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MORCEGOS - MAIS AMIGOS DO QUE UM PROBLEMA
rev 116 - outubro 2007

Os morcegos são os únicos mamíferos com capacidade de vôo, devido à transformação de seus braços em asas. Na natureza, procuram abrigo em copas de árvores, folhagens, fendas de rochas e cavernas. São animais de hábitos noturnos e sem nenhuma característica aparente que os torne atrativos pela população. A lista de aspectos negativos dos morcegos é conhecida. Porém, o que poucos sabem é que esses animais podem trazer grandes benefícios ao meio ambiente e à agricultura.

Para divulgar a importância da preservação desses animais, incentivar as pesquisas voltadas à conservação e integrar os pesquisadores foi criada a Rede Latino-americana para Conservação e Estudos de Morcegos- Relcom.

Uma das prioridades do grupo será desmistificar a má imagem dos morcegos. Ao contrário do que a maioria das pessoas pensa, eles não são “vampiros”. No mundo existem mais de 1.400 espécies de morcegos. No Brasil, são cerca de 170 espécies. Desse total, apenas três espécies são hematófagas (alimentam-se de sangue). A maioria das espécies de morcegos é insetívora, alimenta-se de insetos, seguidas pelas espécies frugívoras, que comem frutos.

Das três espécies hematófagas, acredita-se que só uma tem preferência pelo sangue bovino, uma vez que os animais selvagens que eles utilizavam estão desaparecendo e a oferta de gado aumentando. As outras duas preferem sangue de outros mamíferos e aves. Nenhuma dessas espécies alimenta-se de sanguehumano corriqueiramente. A raiva humana é, na maioria das vezes, transmitida por cachorros e gatos.

Os morcegos são considerados causadores de surtos de raiva bovina e freqüentemente a primeira reação das pessoas é de exterminar os morcegos. O ideal é sanar os motivos dos surtos, que podem estar relacionados a fatores como desmatamento, falta de educação ambiental e de vacinação no gado. Para a pesquisadora da Embrapa Cerrados, é necessário conhecer os dados populacionais para relacioná-los com os surtos de raiva bovina e, principalmente, realizarum trabalho multidisciplinar para o manejo das populações transmissoras e a prevenção da raiva.

Serviços ambientais

Os morcegos prestam serviços como polinizadores de plantas, dispersores de sementes e predadores de insetos considerados pragas agrícolas. No México, por exemplo, os morcegos são polinizadores de cactos usados na confecção da tequila. No Brasil, eles polinizam espécies como pequi, alguns maracujás nativos, piquiá, sumaúma, munguba, jatobá, xiquexique, facheiro, bromélias e muitas outras.

Outro grande benefício ambiental dos morcegos é o fato deles serem dispersores de sementes, tornando-se úteis para a recuperação de áreas degradadas. Estudos desenvolvidos na Embrapa Cerrados mostram que pelo menos 268 espécies de plantas cuja dispersão das sementes é feita por animais (zoocoria) e que são encontradas em matas de galeria, 34 delas (13%) são dependentes dos morcegos (quiropterocoria). É possível coletar sementes das fezes desses animais, já com a dormência quebrada, e selecionar sementes de espécies nativas, que apresentem também potencial para retorno financeiro, e utilizá-las para a recuperação de áreas degradadas e reflorestamento.

Outro importante serviço prestado gratuitamente é que uma colônia de morcegos pode comer cerca de 6 mil toneladas de insetos em um ano. Calcula-se que cada morcego coma cerca de 300 insetos por hora, o que o torna um grande predador. Ao comerem os insetos que prejudicam as culturas agrícolas, os morcegos ajudam a reduzir os custos de produção.

No domínio do Cerrado, os morcegos compõem mais da metade da fauna de mamíferos, ou seja, 1 em cada 2 das 200 espécies de mamíferos do Cerrado é um morcego. Uma espécie polinizadora, endêmica ao bioma, a /Lonchophylla dekeyseri/, é considerada ameaçada de extinção. Apesar do risco, quase ninguém sabe sobre essa espécie por que é um morcego. Não é nada comum citar o morcego entre os animais ameaçados de extinção no Cerrado. Mas, a Embrapa Cerrados finalizou, no início deste ano, projeto financiado pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), envolvendo cinco instituições de pesquisa e ensino, para elaboração de Plano de Manejo Nacional para a espécie. Caberá ao MMA e IBAMA implementarem o Plano de Manejo.

A pesquisadora da Embrapa Cerrados ressalta que a conservação de espécies não é uma questão só de ambientalistas. É também uma preocupação de uma instituição de pesquisa agropecuária, pois não se pode pensar apenas em resultados de produção, sem estudar as interações com o meio ambiente. A própria política agrícola brasileira (Lei 8.171 de 17/01/91) preconiza em pelo menos 15 de seus artigos, a proteção do meio ambiente e a conservação dos ecursosnaturais e biodiversidade como requerimentos legais.


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