Agricultura

Rastreabilidade também para a agricultura

O setor em maior evidência é pecuária de corte, inclusive pelo fato de frigoríficos e pecuaristas protagonizarem uma contenda relacionada sobre quem vai pagar a conta.

Porém, pouco se fala a respeito da Lei de Segurança da Saúde Pública e Prevenção e Resposta contra Bioterrorismo, assinada pelo presidente George W. Bush, em junho de 2002, também conhecida como Bioterrorismo Act. A lei deve entrar em vigor a partir do final deste ano e é vista, por alguns analistas, como um instrumento que apesar de necessário, peca pelo exagero de consolidar a paranoia do governo norte americano, pois pretende ser uma medida de prevenção a possíveis ataques terroristas.

Com essa legislação, os Estados Unidos criam um elenco de regras que lhes dão o direito de rastrear a origem e qualidade de vários produtos importados, sobretudo alimentos e medicamentos. A união Européia também planeja pôr em prática sistema idêntico e isso pode ocasionar alguns entraves ás exportações brasileiras, já que ambos os mercados são tradicionais consumidores de produtos do Brasil.

No caso da agropecuária, a rastreabilidade pode ser definida como o mecanismo que permite identificar a origem do produto desde o campo até o consumidor final. Em outras palavras, o sistema implica um conjunto de medidas que possibilita controlar e monitorar, sistematicamente, a qualidade do produto final. Quanto maior o número e a frequência das informações e formas de comprovação, melhor.

A definição é do Agrônomo Richard Dulley, do IEA – Instituto de Economia Agrícola, e da também agrônoma, Alessandra Toledo, coordenadora de certificação da AAO Associação de Agricultura Orgânica. Assim, com base nesse conceito, fica evidente que a rastreabilidade pode ser vinculada a qualquer tipo de certificação, inclusive ser aplicada pelas diversas cadeias produtivas. È obvio, observam que deverá haver a adoção de critérios específicos.

Falta análise sobre as implicações

Dulley e Toledo que há muita discussão sobre o assunto. No entanto, “não há uma análise profunda sobre suas implicações econômicas, culturais e até mesmo jurídicas”. O governo defendendo o uso do sistema “sem, entretanto, se referir ou ter uma clara noção do que realmente seja. Não aborda aspectos relacionados à estrutura de trabalho, custos e a própria complexidade do processo de implantação”.

Assinalam, também, que as ONGs (Organizações não Governamentais) e empresas que atuam no setor orgânico, inclusive órgãos de certificação, “possuem significativo acúmulo de conhecimento e experiência, como consequência das normas e exigências a serem cumpridas nesse tipo de agricultura”.

Um exame em perspectiva da implantação do sistema de rastreabilidade para produtos convencionais, através da prática da AAO Certificadora, permite concluir que será complicada a obtenção da viabilização econômica e social, considerando as formas de operacionalização “e os principais problemas e conflitos que podem surgir entre os diferentes componentes dos modelos agroalimentares tradicionais”. Um dos complicadores, acrescentam, é a existência de um indicador de adequação, denominado “não-conformidade”.

Esse índice refere-se a qualquer tipo de ação do agricultor/pecuarista, processador, distribuidor, que possa comprometer a qualidade e a sanidade do produtor final, além da adaptação ao processo. Essa indicação deve ser considerada maior ou menor, dependendo do grau de comprometimento da qualidade. Essa classificação vai viabilizar determinar um período suficiente para corrigir as distorções, “sendo imprescindível que toda a cadeia cumpra as normas estabelecidas”.

Debates deve definir os objetivos

Na área de convencionais, a exemplo dos orgânicos, esse tempo será chamado de “transição” e compreende o início do processo até quando as modificações forem devidamente atendidas. Ou seja, essa ocasião é a aquela necessária para que a cadeia corrija eventuais “não-conformidades”, incluídas num “Plano Manejo” que prevê, obrigatoriamente, todas as medidas e procedimentos exigidos para a implementação do processo.

Dulley e Toledo sugerem que haja um debate para definir prazos de carência, critérios, justificativas técnicas, também qual o objetivo do rastreamento , qual o rigor a ser adotado, as punições, de que forma serão aplicados e por qual autoridade. Pra garantir a eficiência, elencam uma série de quesitos que devem ser observados e analisados pela entidade responsável pela checagem do sistema: normas e referências da qualidade alvo; procedimentos permitidos, proibidos, tolerados, obrigatórios; relação dos insumos permitidos e proibidos; períodos de carência ou de transição; exigência de que os produtores disponham de comprovantes de compras, vendas enfim, tudo que favoreça a comprovação pelos inspetores, da correta operação; e realização de visitas periódicas e “surpresa” ao estabelecimento.

Sempre tomando como parâmetro e regulamento da AAO, Dulley e Toledo afirmam que o processo terá início a partir de uma solicitação do produtor encaminhada ao órgão ou entidade responsável pela certificação. É feita, então, uma visita ao local onde são levantadas informações diversas, relacionadas à proteção da área, recursos hídricos, destinos de resíduos sólidos e esgotos, aspectos sociais, condições dos depósitos de insumos, ferramentas agrícolas, condições gerais da produção, inclusive de mudas, manejo de invasoras, pragas e doenças, nutrição vegetal, uso de sementes, integração vegetal/animal, controle da produção, armazenamento, processamento do produto e comercialização.

Isso feito, é elaborado um relatório que será enviado ao órgão certificador e ao proprietário do local vistoriado, que poderá ou não contestar o conteúdo, em parte ou totalmente. Na entidade emissora da certificação, o documento será analisado e dado um parecer definindo se o local pode ser considerado certificado ou em conversão. Em ambos os casos haverá monitoramento obrigatório por meio de visitas periódicas para melhor acompanhar e instruir a implantação do sistema.

Sistema pode gerar alguma dificuldade

De acordo com os agrônomos, a montagem desse modelo implica custos que, no caso da agricultura orgânica, são bancados pelos produtores, processadores ou distribuidores interessados. Na convencional, certamente, não será o Estado a arcar com as despesas. Supõem, mais adiante, que operacionalização do rastreamento deverão ocorrer algumas dificuldades, principalmente dos agricultores, em registrar e fornecer dados sobre, por exemplo, produção e produtividade, fundamentais para a eficiência do processo.

Segundo eles, a rastreabilidade exige, por princípio, que o produtor tenha ou se esforce para ter um mínimo de contabilidade, com registro de entradas e saídas, destinos e procedências, entre outros. Para o setor tradicional, acrescentam, isso deverá ser uma tarefas imensa, pois, apesar das intenções, o Estado ainda não conseguiu implantar um método de contabilidade que seja absorvido com facilidade pelos produtores.

O problema maior, para eles, não está relacionado a uma ampla utilização do rastreamento pela agricultura convencional, mas ás prováveis dificuldades que surgirão no processo operacional de auditagem das normas e regulamentos. Esse obstáculo deverá surgir em função de fatores educativos que, necessariamente, terão de ser assimilado pelos agricultores, no contexto do sistema a que se submeterem. O fazendeiro terá de se adaptar a uma ação contínua de mudança de hábitos arraigados, em suma, reeducação.

Tnato Dulley quanto Toledo, defende um planejamento cuidadoso para os alicerces de uma estrutura operacional que possa atender o universo de milhões de produtores convencionais, além de distribuidores e processadores, enfim, todos os agentes envolvidos nas mais diversas cadeias, sem que haja prejuízo para a qualidade, não só dos serviços, mas, principalmente, aos consumidores. Ressaltam, ainda, que as punições, quando aplicadas, devem ser rigorosas, até para reforçar a imagem de credibilidade do sistema.

Os agrônomos vêem o rastreamento como um conclusivo e comprovadamente processo complexo depende, fundamentalmente, do sucesso na obtenção de mudanças no comportamento dos operadores e, também dos consumidores. Não é apenas mais um eficiente insumo moderno, de última geração, da tecniciência aplicada á agricultura, que se paga caro, mas compra-se no mercado. A prática implica educação e conscientização de todos os envolvidos nas cadeias produtivas que devem assimilar, rapidamente, as vantagens que terão uma vez seguidas as normas estabelecidas e, acima de tudo, pautem as atividades produtivas e comerciais em sólidos princípios éticos, finalizam.

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