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AFTOSA - Com a demanda de exportações crescente, o Brasil se blinda contra a doença que assola o País vizinho
rev 169 - março 2012

Em nome da segurança sanitária do país, o governo brasileiro redobrou a sua atenção na fronteira com o Paraguai. Tudo para evitar a entrada do vírus da febre aftosa em terras brasileiras. Na fazenda do pecuarista Sr. Joanelson Pinheiro, situada em Paranhos, distante a 469 quilômetros da capital Campo Grande (MS), na fronteira com o Paraguai, são mantidas 500 cabeças de gado. Por segurança, o pecuarista não adquire mais animais do país vizinho. "Neste momento, temos que evitar qualquer transação do gado, como a troca ou venda", diz. Segundo dados do Departamento de Saúde Animal (DAS) do Ministério da Agricultura, são 650 quilômetros de fronteira seca, cerca de seis mil produtores e 800 mil cabeças de gado na região. "Daí, com isso a atenção tem que ser redobrada", afirma Pinheiro.

A preocupação do pecuarista tem justificativa. Na primeira semana de 2012, o país vizinho anunciou as reincidências no caso da febre aftosa no gado. Isso três meses depois de anunciar que a detecção da doença em seu rebanho. O Serviço Nacional de Qualidade e Saúde Animal (Senacsa) do Paraguai confirmou um novo foco da febre em uma fazenda de criação de gado no distrito de San Pedro, a 330 quilômetros, ao nordeste da capital paraguaia, e a 180 quilômetros da fronteira com o Brasil, no município de Ponta Porã (MS). O novo foco está localizado a 15 quilômetros da fazenda, na qual em 18 de setembro, foi declarado o primeiro foco, o que obrigou o governo à suspensão cautelar das exportações de carne, segundo agências internacionais. A reincidência da doença no Paraguai acendeu o sinal amarelo.

Rapidamente, o Ministério da Agricultura (Mapa) anunciou a suspensão temporária das importações de carne de bovinos da região de San Pedro. Em conjunto com o Ministério da Defesa, eles acertaram retomar o apoio das Forças Armadas, para dar suporte às ações de defesa sanitária animal na região de fronteira. "Os militares estão na área, além da fiscalização permanente de mercadorias, eles passaram a fiscalizar todos os produtos derivados de carne, que ingressam em nosso país", diz Guilherme Marques, diretor do Departamento de Saúde Animal (DSA) do Ministério da Agricultura. Segundo ele, desde a notificação do segundo foco da doença, fiscais federais agropecuários e médicos veterinários dos serviços veterinários estaduais de todo o Brasil atuam na faixa de fronteira internacional em trabalhos de prevenção. "São 14 postos fixos, com projeções para 20 barreiras, sendo que nove volantes estão em operação plena e em vigilância em propriedades consideradas de maior risco. Estão sendo intensificadas as operações na faixa de fronteira aproximadamente 15 km de Mato Grosso do Sul entre o Paraguai", afirma Marques.

Em nota, o Mapa declarou que desde setembro, quando foi detectado um foco da doença no país vizinho já existia uma operação para barrar a doença. Na divisa com Pedro Juan Caballero, no Paraguai, havia uma operação de controle da febre aftosa, realizada pelo Exército Brasileiro e pela Agência Estadual de Defesa Sanitária Animal e Vegetal (Iagro). Segundo o Iagro, o trabalho na fronteira vem sendo benfeito e o Brasil está protegido. Na opinião de Marques, a ocorrência da aftosa naquela localidade é um problema porque houve falha no sistema de proteção dos animais. As dúvidas foram levantadas a esse respeito, no Brasil, pelo próprio Ministério da Agricultura.

Uma das preocupações da entidade é a entrada no Brasil de animais vivos originários do Paraguai por meio de estradas vicinais onde não há fiscalização. "No Brasil, existe há anos uma campanha de vacinação intensa. Temos no nosso país 180 milhões de animais que são considerados livres da doença. Alguns estados brasileiros estão com o mercado aberto para a exportação. No entanto, não basta estar livre, temos que se manter livre da doença", ressalta.

Para garantir a segurança no território brasileiro, os recursos do governo foram mantidos. Segundo o Mapa, neste ano serão R$ 90 milhões destinados para a campanha nacional de vacinação, que começa a partir do dia 01 de maio, sendo que 95% do orçamento serão repassadas para os órgãos estaduais. "O governo já acenou que está em alerta e qualquer urgência poderá disponibilizar verba extra", afirma Marques. O governo federal afirma ter intensificado as ações contra a febre aftosa nos últimos oito anos. No período de 2003 a 2010, segundo o Mapa, os recursos passaram de R$ 3,3 milhões, para R$ 55,9 milhões. Com um rebanho de 205 milhões de bovinos e pouco mais de um milhão de búfalos, o Brasil se transformou no maior exportador de carne do mundo, o que se traduz pelo acréscimo de US$ 3,2 bilhões no saldo da balança comercial nacional, de janeiro a agosto de 2011, segundo dados do Mapa.

O Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Saúde Animal (Sindan), entidade que reúne os laboratórios que atuam no mercado brasileiro, lamentou o foco de febre aftosa no distrito de San Pedro, no Paraguai e comunicou que está acompanhando a situação da doença. "A febre aftosa no país vizinho é delicado. O governo brasileiro está tomando suas providências cabíveis junto ao governo paraguaio. E nós nos colocamos à disposição", diz Emílio Salani, presidente do sindicato que representa a indústria veterinária do Sindan. Em 2003, a entidade doou 500 mil doses de vacina contra a febre aftosa à Bolívia com o intuito de imunizar dos rebanhos nos municípios de fronteira.

Atualmente, no Brasil há 200 milhões de doses de vacinas contra aftosa. "O suficiente para atender ao seu rebanho", afirma. Conforme reunião recente do Comitê Veterinário Permanente do Conesul (CVP), no qual o Brasil preside, o país se colocou a ajudar o Paraguai com apoio operacional e de especialistas das áreas de epidemiologia, vigilância e diagnóstico laboratorial. De acordo com Salani, não se pode resolver apenas a questão da febre aftosa no Brasil, enquanto houver países limítrofes com a enfermidade. "Sem poder controlar totalmente a entrada de animais doentes, é necessária ação conjunta em toda América do Sul", afirma.

Do lado de lá

De acordo com o Senacsa, serviço nacional paraguaio, o aumento do número de casos de febre aftosa fez o governo declarar, no dia 04 de janeiro, o estado de emergência sanitária animal na região afetada. No dia 09 de janeiro, o país anunciou o sacrifício de mais de 154 cabeças de gado no distrito de San Pedro. No início do mês de fevereiro, o Paraguai deu o pontapé inicial e começou o primeiro período da campanha de vacinação contra a febre aftosa nos 150 mil animais dos municípios, onde os focos de febre aftosa foram detectados no final do ano passado. Por sua vez também, o governo paraguaio disse que pretende fazer um calendário único de vacinação para todo o país.

Segundo agências internacionais, o Paraguai, oitavo maior exportador mundial de carne bovina e com um rebanho de 12,5 milhões de cabeças, encontra-se em processo de estabilização de seus embarques, que haviam sido interrompidos de maneira preventiva em setembro passado. Desde 2004 o Paraguai era considerado um país livre de aftosa com vacinação, até que em setembro de 2011 se descobriu um foco da doença.

O mal que assola o rebanho

A febre aftosa é um mal à saúde humana é questionável ou quase insignificante. O fator preponderante, nesse caso, é a queda da produção dos animais e óbitos de animais jovens. De acordo com o médico veterinário e diretor Técnico da Ourofino, Marcus Rezende, entre os sinais clínicos observados em animais acometidos pela doença estão à febre e lesões na boca, gengivas e língua, como aftas (daí, então, o nome febre aftosa). "As feridas dificultam o animal de se alimentar e promovem o emagrecimento da rês. Além disso, há ocorrência de salivação e lesões entre os cascos", explica. "A febre aftosa é suscetível a todos os animais biungulados, principalmente bovinos e bubalinos. O vírus causador da doença pertence ao gênero Aftovirus da família Picornaviridae que tem sete sorotipos conhecidos (A, O, C, SAT1, SAT2, SAT3, Asia1). No Brasil e na América Latina os sorotipos comumente encontrados são O1 Campos, A24 Cruzeiro e C3 indaial, que formam a vacina trivalente comercializada no País", diz.

Ele lembra ainda que este vírus tem grande capacidade de propagação (pelo ar), podendo em poucas horas ser disseminado para mais de 300 km de distância. "Por isso a importância do respeito às áreas de isolamento que o Mapa exige quando ocorre o aparecimento de surtos", diz. Rezende lembra que a prevenção por meio da vacina, é sem dúvida a alternativa mais barata e eficiente no controle da doença. Neste caso, aponta ele, o país tem algumas fábricas de vacina mais modernas do mundo e produz um produto eficaz. "O estoque de segurança que o Mapa exige dos laboratórios produtores é suficiente para que o Brasil possa atender qualquer surto que supostamente venha a ocorrer". Em nome dos bons ventos do crescimento das exportações de carne, o país blinda o seu rebanho.

A cronologia da aftosa no País

A doença foi detectada na Itália, em 1514. No Brasil, o primeiro registro ocorreu em 1895, no Triângulo Mineiro. Como prevenção, o Mapa realiza ações desde 1934, quando foi publicado o Regulamento do Serviço de Defesa Sanitária Animal. Mas as instruções específicas para seu controle, que incluía a vacinação, foram definidas em 1950, e as campanhas organizadas tiveram início em 1965.

Os pioneiros nessa ação foram os estados do Rio Grande do Sul, que vacinou 2,07 milhões de bovinos, do total de 11,6 milhões, e o Paraná, que imunizou 3,8 mil bovinos, de 3,4 milhões de animais estimados na época.

Em 1976 foi registrado o maior número de focos da doença, com 10,2 mil casos. Desde abril de 2006, o Brasil não registra nenhum caso, sendo o último em Mato Grosso do Sul.


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