|  
                    
                    O empreendimento começou, há exatos oitos anos, 
                    quando uma empresa de insumos criou um projeto inovador inicialmente 
                    com as comunidades de Salvaterra, Soure, Camará e Condeixa 
                    (municípios distantes a 80 quilômetros da capital 
                    de Belém). O trabalho, que reunia 26 famílias, 
                    focava em aproveitar a mão de obra local na coleta 
                    das sementes de andiroba, pracaxi e ucuúba, oriundas 
                    daquela região. 
                    Aos poucos, a iniciativa ganhou forma e se tornou uma alternativa 
                    de conscientização ambiental e de renda (no 
                    período de escassez do pescado), para os moradores 
                    daqueles municípios: Era comum que os pés 
                    de andiroba fossem cortados na região. As famílias 
                    também procuravam outras atividades, como a exploração 
                    indiscriminada dos recursos naturais renováveis, como 
                    a derrubada de árvores. Outras optavam também 
                    pelos trabalhos nas fazendas da região, o que lhes 
                    garantiam o sustento temporariamente, lembra João 
                    Matos, gerente de biodiversidade da Beraca, a empresa incentivadora 
                    e uma das responsáveis pelo projeto. Como os 
                    municípios estão localizados em regiões 
                    praianas, a única fonte de renda da maioria das famílias 
                    ribeirinhas, era somente o pescado. Porém, os pescadores 
                    já estavam acostumados a passar aperto nos meses de 
                    cheia, quando os peixes migram para outros lugares e ficam 
                    raros na região, completa. 
                    De acordo com Matos, no Marajó, durante a época 
                    da estiagem, que vai de junho a novembro, o pescado é 
                    abundante e as mesas são fartas. Por outro lado, na 
                    época das águas cheias (que se estende de dezembro 
                    a maio), o pescado diminui e as famílias sofrem por 
                    escassez de recursos alimentares. Neste período, 
                    os peixes se afugentam e a gente fica sem pescado. Para sobreviver, 
                    nós pegávamos caranguejos, fazíamos carvão 
                    e recolhíamos algumas sementes de andiroba, que vendíamos 
                    aqui na região mesmo. Muitas vezes, a gente se cansou 
                    de fazer óleo extraído das sementes, para ganhar 
                    um pouco a mais, diz a moradora de Salvaterra, Maria 
                    das Dores Conceição Neve, conhecida também 
                    como Dadá. 
                    Na Região Paraense, quando o verão chega falta 
                    pouco para os campos secarem e a paisagem mudar outra vez. 
                    Esse ciclo se repete todos os anos, e na ilha, as águas 
                    da cheia entram nas florestas alagadas e trazem as sementes 
                    para as praias. Se o peixe vai, as sementes vêm, 
                    argumenta Matos. Juntos, os extrativistas de Salvaterra 
                    já conseguiram até coletar 500 toneladas em 
                    uma só safra. Um cenário diferente de se ver, 
                    quando era comum encontrar grande quantidade de sementes de 
                    andiroba, que sem quase aproveitamento chegava apodrecer nas 
                    praias, descreve. 
                    Com a iniciativa, a Beraca  empresa especializada no 
                    desenvolvimento de tecnologias e matérias-primas para 
                    vários mercados, como os cosméticos, nutrição 
                    animal e para a indústria de alimentos e bebidas  
                    trouxe uma nova vida para os moradores daquela região. 
                    Por meio de incentivo, tecnologia e treinamento, juntos, os 
                    moradores até formaram há dois anos uma cooperativa 
                    que, aliás, tem dona Dadá, de 50 
                    anos, como a presidente da Cooperativa dos Produtores Extrativistas 
                    Marinhos e Florestais da Ilha de Marajó (Coopemaflima). 
                    Hoje a cooperativa é formada por 26 pessoas, 
                    mas até 400 pessoas se beneficiam do projeto, já 
                    que nem todos que vendem as sementes são cooperados. 
                    Durante a safra, que dura cerca de três meses ao ano, 
                    cada família consegue ganhar entre um e três 
                    salários mínimos ao mês, diz a presidente, 
                    que trabalha na coleta de sementes com o marido e um dos seis 
                    filhos. 
                    A renda pode não parecer alta, mas é importante 
                    para os moradores das comunidades participantes, principalmente 
                    para as mulheres, que tomaram a frente da cooperativa que 
                    trabalha em mais de oito praias, organizando pessoas para 
                    na safra colherem sementes na praia e fornecerem à 
                    empresa. Atualmente, a Beraca compra 500 toneladas de sementes 
                    da cooperativa por ano, beneficiando a renda de cerca de mil 
                    habitantes. Antes, só vivíamos a mercê 
                    dos atravessadores. O que vendíamos tinham valor muito 
                    baixo para a comercialização. Com o apoio destas 
                    parcerias, discutimos uma alternativa de preço, agregarmos 
                    valor ao produto por meio do processamento e já garantimos 
                    para a empresa o volume necessário para a produção, 
                    diz Dadá. 
                    No início do projeto, poucas famílias acreditavam 
                    na ideia e comentavam que aquilo não poderia render 
                    recursos. Hoje, tudo o que é recolhido, agora tem destino 
                    certo, a indústria que beneficia a própria comunidade. 
                    Com o foco neste mercado, o próximo passo da Coopemaflima 
                    é a construção de uma fábrica 
                    de extração de óleo, para que as sementes 
                    possam ser beneficiadas localmente. Uma loja para vender os 
                    extratos também deve ser aberta em breve. 
                    Segundo o gerente da empresa, lá ainda existe a pesca, 
                    mas o extrativismo complementa a renda das famílias, 
                    que varia de acordo com a época do ano. A comunidade 
                    adotou a semente de andiroba como alternativa econômica 
                    financeira, exercendo uma atividade socioambiental, com a 
                    consciência de que os frutos colhidos geravam a conservação 
                    de mangues e várzeas, e que o volume de frutos comercializados 
                    poderia aumentar a partir de um manejo adequado de suas áreas 
                    de capoeiras, uma espécie de vegetação 
                    secundária composta por gramíneas e arbustos 
                    esparsos, e mangues, argumenta Matos. 
                    E é neste cenário também que se insere 
                    a realidade das mulheres extrativistas dos municípios 
                    de Salvaterra, Soure, Camará e Condeixa, as quais antes 
                    de nascer do sol, saem coletando as sementes, e como elas 
                    mesmas dizem agora, são as mulheres que vivem 
                    em função da maré. Com o foco no 
                    desenvolvimento sustentável, o projeto de empreendedorismo 
                    é um dos ganhadores do Seed Awards 2009, prêmio 
                    conferido pela Seed Initiative, uma parceria entre a União 
                    Internacional para a Conservação da Natureza 
                    e dos Recursos Naturais (IUCN) o Programa das Nações 
                    Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e o Programa das Nações 
                    Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). 
                  Além 
                    das práticas tradicionais 
                     
                    Além da Coopemaflima, hoje uma outra cooperativa vem 
                    ganhando um grande empurrão: é a 
                    Cooperativa Mista de Pequenos Produtores Rurais de Curralinhos 
                    (Cooped). Graças à ação de parceiras 
                    com a organização não governamental (ONG) 
                    Bolsa Amazônia  um espaço de promoção 
                    para empresas de responsabilidade social e ecológica, 
                    contribuindo para o aumento da renda dos pequenos produtores 
                    amazônicos  outras famílias dos municípios 
                    de Breves, Curralinho e regiões próximas também 
                    puderam ser auxiliadas. Essas ações só 
                    promovem a qualidade de vida da comunidade e a sustentabilidade 
                    da região, afirma o diretor executivo da Bolsa 
                    Amazônia, Claudionor Lima Dias, e coordenador do projeto. 
                    Segundo Dias, a coleta de sementes de andiroba sempre foi 
                    prática tradicional nos municípios, o que ocorreu 
                    foi apenas um incentivo de transformar a atividade em uma 
                    fonte complementar de renda para as comunidades e de oportunidade 
                    para a empresa. Hoje além da pracaxi, andiroba 
                    e o açaí, há a ideia da produção 
                    da farinha de buriti. Agora no mês de dezembro, a cooperativa 
                    além de iniciar uma melhoria na coleta das sementes, 
                    pretende agregar maior valor com a extração 
                    do óleo das sementes, acrescenta. 
                    O resultado destas ações entre cooperados, empresas 
                    e ONGs possibilitou as comunidades a obter certificações 
                    orgânicas e ambientais para as matérias-primas 
                    coletadas, colaborando para o aumento do valor agregado dos 
                    produtos. A Cooped, por exemplo, foi criada em 1998, 
                    mas apenas um ano ingressou em um trabalho de parceria com 
                    a empresa. E de lá pra cá várias atividades 
                    foram desenvolvidas. Agora temos um potencial grande de comercialização, 
                    antes somente limitadas ao açaí, diz Joval 
                    de Matos, presidente da cooperativa, localizada em Curralinho, 
                    a 107 quilômetros da capital paraense. 
                    Atualmente são 117 famílias que vivem da coleta 
                    das sementes. Porém, o açaí ainda é 
                    a grande vedete. No período de entressafra, 
                    por exemplo, cada rasa  medida utilizada no local e 
                    que corresponde a aproxidamente 14 quilos do fruto  
                    de açaí saí por cerca de R$ 45 reais.Os 
                    cooperados entregam a quantidade solicitada à empresa 
                    e a sobra é rateada para o benefício da própria 
                    cooperativa. Hoje, as frutas e sementes produzidas aqui, ganham 
                    o mundo. Em uma feira em Bogotá, na República 
                    da Colômbia, oito de nossos produtos foram apresentados 
                    lá, como o açaí, o biscoito de cupuaçu, 
                    a castanha-do-pará, a andiroba, o pracaxi e a ucuúba. 
                    E o mundo de olho nas nossas riquezas, orgulha-se Matos. 
                 |