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FERTILIZANTES - Sem erra a mão
rev 177 - novembro 2012

Na natureza, nada se cria. Tudo se transforma. A aplicação dessa máxima no desenvolvimento de uma lavoura como a de soja, por exemplo, se dá no processo de absorção dos nutrientes que garantem a saúde e a estruturação da planta em seus diversos estádios (seis vegetativos e oito reprodutivos, nestes últimos, o quinto, denominado R5, se destaca pois marca o início de enchimento dos grãos). Água, luz e micro e macro minerais compõem basicamente a dieta da lavoura – estes últimos são disponibilizados pelo solo. No entanto, a prescrição para o uso desses recursos tem de ser mediada com o próprio depósito desses elementos na área a ser cultivada, em nome da adoção de uma agricultura sustentável.

A manutenção do solo sempre fértil e coberto é o seguro que o produtor faz para não ter prejuízos com uma lavoura fraca e pouco produtiva lá na frente.

O tema fertilização na agricultura foi destaque durante o 62º Sistemas Integrados de Manejo da Produção Agrícola Sustentável (Simpas), realizado em Ituverava (SP), entre os dias 4 e 5 de setembro. Valter Casarin, pesquisador, engenheiro agrônomo especialista em Ciências do Solo e diretor adjunto do International Plant Nutrition Institute (IPNI  Programa Brasil), foi o palestrante desse tema no evento e explicou a metodologia que o produtor tem de se valer no momento de fertilização do solo. “Não adianta fazer todo o cálculo da quantidade de fertilizantes se, no final das contas, o produto estará sendo distribuído por um equipamento desregulado ou com peças faltando”, alerta.

A ideia da má distribuição de fertilizantes no solo parte de uma pesquisa publicada em 2007 pelo pesquisador Luiz Antonio Martinelli, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena), do Campus de Piracicaba da Universidade de São Paulo. No estudo, foram avaliadas as perdas de nitrogênio ao longo de toda a cadeia de produção agropecuária. No momento da aplicação no solo, as perdas chegaram a 47%, a mais significativa entre todas averiguadas. Foram avaliadas as quantidades de nitrogênio desde quando saiu da fábrica até a quantidade que é realmente ingerida pelo consumidor do alimento.

Saber trabalhar com fertilizantes diz respeito ao uso racional desses importantes insumos da lavoura, que se constituem no maior peso nos custos de produção da agricultura. Para não correr o risco de simplesmente jogar o dinheiro fora, nesse caso, é necessário verificar como estão os equipamentos que efetuam o processo de adubação. Nesse caso, são necessárias as manutenções constantes nos equipamentos para não desperdiçar. “Dependendo da distância de aplicação em relação ao solo, você vai ter imperfeições”, explica Casarin. “À medida que se reduz isso, percebe-se um pouco mais de homogeneidade na distribuição do fertilizante. Muitas vezes, achamos que está sendo feita uma aplicação correta por hectare. Na média, pode-se até comprovar isso, mas se for avaliado área por área, verá que há diferenças de distribuição”.

As fontes férteis

No campo dos fertilizantes, o trio que tem maior destaque é o famoso NPK, sigla formada com os símbolos dos elementos nitrogênio, fósforo e potássio, respectivamente. Em geral, os fertilizantes estarão baseados na disponibilidade desses na formulação. No caso do nitrogênio, as fontes mais utilizadas são a ureia (45% de N), sulfato de amônio (21% de N e 23% de enxofre, S), nitrato de potássio (13% de N e 44% de óxido de potássio, K2O), fosfato monoamônico ou MAP (10% de N e 46% a 50% de pentóxido de fósforo, P2O5) e fosfato diamônico ou DAP (16% de N e 38% a 40% de P2O5).

Entre as principais fontes de fósforo estão o MAP, o DAP, o superfosfato simples (comumente chamado de super simples) que possui 16% a 18% de P2O5 e 18% a 20% de Cálcio (Ca), superfosfato triplo ou super triplo (41% de P2O5 e 7% a 12% de Ca) e termofosfato (18 % de P2O5, 9% de Magnésio, Mg, 20% de Ca e 25% de Silicato, SiO4).

Os dois sais de potássio mais importantes em uso corrente são o cloreto de potássio (contendo 60% a 62% de K2O) e o sulfato de potássio (50% a 52% de K2O). Cerca de 90% da produção mundial de potássio são na forma de cloreto de potássio, enquanto que o sulfato de potássio representa menos que 5% do total.

Há também práticas complementares no processo de adubação que garantem também melhores resultados na lavoura. A calagem tem um destaque à parte, pois ela eleva o pH do solo. “Não adianta ter nutriente no chão, e a planta não poder absorvê-lo”, atesta diretor adjunto IPNI Programa Brasil. “As plantas não conseguem tem disponibilidade dos nutrientes que ela precisa em condição de pH baixo no solo. Por isso temos de dar um ‘sal de fruta’ para ele – o calcário – que aí ele passa a disponibilizar esses nutrientes”.

O gesso agrícola é outro grande insumo que entra nessa lista de práticas complementares. Além de levar cálcio e enxofre, ele promove uma diminuição da saturação de alumínio no solo, que é tóxico e dificulta ou impede o crescimento do sistema radicular da planta. A partir desse elemento, o produtor pode fazer ‘boca’, ou seja, aumentar o desenvolvimento do sistema radicular da planta, permitindo a planta explorar um volume maior de solo e, consequentemente, um melhor aproveitamento dos fertilizantes aplicados e de nutrientes nativos do solo, além de poder aproveitar melhor a água do solo, fator importante em épocas de déficit hídrico. “Os manejos mais adequados para obter um sistema radicular mais desenvolvido é melhorar a fertilidade do perfil do solo, seja pelo uso de calcário e gesso e de adubação correta e equilibrada. Num estudo, toda vez que se aumenta a quantidade de gesso, aumenta também a absorção dos nutrientes pela planta”.

Safra boa para poupança

Ao que tudo indica, a safra de grãos brasileira promete outro recorde, e o mercado externo está ávido por commodities – cenário mais do que perfeito para o produtor lançar mão de maiores investimentos na lavoura para obtenção de uma produtividade maior proporcionalmente. “Este é um ano para explorar todo o potencial produtivo da planta, pois cada grão produzido vale muito”, afirma o pesquisador Marcio Veronese, do Programa de Monitoramento e Adubação (PMA) da Fundação de Apoio à Pesquisa Agropecuária de Mato Grosso (Fundação MT). “Sendo assim, é um ano para investir em técnicas que tenham resultado consistentes na pesquisa. O produtor tem de investir naquilo que realmente dê resultados na produtividade”.

Além de investir na lavoura, Veronese defende que nessa safra o produtor possa fazer o aumento na poupança de fertilizantes no solo, com a correção de fertilidade das áreas cultivadas. De acordo com o pesquisador da Fundação MT, esse trabalho começa com a identificação dos nutrientes a serem poupados em maior ou menor quantidade, em função da disponibilidade de cada um no solo. Essa poupança não se refere somente à adição dos fertilizantes, mas também a disponibilidade de matéria orgânica que influencia na estruturação das qualidades física e biológicas do solo.

“Como exemplo, pode-se citar a recomendação de adubação fosfatada corretiva, visando o mesmo potencial produtivo, que deve ser maior no solo com maior teor de argila em função das características químicas deste nutriente. Para nutrientes como potássio, cálcio e magnésio, devemos pensar qual é o tamanho do ‘reservatório’ que temos no solo. Os mais argilosos tendem a ter esse reservatório maior do que os mais arenosos”, explica.

Nesse sentido, a recomendação é sempre manter o equilíbrio – nada faltando ou sobrando. Pois quando esse reservatório estiver cheio, o que for incorporado a mais será perdido com as chuvas (lixiviação). De acordo com Veronese, as perdas com adubação pesada de potássio ocorrem com maior frequência em solos mais arenosos. Uma saída para aumentar a capacidade do reservatório no solo é aumentar o teor de matéria orgânica. “Em anos mais difíceis com custos de produção mais elevados ou baixo valor de mercado dos produtos agrícolas, para viabilizar economicamente o sistema produtivo acabamos sugando o que temos estocado no solo. Normalmente neste cenário, a adubação é mais modesta, talvez nem repondo a quantidade de nutrientes que estamos exportando do sistema de produção com a produção das culturas. Consequentemente diminuímos o nível de fertilidade do solo. Em cenários econômicos mais positivos devemos aproveitar a oportunidade e aumentar o nível de fertilidade do solo”, avalia Veronese.

Carência de nitrogênio na soja

Alguns estudos de adubação da lavoura de soja têm detectado certa falta de nitrogênio nas plantas. De maneira geral, o elemento tem sido captado diretamente do ar em função da inoculação de espécies de bactérias que ficam nas raízes da planta. No entanto, como a lavoura tem crescido em termos de potencial genético, a necessidade por nitrogênio também saltou.
“Num estudo que nós fizemos a aplicação de nitrogênio no milho de verão, na safra anterior à da soja, percebemos que, quando foi instalada a oleaginosa, ela teve um desempenho espetacular”, diz Casarin. O que se pode dizer dessa pesquisa é que se forem feitos cálculos do que está sendo extraído de nitrogênio do ar pela soja e o que a planta verdadeiramente consome, poderia se notar que o nitrogênio absorvido e fixado não tem suprido as necessidades da planta. Ou seja, falta nitrogênio.

A adubação direta do elemento possui um efeito negativo. A soja tem uma eficiente associação simbiótica com bactérias fixadoras de nitrogênio do ar. “A fixação biológica do nitrogênio (FBN) permite que a soja obtenha aproximadamente 80% da sua necessidade do elemento. Para uma produção de 3.000 quilos por hectare (kg/ha) de grãos são necessários aproximadamente 180 kg/ha de nitrogênio. O custo de inoculação de bactérias eficientes para a fixação do nitrogênio é muito mais barato que a aplicação de fertilizantes. A aplicação de nitrogênio na soja impedirá o estabelecimento destas bactérias nas raízes da soja e, consequentemente, a fixação do nitrogênio”, explica Casarin.

Nesse sentido, se for feita uma reserva uma safra antes, o resultado será de positivo para a lavoura. O que faz o produtor ter mudar os conceitos quanto ao processo de fertilização, pois não se aduba tão somente a cultura a ser plantada, mas sim, o sistema como um todo, para melhorar a fertilidade não só do solo, mas de todo o perfil dele.


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