Revista
Rural - Qual o "peso" de assumir um cargo como esse,
que representa uma cadeia produtiva com grande destaque no
cenário internacional e com grande contribuição
para o PIB do nosso País?
Antonio Jorge Camardelli - Fui diretor executivo da Abiec
na gestão do ex-ministro Marcus Vinícius Pratini
de Moraes (2003-2008). Foi um período em que a carne
brasileira ganhou e conquistou os mercados com os quais trabalha
hoje. É preciso ter presente a necessidade de vencer
desafios, pois nossos agentes da cadeia produtiva da carne
bovina são os grandes merecedores do reconhecimento
de que o Brasil faz a diferença no mercado internacional.
Como presidente da Abiec estarei sempre pronto a ajudar a
alcançar patamares mais altos.
Rural - Ao assumir a presidência da Abiec, o Senhor
ressaltou que um dos desafios do setor seria procurar alternativas
para manter a competitividade em relação a outros
países. De que forma é possível conseguir
essa ação?
Camardelli - O Brasil possui todas as condições
de produzir carne com qualidade, sanidade e preço competitivo.
Hoje, estamos diante de uma situação adversa
em que o preço da matéria-prima está
muito alto. Ao longo dos últimos cinco anos, os frigoríficos
puderam se consolidar no mercado, pois o preço da arroba
do boi era muito competitivo. Agora é preciso fazer
com que a indústria se adapte a uma nova realidade.
Nosso desafio é fazer um trabalho para diminuir o custo
da produção.
Rural - O senhor também apontou que uma das plataformas
do seu mandato na entidade é buscar alternativas com
a União Europeia para os cortes nobres bovinos produzidos
no Brasil. Como pretende fazer isso?
Camardelli - A União Europeia foi, até fevereiro
de 2008, um mercado importante para o Brasil, principalmente
porque comprava cortes nobres em grande quantidade. Com a
decisão de limitar o número de fazendas habilitadas,
nossas exportações caíram para mais da
metade. Nosso objetivo é fazer com que as autoridades
europeias entendam que nos últimos dois anos a cadeia
produtiva fez a "lição de casa" e,
portanto, não há mais argumentos para limitar
nossas exportações. Vamos seguir na luta para
retomar o mercado europeu, que é muito importante.
Para isso, contamos com a ajuda fundamental dos ministérios
da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e das
Relações Exteriores. Sabemos que a situação
econômica da União Europeia está muito
delicada, mas nós importamos muitos produtos daquele
bloco e não impomos restrições. Comércio
exterior é uma via de mão dupla. Se cada vez
que um país ou a união de países tiver
uma crise e adotar o protecionismo como alternativa para sair
da crise, a economia mundial entra em colapso.
Rural - Hoje, é complicado para o Brasil cumprir
as exigências do mercado internacional?
Camardelli - O Brasil cumpre as exigências do mercado
internacional. Na verdade quando somos impedidos de vender
em algum mercado, é preciso perguntar ao país
que restringe nossa carne, porque ele não a compra.
Se o Brasil vende para mais de 150 países, há
mais de cinco anos e é o maior exportador do mundo,
nossas credenciais são mais do que conhecidas. Não
há registro na história do comércio mundial
de carne de qualquer episódio em que a carne brasileira
tenha causado mal aos rebanhos bovinos ou mesmo aos consumidores
nos mercados onde é comercializada.
Rural - Na sua opinião as exigências e certificações,
tais como a Globalgap, auxiliam o Brasil a derrubar as barreiras
sanitárias?
Camardelli - É preciso ficar claro que boa parte
das barreiras sanitárias nasceu em reuniões
cujo objetivo era criar alguma forma de protecionismo. O Brasil
já sofreu com barreiras tarifárias, mas como
se mostrou competitivo, conquistou mercado mesmo com tarifas
altas. Vieram as barreiras sanitárias. Governo, pecuaristas
e indústria se uniram para criar mecanismo de controle
sanitário. Estamos bem avançados nessa área.
Não existe risco zero, mas o Brasil deu um salto enorme
nas questões sanitárias. Agora, o novo nome
do protecionismo é sustentabilidade ambiental. A cadeia
produtiva da carne sabe dos seus problemas e tem feito o máximo
para resolvê-los. Não somos o maior do mundo
por acaso. Portanto, se qualquer país adotar medidas
protecionistas contra nossa carne, não há certificadora
que resolva. Agora, se jogarmos com regras claras, toda ajuda
será bem vinda.
Rural - Quais são os mercados que o Brasil ainda
pode explorar?
Camardelli - Apesar de vender para mais de 150 países,
o Brasil ainda está fora de mercados importantes como
Japão, Estados Unidos, Coreia do Sul e Taiwan. São
grandes consumidores, os quais devemos estar sempre atentos
e prontos a fechar um acordo sanitário.
Rural - Há pouco tempo, uma missão americana
veio inspecionar a carne brasileira e por sinal eles aparentemente
aprovaram. É possível em pouco tempo o Brasil
começar a exportar para os americanos?
Camardelli - O relatório preliminar das auditorias
do Serviço de Inspeção e Segurança
Alimentar (FSIS), do Departamento de Agricultura Norte-americano
(USDA), em frigoríficos de carne bovina apontou significativa
melhora na avaliação das garantias da certificação
de produtos brasileiros. O Mapa tem sido incansável
na busca da retomada da exportação de carne
processada para os Estados Unidos. Acredito que as vendas
para aquele país sejam retomadas em breve.
Rural - O senhor chegou a pouco da Rússia. Esse
país sinalizou uma certa confiança no Brasil.
A Abiec acredita que já é possível melhorar
as condições de entrada das carnes brasileiras
no mercado russo?
Camardelli - A Rússia é nosso maior importador.
É um excelente mercado. Quando entramos no mercado
internacional é ingenuidade acreditar que o jogo vai
ser fácil. A Rússia compra, em média,
US$ 1 bilhão por ano de carne do Brasil. É natural
que essas exigências sejam feitas. Cabe ao Brasil atendê-las
e até julgar se o negócio continua lucrativo.
Não conheço empresa que venda para ter prejuízo.
Rural - A expansão e a abertura de novos negócios
internacionais das empresas como o Marfrig e Friboi ajudarão
a melhorar a imagem do Brasil, no exterior? De que maneira?
Camardelli - São duas empresas com alto nível
tecnológico e produtos de qualidade reconhecida. Portanto,
a presença de empresas do porte dos dois frigoríficos
ajuda a construir uma imagem positiva da carne brasileira.
Rural - Na sua visão a febre aftosa é um
problema já resolvido?
Camardelli - Não há risco zero em epidemiologia.
Mas o Brasil é reconhecidamente o país que tem
o melhor trabalho de combate à febre aftosa. Num país
continental com rebanho perto de 200 milhões de cabeças
e cujo último foco foi há cinco anos, é
realmente de se comemorar. O Japão, que é um
país menor em extensão geográfica e com
rebanho pequeno, se comparado ao Brasil, notificou foco de
aftosa recentemente. É sempre bom lembrar que eles
não compram nossa carne porque o Brasil não
é livre de aftosa sem vacinação.
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