Agricultura

O mundo das “super-sementes”

As grandes companhias perceberam a possibilidade de criar valor através de lavouras e animais geneticamente modificados, com a utilização de um instrumento de última geração – a biotecnologia. O controle dessa técnica, atualmente, ocorre via patentes, incorporação e aliança estratégica entre os grupos, alterando estrutura de mercado, padrões de gerenciamento e de competitividade.

Experts na temática agrícola aposta numa total e radical metamorfose do setor de insumos, sobretudo o de sementes, que, a rigor, já vem se processando desde meados da década passada. Dois deles são Geni Satiko Sato, pesquisadora do IEA-Instituto de Economia Agrícola, e Roberto Giro Moon, professor da Universidade Mackenzie, que apontam entre os participantes de uma corrida, se não pela hegemonia, por uma posição de destaque, corporações de porte, como a Monsanto, Syngenta, Du Pont (Pioneer), Dow Chemical, Aventis e AstraZeneca. Em Pindorama, correndo por fora, mas não menos importante, a Embrapa-Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, e o IAC-Instituto Agronômico de Campinas (SP), dois dos principais centros de pesquisas agronômica básicas no Brasil.

A disputa acontece em âmbito mundial e é acirrada, pois o setor semente movimenta a cifra nada desprezível de US$ 24,4 bilhões, e inclui o mercado brasileiro que comparece com 4,9% do bolo, ou seja, US$ 1,2 bilhão/ano. Portanto, a agricultura é essencial, não apenas por ser comprador do insumo básico para o plantio, no caso a semente, mas, também, por se tratar do elo inicial da cadeia produtiva de alimentos que termina na gôndola dos supermercados.

Sato e Moon observam que as empresas, hoje atuando na área biotecnológica, têm origem nos setores farmacêutico e químico, portanto, com algum conhecimento acumulado sobre a produção de sementes. Esses grupos expandiram rapidamente seu capital intelectual, via aquisição ou fusão com outros já consolidados, localizados em várias partes do planeta.

As vantagens econômicas obtidas com as incorporações são o aumento da eficiência, pela redução de custos e, ainda, pelo incremento da competitividade e participação no mercado. O esquema permite a montagem de oligopólios, possibilitando lucros adicionais através de preços ou “conluio”. Em outras palavras, não há qualquer impedimento para a formação de cartéis, acertos sobre prática de preços e operações de vendas casadas (adubos, defensivos e sementes).

Sementeiras nacionais perdem espaço

É bom lembrar que a biotecnologia permite a introdução de fragmentos de DNA de uma determinada planta no genoma receptor de um outro vegetal que, com isso, terá uma nova característica, dando origem ao produto ou alimento transgênico. Essas companhias realizam pesquisa com grãos de alto índice de demanda no comércio internacional, dando preferência, atualmente, à soja, ao milho e ao algodão.

Ainda de acordo com Sato e Moon, a semente é o principal insumo e agente agrícola de transformação biotecnológica. Por isso é alvo das multinacionais que “buscam o controle deste setor”. A Lei de Proteção aos Cultivadores, de 1997, favoreceu o ingresso de transnacionais no Brasil, ao garantir a propriedade intelectual sobre os cultivares, autorizando a cobrança de royalties, sem colocar quaisquer obstáculos a uma concentração maior da produção. Com isso, as empresas brasileiras perderam espaços ou foram adquiridas pelas estrangeiras, apesar de a transgenia, no Brasil, ainda não estar regulamentada e haver um clima de “cerca lourenço” em torno do assunto.

Entre 1996 e 1999 ocorreram várias aquisições de empresas produtoras de sementes no Brasil. Com uma atuação mais agressiva, a Monsanto comprou a FT Pesquisa e Sementes de Soja, a Agroceres, uma unidade da Cargill, e a Braskalb. A AgrEvo, uma joint venture entre a Hoechst e a Schering, comprou a Granja 4 Irmãos, do grupo Josapar, Sementes Ribeiral, Mitla Pesquisa Agrícola e Sementes Fartura. A Dow AgroSciences (ramo de semente da Dow Chemical), incorporou a Dinamilho, Híbridos Colorado, a FT Sementes de Milho e Sementes Hatã. Por fim, a Du Pont, depois de adquirir a Pioneer, absorveu a Agropecuária Dois Marcos (soja).

Embrapa, IAC, a parceria com remanescentes.

Também entre as gigantes da biotecnologia e atuando no Brasil, estão a Novartis, que surgiu em 96, com a junção entre a Ciba Geigy e a Sandoz, operando nos setores de agrotóxicos e farmacêutico. A Aventis, resultado da união entre a Hoechst e Rhonê-Poulenc, em 99, sendo adquirida, em 2002, pela Bayer CropScience. A AstraZeneca, surge em 99, com a fusão entre a sueca Astra, do setor farmacêutico, e a Zeneca, britânica da área de biociências. As Empresas La Moderna, mexicana e líder no mercado de sementes de frutas, além da Syngenta, maior empresa de agrotóxicos do munido, formada em 2000, com a união entre a Novartis Agrobusiness e a Zeneca Agrochemical.

Em linhas gerais, esses conglomerados são os grandes players da biotecnologia que apostam no Brasil como mercado para sementes transgênicas. Num primeiro momento, para algodão, arroz, milho e soja. Numa etapa posterior, demais produtos. Incorporando ou se associando, essas empresas têm, como uma das principais estratégias, a compra de firmas nacionais com estrutura de distribuição montada e em pleno funcionamento.

Uma das poucas companhias genuinamente brasileiras que escapou do assédio das transnacionais, foi a Unimilho-União dos Produtores de Sementes de Milho da Pesquisa Nacional, que reúne 17 empresas de híbridos em sociedade tecnológica com a Embrapa. Além dessa, tem a Maeda, que a atua no setor de algodão, associada à Delta & Pineland, com foco no centro-oeste. Na área pública, além da Embrapa, que tem parceria com várias empresas nacionais remanescentes, inclusive multinacionais, têm o IAC-Instituto Agronômico de Campinas e o Iapar-Instituto Agronômico do Paraná, onde também opera a Coodetec-Cooperativa Central de Agropecuária, Desenvolvimento Tecnológico e Econômico, e a Fundação Mato Grosso.

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