A
constatação é da engenharia agrônoma
e pesquisadora cientifica do IEA Instituto de Economia
Agrícola, de São Paulo, Marina Brasil Rocha.
Para ela, a baixa eficiência da política de garantia
de preços mínimos tem uma de suas raízes
na crise da dívida externa, que provocou modificações
nas políticas macro-econômicas e, em conseqüência,
as políticas setoriais foram obrigadas a se ajustar
na nova realidade.
Outro aspecto apontado é que na primeira metade dos
anos 90, as restrições orçamentárias
decorrentes da crise fiscal do Estado levaram a uma redução
substancial no montante de crédito destinado à
agricultura.
Pesar disso acrescenta, a PGPM seguiu sendo usada como um
importante instrumento de estabilização
da renda dos agricultores, muito embora sua operacionalização
encontre barreiras de difícil transposição,
dada a absoluta falta de sintonia entre a universalidade de
aplicação da garantia de preços e a restrita
alocação orçamentária para sua
execução. Além disso, ocorre uma irregularidade
na condução dessa política que ora incentiva
e ora desestimula os produtores que, assim, têm mais
dificuldades em realizar um planejamento de mais longo prazo
para a atividade.
Ainda, segundo a pesquisadora, a escassez de recursos oficiais
para financiar a produção induziu os agricultores
a buscarem novas formas de financiamento, acarretando uma
elevação acentuada nas taxas de juros sobre
os empréstimos e quase que impossibilitando a quitação
do débito, já que os preços agrícolas,
de modo geral, não evoluíram na mesma proporção
(despesas operacionais mais encargos financeiros). Ao
que diz, essa defasagem gerou uma crise de endividamento
no setor, notadamente a partir da safra 94/95, confirmando
o esgotamento do papel intervencionista do Estado nos moldes
até então estabelecidos.
Marina Rocha confirma que o processo de desenvolvimento do
Brasil implicou na redução gradativa da participação
da agricultura no PIB Produto Interno Bruto. Mas, garante
que, apesar disso, o setor ainda é importante como
fonte empregadora, absorvendo cerca de 25% da força
de trabalho e como gerador de divisas, contribuindo com aproximadamente
40% de exportações totais do país,
levando em conta produtos manufaturados e semimanufaturados.
Uma análise dos últimos dez anos, acrescenta,
mostra a interrupção no crescimento do produto
agrícola e, mais especificamente, na produção
vegetal no ano de 1990. Enquanto o produto agrícola
total teve uma retração de 4,5%, no período
de 89/90, o produto vegetal diminuiu 10%. Porém, os
dois se mantiveram estagnados no ano seguinte. Esse fraco
desempenho no biênio 90/91, frisa, foi conseqüência
da queda no nível de investimentos, em 1989 e 1990,
além de condições climáticas desfavoráveis
que, nos anos 89/90 e 90/91, atingiram as principais regiões
produtoras de forma alternada.
Marina Rocha lembra que a produção vegetal registrou
uma recuperação em 92 (6% aproximadamente),
mas somente em 94 é que a produção agrícola
total conseguiu superar o nível atingido em 89, devido
às condições favoráveis do clima,
principalmente no Nordeste e, ainda com a retomada do nível
de investimento, em virtude da reativação de
políticas setoriais, como maior oferta de crédito
rural e recuperação dos preços dos produtos
agrícolas.
Ainda conforme a pesquisadora, um exame da evolução
das principais culturas, na primeira metade dos anos 90, mostra
uma perda do dinamismo em termos de área, produção
e rendimento médio (produtividade). Das 13 culturas
selecionadas (algodão, amendoim, arroz, cacau, café,
cana, feijão, laranja, mandioca, mamona, milho, soja
e trigo), oito mostra redução nas taxas de crescimento
anual de área, sendo mais expressivo a mamona (23,6%),
trigo (18,1%), algodão (8,9%) e café (8,2%).
Esses mesmos produtos também apresentam queda significativa
na produção e no rendimento, com exceção
do algodão que mostra aumento de 4,6% no rendimento
anual, a exemplo da soja e laranja.
A técnica ressalta que o crescimento da produção
de milho e do arroz é, respectivamente, 11,2% e 8,6%
também em decorrência de ganhos de produtividade.
Para ela, esse comportamento da produção agrícola,
sobretudo em relação ao crescimento da produtividade
média das culturas, mais significativas para aquelas
com baixo grau de processamento, como mandioca e arroz, é
surpreendente diante da crescente queda na oferta dos
recursos públicos destinados ao crédito rural
à elevação das taxas de juros para o
setor. Prova disso, segundo ela, é a safra recorde
de 89, que atingiu 71,5 milhões de toneladas. Porém,
nas temporadas seguintes, houve queda, em 90, de 18,5% e,
em 91 de 19,2%, que Marina Rocha atribui à redução
dos níveis de investimentos provocada pela instabilidade
da renda agrícola no final dos anos 80.
Marina Rocha afirma que, quando o Plano Collor foi implantado,
a safra 89/90 estava em plena comercialização
e os produtores descapitalizados devido a uma queda nos preços
agrícolas no 2º semestre de 89, devido a uma venda
apressada dos estoques da temporada anterior, motivada pelo
atraso na liberação do crédito de custeio.
A intenção dos agricultores fora obter ativos
de maior liquidez para financiar o plantio e, ainda, proteger
o capital da corrosão inflacionária.
Em função disso, a safra 89/90 foi plantada
num contexto de aumento do endividamento e, menor grau de
investimento na atividade. O Plano Collor agravou esse quadro
ao congelar os ativos financeiros e reduzir a demanda por
ativos reais, inclusive estoques agrícolas, provocando
uma queda generalizada de preços np período
inicial de implementação. Além disso,
houve problemas no setor financeiro que, avaliados, a uma
política monetária restritiva, desindexação
salarial e desaquecimento da demanda agregada, provocou uma
interrupção no processo de alta dos preços
agrícolas.
Para ela, esses fatores explicam a redução da
safra 90/91 e a conseqüente elevação dos
preços. Na temporada seguinte (92/93), os preços
mostram recuperação, influenciados em parte
pela melhor distribuição de estoques e, também,
pela tendência altista das cotações internacionais.
Esses mesmos fatores determinam a manutenção
do crescimento dos preços até meados de 94,
tendo como reforço uma demanda aquecida devido à
expectativa de implementação do Plano Real.
Marina Rocha enfatiza que o lançamento do programa
econômico, em 94, foi beneficiado pelo desempenho dos
preços agrícolas, pois a taxa de câmbio
valorizada barateou os produtos importados, mesmo que seus
preços em dólar tivessem subido. Assegura, ainda,
que o aperto no crédito, as altas taxas de juros internas
e as facilidades em processar compras externas (baixas alíquotas
e inexistência de barreiras quantitativas), tornaram
atraentes as importações. Tanto mais,
que as condições de financiamento externo eram
mais favoráveis que as internas, em termos de custo
e do prazo.
Segundo afirma, isso fica evidente quando se verifica que
o volume importado no período 90/95 dos principais
produtos necessários ao abastecimento interno, tais
como algodão, arroz, feijão, milho, soja e trigo,
alcançaram níveis recordes em 1994, com
a exceção do algodão, que teve seu recorde
de importação atingido no ano anterior.
A pesquisadora lembra, ainda, que em 93, também ocorreram
importações significativas para a maioria dos
produtos. Mesmo com esse contratempo, Marina Rocha afirma
que os agricultores foram beneficiados por uma redução
dos custos de produção e conseguiram aumentar
o nível de investimento, minimizando os efeitos de
contenção de preços e até obtendo
melhores safras nas temporadas seguintes. Porém, reitera
que esse quadro conturbado dos preços aconteceu, fundamentalmente,
em decorrência da ação do governamental,
seja pela adoção de políticas macro-econômicas
(planos de estabilização), seja pela interferência
na própria comercialização dos produtos
agrícolas.
A política de garantia de preços mínimos
continua a mesma praticada em anos anteriores, exceto pelo
acréscimo de um novo instrumento, o PL Prêmio
de Liquidação que busca viabilizar a
absorção pelo mercado de produtos financiados
em regiões distantes dos centros consumidores. Com
o crédito escasso, a PGPM tem sido fundamental no apoio
do governo aos agricultores e, pelo menos aparentemente, seu
objetivo é fixar preços mínimos mais
elevados e reduzir a importância do crédito de
custeio subsidiado como mecanismo de apoio devido, principalmente,
à sua característica concentradora de renda.
Porém, comparando o preço mínimo com
o preço recebido pelo produtor de alguns dos principais
produtos amparados pela PGPM, fica contatada que a política
de garantia de compra não pode ser considerada, efetivamente,
como um fator de estímulo à produção.
Somente em raras ocasiões, acrescenta,
o preço mínimo foi favorável ao produtor,
superando o preço de mercado. Isso aconteceu com maior
freqüência em 92 e certamente contribuiu
para estimular a produção de grãos que
vinha em queda desde 89/90.
Outro problema da PGPM, segundo Marina Rocha, está
relacionado com o descompasso entre direitos previstos na
legislação e os recursos disponíveis
para a execução. Os direitos garantem que são
assegurados preços mínimos para todos os produtos
amparados pela política. Como os recursos disponíveis
estão muito abaixo das necessidades, seria preciso
que os planos de safra se delimitem claramente a garantia
a ser dada e isto tem sido sistematicamente ignorado
nos últimos anos.
Com relação aos demais instrumentos da PGPM,
Marina Rocha diz que as funções anteriores estão
basicamente mantidas. Ou seja, com o EGF Empréstimo
do Governo Federal -, o governo compra os excedentes com base
nos preços mínimos fixados antes do plantio.
Houve a citação do VF Valor de Financiamento
-, pelo qual produto como alho, amendoim, caju, sorgo, soja
e cevada são financiados via EGF, com base no VF e
não no preço mínimo.
A pesquisadora do IEA afirma que essas mudanças contribuíram
para reduzir os custos com a PGPM e para a transferência
da administração dos estoques para o setor privado.
Contudo alguns problemas permanecem, como o fato de uma parcela
crescente da produção estar ou permanecer depende
da iniciativa e dos recursos do governo para retornar ao mercado.
A PGPM ainda não tem uma abrangência geral, pois
a equalização do EGF só beneficia produtos
que obtiveram financiamento, Penalizando duplamente,
dessa forma, aqueles que não tiveram acesso ao mecanismo.
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