Edições Anteriores
FEIJÃO - Xô mosaico dourado!
rev 164 - outubro 2011

Feijão transgênico desenvolvido pela Embrapa resistente a este inimigo da lavoura é aprovado no Brasil. Trata-se da primeira planta transgênica totalmente produzida por instituições públicas a ser liberada.

A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) aprovou a liberação para cultivo comercial do feijão geneticamente modificado resistente ao vírus do mosaico dourado, pior inimigo da cultura no Brasil e na América do Sul.

Desenvolvido pela Embrapa, o feijão é a primeira planta transgênica aprovada comercialmente totalmente produzida por instituições públicas de pesquisa. Foram quase 10 anos de trabalho, numa parceria entre a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Cenargen e Embrapa Arroz e Feijão.

"Nos testes de campo realizados, mesmo com muita presença da mosca branca, inseto que transmite o vírus do mosaico, a planta transgênica não foi infectada pela doença", afirma Francisco Aragão, pesquisador do Cenargen e um dos responsáveis pelo projeto. A produção mundial de feijão é de mais de 12 milhões de toneladas. O Brasil ocupa o segundo lugar nesse ranking e a planta é produzida principalmente por pequenos agricultores, com cerca de 80% da produção e da área cultivada em propriedades com menos de 100 hectares. Uma vez que o vírus do mosaico dourado atinge a plantação ainda na fase inicial, pode causar perdas de até 100% na produção. Segundo estimativas da Embrapa Arroz e Feijão, os danos causados pela doença seriam suficientes para alimentar até 10 milhões de pessoas.

O feijão transgênico apresentou vantagens econômicas e ambientais, a exemplo da diminuição das perdas, a garantia das colheitas e a redução da aplicação de defensivos. Com a aprovação, as sementes transgênicas serão multiplicadas e devem chegar ao mercado em dois ou três anos. "Todas as análises de segurança foram realizadas e o feijão geneticamente modificado é tão ou mais seguro que as variedades convencionais, tanto para o consumo humano quanto para o meio ambiente", ressalta Aragão.

Os pesquisadores da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Francisco Aragão, e da Embrapa Arroz e Feijão, Josias Faria, utilizaram quatro estratégias de transformação genética. Em linhas gerais, eles modificaram geneticamente a planta para que ela produzisse pequenos fragmentos de RNA responsáveis pela ativação de seu mecanismo de defesa contra o vírus do mosaico dourado, devastador à lavoura. "Mimetizamos o sistema natural", diz Aragão. Além disso, os fragmentos de RNA podem causar resistência a várias estirpes do mesmo vírus.

Brasil vai exportar tecnologia

O primeiro feijão transgênico totalmente desenvolvido no Brasil é o primeiro passo para a independência tecnológica do Brasil e mostra que o País poderá ser um grande exportador de tecnologia de sementes geneticamente modificadas para o mundo em um futuro próximo, de acordo com a Associação Nacional de Biossegurança (ANBio).

"Em um momento de crise alimentar, quando o mundo tem cada vez mais necessidade na produção de alimentos, sementes mais seguras e eficientes são a melhor alternativa para garantir a boa produção das lavouras", afirma a pesquisadora Leila Oda, presidente da ANBio. "Além do potencial para prover alimentos para a população do planeta, o Brasil tem agora chance se consolidar como um dos principais exportadores de tecnologia na agricultura do mundo".

Alimento seguro

De acordo com Oda, o feijão transgênico da Embrapa é seguro para consumo humano e em nada difere do feijão tradicional, presente no prato dos brasileiros. "Todos os organismos geneticamente modificados produzidos no país são confiáveis, pois são analisados caso a caso antes da liberação, seguindo a Lei de Biossegurança brasileira, que é considerada referência e uma das mais rigorosas do mundo".

O Brasil é o maior produtor de feijão do mundo. Ele é um dos alimentos mais consumidos pelos brasileiros, e a principal fonte de proteína vegetal, ferro e inúmeras vitaminas, principalmente para as classes menos favorecidas. "Pesquisas que levem ao aumento da produtividade desse grão devem não só ser apoiadas, como serem motivo de orgulho para o Brasil", afirma.

Consea pede mais estudos

A CTNBio aprovou a liberação comercial do feijão transgênico no país com 15 votos a favor, duas abstenções e cinco diligências (pedidos por mais testes e pesquisas). O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) defendia um prazo maior para debates - ouvindo posições favoráveis e contrárias - e a ampliação de testes, estudos e pesquisas em todos os biomas e regiões do país.

O Consea não concorda com a liberação enquanto não houver a certeza de que o feijão geneticamente modificado não trará danos à saúde nem prejuízo à segurança alimentar da população. Um dado curioso é que a proposta foi aprovada no dia em que a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional completou cinco anos. "Foi a crônica de uma aprovação anunciada", lamentou Leonardo Melgarejo, representante do Ministério do Desenvolvimento Agrário na CTNBio.

Benefícios socioeconômicos

Para os que comemoraram a aprovação, ela "é a esperança para tornar o Brasil autossuficiente na produção do grão e democratizar o consumo do alimento em todas as classes da população. Ao contrario do que se imagina, mesmo sendo o maior consumidor de feijão do mundo, o País ainda não consegue abastecer todo o mercado interno, pois as doenças das lavouras trazem prejuízos irreversíveis aos agricultores. De acordo com Francisco Aragão, a produção interna insuficiente eleva os preços e faz com que, muitas vezes, as camadas mais pobres da população deixem de consumir o feijão, um dos alimentos mais ricos em fontes de proteína vegetal, ferro e vitaminas.

Inimigo antigo, e perigoso

O vírus do mosaico dourado é o maior problema para a cultura do feijão. "As perdas vão de 90 a 280 mil toneladas por ano. Se a doença atacar as lavouras precocemente, as perdas podem chegar até 100%". Alguns lugares do Brasil, inclusive, deixam de cultivar o feijão, pois não conseguem resistir aos prejuízos. "Com a semente geneticamente modificada, serão abertas novas áreas de produção, onde antes não era possível alcançar bons resultados", comemora, dizendo que "esse será um benefício para todos os produtores, mesmo os de pequenas propriedades". Ainda segundo o pesquisador, a lógica é que, com mais sementes de feijão transgênico disponíveis, mais o mercado interno estará abastecido. Assim, os preços ficam estabilizados e maior quantidade de pessoas pode consumir o alimento.


Edicões de 2011
Volta ao Topo
PROIBIDA A PUBLICAÇÃO DESSE ARTIGO SEM PRÉVIA AUTORIZAÇÃO DOS EDITORES