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VELHOS INIMIGOS DA PRODUTIVIDADE
rev 70 - outubro 2003

Isso provavelmente se deve ao fato de mais de 90% do sistema de pecuária no Brasil, ser constituído sobre o sistema de pastagens extensivas. Os animais são criados em grandes áreas, o que tornando-os mais suscetível a ação desses parasitas esternos. Todos os anos esses agentes causam juntos, um déficit produtivo de aproximadamente US$ 1bilhão. Dinheiro este, que poderia estar sendo aplicado tanto par empregar novas tecnologias para aumento da produtividade, como para melhoria na renda do pequeno e médio produtor.

Os ecto-parasitas, entre as muitas espécies que atacam os rebanhos de Norte a Sul do país, causam diferentes tipos de danos aos animais infectados. Os prejuízos mais diretos são causados pela própria relação de parasitismo que estes estabelecem com o hospedeiro. O setor coureiro é um dos que mais sofrem perdas pela ação direta dos carrapatos, bernes e bicheiras. De acordo com pesquisadores da Embrapa gado de corte, de Campo Grande (MS). A má qualidade dos couros produzidos na região Centro Oeste do país, principalmente no estado do Mato Grosso do Sul, é uma situação que vem perdurando há algum tempo. Os couros de primeira e segunda classe, não existem desde 1988 e, os de terceira, desde 1995. Isso se deve em parte a má aplicação das técnicas de manejo e controle de pragas utilizada nas fazendas da região, abrindo fortes precedentes para a formação de grandes infestações.

Já os problemas ocasionados de forma indireta por esses organismos, podem ser evidenciados, tanto na aparente diminuição do potencial produtivo dos animais, como nas doenças que são transmitidas por via da inoculação de microrganismos durante o processo de parasitismo. Segundo a médica veterinária Márcia Cristina de Sena Oliveira, pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste, de São Carlos (SP), no caso específico do carrapato Boophilus Microplus - o carrapato do boi - além dele ser a única espécie que parasita os rebanhos de bovinos no país, é hoje, o principal agente transmissor da Tristeza Parasitária Bovina (TPB). A veterinária explica que apesar dessa doença possuir apenas uma denominação, ela é causada por três microorganismos diferentes, sendo duas espécies de protozoários do gênero Babesia: Babesia bovis e Babesia bigemina, causadores da Babesiose, e uma denominada Anaplasma marginale responsável pelo desenvolvimento da anaplasmose. A tristeza parasitária dos bovinos compreende um conjunto de doenças que clinicamente caracterizam-se por apresentar nos animais um quadro de febre alta, anemia hemolítica, hemoglobinúria e icterícia, podendo levá-los á morte nos casos mais graves. Esses microorganismos atuam na célula hemácias destruindo-as liberando no organismo substância extremamente tóxicas. A Babesia bovins por sua vez, provoca um quadro clínico mais grave e de caráter mais agudo, podendo ocorrer sintomas nervosos devido a multiplicação das babésias nos capilares cerebrais. Já com a Babésia bigemina, essa leva o paciente a um quadro de caráter mais crônico acompanhado de hemoglobinúria, presença de hemoglobina na urina, o que pose ser evidenciado pela mudança na coloração que torna-se de cor mais escura, explica.

Originário dos países do continente Asiático esse artrópode pertence a família Ixodidae e foi introduzido no Brasil pelos colonizadores portugueses, há cerca de 500 anos. Essa espécie caracteriza-se por parasitar um único animal durante toda sua vida. Além de não apresentar uma segmentação corporal definida e possuir três pares de patas quando larvas e quatro quando ninfas e adultos.

Seu ciclo de vida começa quando as fêmeas adultas (Teleógenas), engurjitadas de sangue do hospedeiro, caem no solo e realizam a posturas de seus ovos. Esse processo tem em média uma duração de 15 dias, mas, em condições de climas frios, podem perdurar por todo o período de inverno, podendo em alguns casos transcorrer mais de 100 dias, entre a postura e a eclosão das larvas. Cada fêmea deposita entre 2 e 3 mil ovos, que se desenvolvem em meio ás pastagens.

Essa primeira fase da vida dos carrapatos é denominada como fase livre, ou seja, as larvas concentram uma grande quantidade de nutrientes extraídos da mãe e, portanto, não dependem de um hospedeiro para sobreviver. Já a segunda fase do processo de desenvolvimento tem início próximo ao 15º dia de vida e é, segunda a pesquisadora, de grande importância para o desenvolvimento da espécie, pois é quando os indivíduos, deixam o estado livre e passam á condição de parasitas hematófagos. A definição do sexo também é realizada nessa fase, sendo que as fêmeas possuem um papel bem mais complexo que os machos. Ao redor do 21º dia de Fêmea já fecundada pelo macho, continua seu repasto de sangue até cair novamente no solo, por volta do 31º dia, iniciando assim um novo ciclo. O macho por sua vez permanece durante toda a fase parasitária circulando no animal, se alimentando do sangue e realizando o trabalho de fecundação da fêmeas.

Do ponto de vista epidemiológico, as diversas regiões, podem ser classificadas da seguinte forma: áreas de estabilidade ou instabilidade enzoótica. As regiões onde as condições climática não favorecem o desenvolvimento dos carrapatos são denominadas de instabilidade enzoótica. Essa áreas dependem de uma atenção dependem de uma atenção especial, pois a falta dos carrapatos podem levar os animais a perda da imunidade aos agentes transmissores da TPB. Essa imunidade é segundo a pesquisadora da Embrapa, de importância vital e deve ser estimulada através da exposição dos animais ao pasto. A média explica que a principal via infestações são as pastagens que concentram cerca de 90% de toda a população de carrapatos. Os outros 10% são as larvas que conseguem subir pelas folhas das pastagens e se prender ao animal tornando-o hospedeiro. Esses também são responsáveis por realizar o ciclo de reprodução, perpetuando a espécie.

Esse estimulo a criação de anticorpos deve ser estimulado desde que os animais é bezerro, pois isso ajuda diminuir o número de mortes na propriedade por Babesioses e anaplasmoses. As infestações que ocorrem desde os primeiros meses de vida estimulam o aparecimento de sólida imunidade, conclui a pesquisadora.

Os carrapatos encontram no clima tropical, as condições ideais para seu desenvolvimento, e isso devido a facilidade de adaptação a ambientes quentes com bastante incidência de chuva o que provoca bastante umidade. As temperaturas ao redor dos 27º C com umidade de 70% são consideradas ideais pelos especialistas par o seu desenvolvimento. Dessa maneira o tipo de vegetação utilizada é muito importante, levando-se em conta que os pastos mais altos atuam protegendo as larvas dos carrapatos dos raios solares, fase na qual eles estão mais vulneráveis. Algumas forrageira agem como escudo de proteção para larvas dessas espécie, portanto, o monitoramento nas áreas de pastagens ajuda bastante conter as infestações durante os meses de chuva. Os ovos são muito sensíveis a temperaturas abaixo de 15ºC, no entanto, as larvas podem sobreviver por até 3 meses nas pastagens, sem perder seu poder infestante. Assim com condições de clima favoráveis e hospedeiros disponíveis, esses parasita se estabelecem com muita facilidade no rebanho, o que sobre certos aspectos é desejável, conclui.

Por esse motivo os programas de controle devem ser observados, sobre a ótica de se manter uma população em número adequado, garantindo assim, a imunidade constante de rebanho. Outro ponto relevante e, observando pela pesquisadora, está relacionando a aparente resistência de animais de origem Zebuínas ao ataque dos carrapatos. A suscetibilidade dos animais varia também entre raças e dentro de raças. Dessa maneira dento de um rebanho vão ter sempre animais com maior infestação que outros, no entanto, na prática é difícil eliminá-los, já que apresentam na maioria das vezes características produtivas positivas, observa.

Já o parasita do berne possui um ciclo evolutivo um pouco diferenciado, pois sua forma de contaminar o rebanho, se dá por via da mosca Dermatobia hominis. Para realizar a postura de seus ovos, que em média varia entre 300 á 400 por ninhada, as fêmeas utilizam outra espécie de mosca, também bastante conhecida. A Stomoxys calcitrans, conhecida popularmente como mosca, dos estábulos ou mosca doméstica é utilizada como transportadora dos ovos até o hospedeiro, que na grande maioria das vezes é o boi, mas pode vir a ser também outros animais, inclusive o homem. Segundo dados da Embrapa essa mosca pode ser encontrada em todas as regiões do país e na sua fase larval denomina-se berne.

O ciclo evolutivo da mosca ocorre totalmente na zona rural e divide-se em duas fases distintas. A fase doméstica que é realizada entre os bovinos ou eventuais vetores de seus ovos, através do contato direto com animais. Nesta fase pode observar um número grande de animais com alto grau de infestações. Já a fase de bosque desenvolvendo se com menor aproximação com os bovinos e os índices de infestação apresentam resultados bastante reduzidos.

Os prejuízos causados a pecuária se traduzem pela queda na produção, pois os animais são extremamente exigidos, sofrendo perdas drásticas no seu potencial. Não se tem dados preciso sobre os danos pelo berne, mas, sabe-se que são de grande monta. Animais infestados com uma população entre 20 a 40 bernes chegam a perder de 9 a 14% de seu peso. Entre os animais de aptidão leiteira essa perda pode atingir até 25% da produção de leite por dia no animal. O ônus gerado pela ação da mosca Dematóbia hominis á pecuária brasileira ultrapassa os US$ 3,6 milhões anuais.

Para a pesquisadora da Embrapa Pecuária Sudeste, o trabalho de controle, em ambos os casos, deve ocorrer através de um esquema previamente estabelecido. Esses métodos precisam ser delineados para atender cada sistema de produção e não devem basear-se somente no uso de carrapaticidas e inseticidas. Escolher o melhor produto por meio de testes laboratoriais, deve ser feito somente, quando há resistência por parte do parasita. A veterinária lembra que todas as etapas do manejo, incluindo alimentação, saúde do rebanho, controle e rotação das pastagens, são pré requisitos básicos para um bom sistema de produção.

Outro aspecto considerado importante no tratamento, dessas pragas, diz respeito aos diferentes níveis de resistência, apresentados por esses agentes, durante seu ciclo de vida. Como as fêmeas adultas são mais resistentes ao princípio ativo dos medicamentos recomenda-se tratamentos com banhos de carrapaticida em intervalos regulares. Essa aplicação deve ser feita antes que os parasitas atinjam um estágio adulto de desenvolvimento. Desta forma consegue-se que não ocorram carrapatos sobreviventes. Para realização de um controle estratégico dos carrapatos recomenda-se que aplicação dos farmacos ocorra em quantidade de 4 a 5 banhos, em intervalos de 21 dias. Assim é possível manter a estabilidade enzoótica da propriedade evitando mortalidade dos animais, conclui.


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