela Secretária da Agricultura do estado em parceria com a FAESP, Federação da Agricultura do Estado de São Paulo, garantiu ao circuito Sudeste índices vacinais superiores a 90%. Uma das medidas adotadas foi a criação de um cadastro de criadores como forma de garantir uma fiscalização mais efetiva. Outra medida foi o estabelecimento de prazos para a entrega das notas fiscais de compra das vacinas, para aí sim autorizar a emissão das Guias de Transporte Animal (GTA). Essas entre outras medidas, proporcionaram ao estado uma condição de área sem nenhum foco desde 1996.

Segundo Bento, outra medida que está sendo estudada é a criação de um fundo de investimento, de caráter indenizatório, para os criadores que sofrerem mortalidade no rebanho. “A vigilância passiva é tão importante quanto as medidas epidemiológicas, realizada nas fazendas de isolamento da área onde foi detectado um foco num raio de 25 quilômetros, por exemplo e o sacrifício de animais infectados”, conclui.

De acordo com o representante do FUNDEPEC, a condição atual da zonificação para erradicação da doença, mostra que as zonas livres com vacinação estão colocadas no circuito Sul, Leste, Sudeste e Centro Oeste. A exceção é o estado de Santa Catarina que possui o título de zona livre da aftosa, sem vacinação (Reconhecimento Nacional ). Segundo ele, para uma região conquistar esse status sanitário, ela precisa ficar no mínimo 2 anos sem registrar nenhum foco. ” O circuito Sudeste atinge índices anuais de vacinação, acima dos 85% recomendados pela OIE, observa. Isso aliado ao alto nível de consciência dos criadores já garante a região condições de ser considerada zona livre sem vacinação (Reconhecimento Nacional)”, enfatiza.

Problema se agrava na América Latina

No cenário mundial, atualmente, são consideradas áreas livres de febre aftosa, a América Central e do Norte, a Europa Ocidental, Japão, Nova Zelândia, Austrália, Argentina, Uruguai e Chile. Na América do Sul, especificamente, a situação é mais grave sobretudo em alguns países vizinhos ao Brasil. As regiões consideradas críticas estão divididas em três categorias. As de nível 1 (baixo), congregam: Suriname, Colômbia na fronteira com o Brasil, envolvendo parte do litoral deste país; A Argentina mais ao norte, Bolívia, em Santa Cruz e Peru, também se enquadram nessa classificação. As de Nível 2 (intermediário) reúnem Colômbia, próximo à fronteira com o Equador e o Centro do país; A região conhecida por “Chaco”, Bolívia, Argentina e Paraguai e parte litorânea do Peru e Paraguai, próximos a fronteira com o Brasil pelo estado do Mato Grosso do Sul.

Já as regiões consideradas pelo GIEFA, Grupo Interamericano para Erradicação da Aftosa nas Américas de alto risco de insidência de focos ( nível 3) compreendem, a Venezuela, parte do Equador e da Bolívia (região BENI, PANDO E ALTIPLANO). Segundo Sebastião da Costa Guedes consultor do Sindan, Sindicato Nacional das Indústrias de Produtos para Saúde Animal e membro do GIEFA, o perfil dos pecuaristas dessas áreas é de núcleo familiar (subsistência ).

De acordo com o consultor do SINDAN, um relatório que já está concluído, deverá ser entregue em Washington, em dezembro próximo, traçando um o plano para erradicação da aftosa nas Américas. Segundo ele, o texto será entregue à diretoria da Organização Panamericana de Saúde, Mirta Roses Periagro, e prevê a erradicação da febre aftosa em cinco anos, a partir de 2005. Para erradicar, até 2010, a aftosa de áreas consideradas carentes e sem recursos, como o Norte e Nordeste do Brasil, além do Chaco Boliviano, e Equador, entre outras regiões sensíveis no continente sul-americano, Guedes informa que seriam necessários US$ 45 milhões. Segundo ele, esses recursos viriam de um fundo internacional, alimentado até por países que têm o maior interesse em erradicar a aftosa das Américas, como Estados Unidos, Canadá e México, declara. Guedes conta que, os fatores que levaram o Brasil a, praticamente, erradicar a doença no seu território foram três.

Além do trabalho efetivo do Ministério da Agricultura, em parceria com a CNA, ABIEC, SINDAN e as entidades regionais ligadas a cadeia pecuária de realizar campanhas de vacinação em massa contra Febre Aftosa no rebanho, o trabalho de conscientização dos pecuaristas para a importância do controle da doença por essa via. A qualidade da vacina brasileira foi outro ponto considerado de importância vital, segundo ele. “O Brasil possui tecnologia para produzir uma vacina de excelente qualidade, igual a de qualquer país no mundo”, observa.

A indústria veterinária brasileira comercializou mais de 300 milhões de doses de vacinas contra febre aftosa até o final de outubro, mês que antecede o início da segunda fase da Campanha Oficial de Vacinação, que acontece de 01 a 30 de novembro em 15 estados brasileiros. Os dados são da Central de Selagem de Vacinas (Vinhedo/SP), órgão constituído por meio de parceria entre o Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Saúde Animal (Sindan) e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). Os números apontam para novo recorde de vacinação contra febre aftosa em 2004, com a comercialização de cerca de 340 milhões em todo o ano. Além disso, a indústria veterinária mantém sempre o estoque de vacinas em níveis adequados às perspectivas da demanda futura e à margem de segurança solicitada pelo MAPA.

O pico da campanha de vacinação no segundo semestre acontece agora em novembro nos seguintes estados: Acre, Amapá, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, parte Centro-Oeste de Minas Gerais, Pará, Paraná, Piauí, Rondônia, São Paulo, Sergipe e Tocantins, além do Distrito Federal. Dentre eles, Goiás (40 milhões/doses), Minas Gerais (33 milhões/doses), Mato Grosso (33 milhões/doses), Mato Grosso do Sul (31 milhões/doses) e São Paulo (27 milhões/doses) são os estados que mais adquiriram vacinas contra febre aftosa durante o ano. A estratégia do ministério é realizar duas vacinações anuais no rebanho, sendo que a primeira dose já foi aplicada no primeiro semestre.

Perigo pequeno para humanos

A Febre Aftosa é considerada uma zoonose. O homem raramente se infecte e adoece, sendo ele um hospedeiro acidental. Fato comprovado pelo reduzido número de casos humanos descritos no mundo, mesmo perante as freqüentes oportunidades de exposição ao agente, a ampla distribuição geográfica, e a alta incidência da enfermidade nos animais domésticos. A transmissão ocorre por contato com animais enfermos ou material infeccioso, através de lesões mínimas, por exemplo, arranhões e erosões da pele, pelos quais o vírus penetra no organismo ou pela ingestão de leite não pasteurizado. A contaminação humana devido à ingestão de carnes e produtos cárneos não foi comprovada. A transmissão entre seres humanos também não foi relatada.

A infecção no homem pode ocasionar uma enfermidade clinicamente aparente ou pode ser assintomática, diagnosticada apenas por provas sorológicas. Acredita-se que para produzir a infecção em humanos, deva haver exposição massiva ou causas predisponentes que alterem a suscetibilidade do indivíduo. É de caráter benigno e o período de incubação varia de 2 a 8 dias, sendo a evolução da doença similar à dos animais.

Na fase inicial observa-se febre, dor de cabeça e anorexia. A vesícula primária aparece no local de penetração do vírus e logo se generaliza, com formação de aftas secundárias na boca, mãos, e pés. Quando não há contaminação bacteriana secundária, o paciente se restabelece em cerca de duas semanas. Clinicamente a aftosa pode ser confundida com outras enfermidades vesiculares, por este motivo, invalida qualquer diagnóstico realizado apenas com base clínica, sem a confirmação laboratorial. Até hoje apenas 40 casos da doença foram documentados com isolamento e identificação ou pela comprovação de anticorpos no sangue de pessoas recuperadas. E a maior parte desses casos foram registrados na Europa, onde as fontes mais freqüentes de infecção decorreram de acidentes de laboratório e infecção em ordenhadores, que foram expostos por contato direto, através de feridas cutâneas da mão durante a prática da ordenha de animais infectados. Há poucos registros de enfermidade por ingestão de leite cru, infecção adquirida em matadouros, e por manejo de animais doentes durante a colheita de material infeccioso.

A prevenção da enfermidade no homem, consiste, sobretudo no controle da enfermidade nos animais domésticos. Para prevenção individual, recomenda-se proteger as feridas ou abrasões das pessoas em contato com animais enfermos ou com materiais contaminados com o vírus e pasteurizar ou ferver o leite.

As pessoas podem ter um papel muito importante na transmissão mecânica do vírus aos animais, pelas vestimentas, calçados e mãos contaminadas, uma vez que o vírus pode sobreviver durante vários dias no meio ambiente.

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