Revista
Rural - Com PORCENTAGEM dos votos, o Brasil elegeu FULANO
DE TAL, como governante do nosso País para os próximos
quatro anos. Na sua opinião, de que forma ELE (A) deverá
encarar e conduzir os assuntos relacionados ao agronegócio
levando em conta a importância do setor para o Produto
Interno Bruto (PIB) brasileiro?
Cesário Ramalho - Infelizmente, na fase inicial
da campanha, tanto no 1º quanto no 2º turno, notamos
que não houve por parte dos candidatos um debate efetivo
sobre a questão rural. É possível fazer
essa avaliação levando em conta as conversas
que tivemos com os presidenciáveis e, por isso, teremos
de trabalhar bastante para aumentar a participação
do agronegócio. É fundamental que nosso setor
debata, ouça e tenha algum poder para falar sobre as
políticas que serão feitas inclusive na área
ambiental. É lamentável que estivemos tão
fora das discussões. Levemente, vimos algum debate
sobre a questão da infraestrutura, da logística
e sobre o prejuízo que está causando a questão
cambial.
Rural - Mas o senhor acredita que há como reverter
essa situação?
Ramalho - A questão me preocupa, porque o que mais
o agronegócio precisa é conquistar um valor
político, similar à importância econômica
que ele detém. Não estamos conseguindo dar ao
setor essa valorização na mesma relação.
Quando falamos em economia, o agronegócio representa
cerca de 1/3 do PIB, tem fantástica representatividade
em volume de empregos, na balança comercial, por exemplo,
e nós não conseguimos expressar direito isso.
Ainda temos de trabalhar bastante para alertar essa importância
da produção rural no âmbito federal.
Rural - Nesse sentido, como os assuntos relacionados ao
campo foram tratados durante o mandato do presidente Lula?
Como analisa o desempenho rural e o que de fato mudou para
o produtor nesses anos?
Ramalho - Em um balanço geral, o mandato de Lula
tem fatores positivos e negativos. Infelizmente, as questões
estruturais internas da agricultura ficaram praticamente no
mesmo estágio de quando ele assumiu. Se nós
compararmos, tivemos uma renegociação bárbara
- no mandato (1995 a 2002) de Fernando Henrique Cardoso -
com prazo e juros bem adequados. Agora, terminamos o mandato
da gestão de Lula e as renegociações
são mínimas, estamos com uma dívida imensa
no setor. Avançamos muito pouco na questão da
infraestrutura que tanto impacta no agronegócio. Tivemos
vários cortes nas verbas que influenciaram, por exemplo,
em programas sanitários. Não conseguimos em
oito anos eliminar a febre aftosa do País. Poxa, vida!
É uma coisa primária, exterminar essa doença.
À sanidade, foi dada pouca importância. Temos
problemas em relação à questão
cambial, na saída desse governo, que é consequência
de uma má política extremamente alertada não
só pela comunidade agrícola, como por todas
as outras. Pagamos internamente os mais caros juros do mundo
e impostos por todos os programas estruturais, e não
temos o retorno disso. O governo Lula finaliza a gestão
dele deixando o agronegócio em uma situação
difícil, além do que já era na época
de FHC. Acentuou-se nessa gestão, porque houve incremento
na produção, as tecnologias foram aplicadas,
as produtividades aumentaram, o volume de grãos cresceu,
e isso criou o embaraço nas estradas e nos portos,
que não comportavam essa demanda. São questões
difíceis que o governo Lula não superou.
Rural - Externamente, qual é a imagem do Brasil?
Em uma entrevista no final de 2008, o senhor destacou a atuação
do atual presidente na prospecção de novos mercados
e o discurso de Lula sobre a questão dos biocombustíveis.
Nesse sentido, qual a sua visão sobre as relações
internacionais?
Ramalho - Lula focou muito em um marketing promocional
eleitoreiro. Conseguimos observar isso com o passar do tempo.
Em muitos fóruns quando ele defendeu o etanol, é
porque esse item deu ao Brasil e também a ele visibilidade.
É fato que o presidente foi um grande defensor na abertura
de mercados brasileiros e das carnes. Externamente, o governo
Lula foi razoável, mas deixou de cobrar, por exemplo,
do Ministério das Relações Exteriores,
o Itamaraty. Um exemplo disso, é que o próprio
ministro Celso Amorim foi frágil na questão
do subsídio do algodão aos Estados Unidos. Não
tivemos uma política agressiva. O Chile, por exemplo,
proibiu a carne brasileira, por que não proibimos a
entrada do vinho chileno no Brasil? É uma política
na qual não se criam grandes atritos. Foi uma política
bondosa, generosa, desde que ela sempre estivesse enaltecendo
a figura do presidente.
Rural - Levando em conta esse cenário, o quanto
realmente 'falta' para que o País alcance a posição
de celeiro mundial? Estamos muito distantes desse patamar?
Ramalho - Sou otimista quanto a isso.Temos sim muitos
problemas, mas somos um País adequado, com condições
climáticas favoráveis, competência extraordinária
de pesquisadores e espetacular do empresariado brasileiro,
que inova e renova assimilando tecnologias e, por tudo isso,
acredito que o Brasil vai crescer com toda certeza. Resta
agora o novo governo assumir. Como é que o setor rural
quer mudar o câmbio? Precisamos ter uma fórmula,
uma maneira na qual ou se arruma o câmbio ou dá
subsídio para o produtor rural, porque é impossível
produzir com essa disparidade monetária do jeito que
está e com todas essas dificuldades estruturais.
Rural - E o quanto pesam as questões do crédito
e seguro rural nesse contexto?
Ramalho - É preciso ampliar a questão do
seguro. Como é que vamos arrancar metade dos pomares
de laranjas paulistas sem termos um seguro? O pequeno e o
médio produtor necessitam do seguro. Tivemos infelicidades
climáticas fantásticas na safra 2008/2009, na
qual perdemos aproximadamente 25% da safra de grãos
do Paraná, por exemplo. Fica a pergunta: Quem é
que pagou por isso? O seguro ajuda o produtor a crescer e
faz com que o setor receba mais recursos. Se a agricultura
tiver renda e seguro, ela não precisa de um crédito
rural. O crédito chega, e se o Brasil deixar de ser
um recordista mundial de juros e passar a ter um juro igual
no mundo, o dinheiro vai chegar ao setor. O crédito
rural acaba servindo para cobrir as ineficiências estruturais
do País, que o governo Lula não teve competência
para arrumar, não teve entusiasmo para resolver. Faltou
motivação, interesse político e do governante,
que tem de ter entendimento de um país maior, de repente,
isso é uma questão ideológica. O presidente
da República tem de ser um homem grande, um homem maior
do que tudo. Estamos falando do maior setor do País
e temos de dar a ele a devida importância pelo tamanho
que tem.
Rural - Diante de tudo isso, qual tem sido o papel da SRB
como representante da classe? Quais são as principais
ações feitas pela entidade no momento?
Ramalho - Estamos constantemente em atividade nos mais
variados sentidos. Realizamos e frequentamos fóruns,
apresentamos artigos publicados em veículos diversos
veículos do País, a exemplos dos jornais O Estado
de São Paulo, Folha de São Paulo e Correio Brasiliense.
Estamos permanentemente noticiando as dificuldades todas do
setor. Temos contato com a bancada ruralista no Congresso,
subsidiando ela, informando-a sobre esses entraves que temos.
Procuramos fazer com que a sociedade entenda a importância
da agricultura. Temos um relacionamento perfeito com todas
as entidades do setor, apoiando a todas indiscriminadamente.
Rural - Na sociedade falta esse entendimento?
Ramalho - No nosso discurso, ressaltamos que o brasileiro
precisa ter um carinho pela agricultura, respeito e, acima
de tudo, tem de ter orgulho dela, que é extremamente
profissionalizada, técnica e que privilegia a sustentabilidade.
O agronegócio brasileiro, hoje, para continuar a crescer,
não mais precisa derrubar mais nenhuma árvore.
Ele vai crescer pelo conhecimento, pela tecnologia, pela inteligência
que temos buscado nos pesquisadores, nos mais variados órgãos
de pesquisa, a exemplo da própria Embrapa.
Rural - Hoje, quais são os números da SRB?
Ramalho - Isso tudo é uma complexidade. A entidade
tem em torno de 2.500 sócios aproximadamente e procuramos
interagir com cada um deles. Temos um grupo de 12 diretores,
20 conselheiros e 21 departamentos. Então, uma forma
da entidade permanecer em contato com eles é pela comunicação
por meio do suporte que temos de nossa diretoria, conselho,
entre outros. Evidentemente, não é possível
conversar com cada um dos nossos sócios, por isso,
vamos a campo no interior, por várias regiões
brasileiras e contatando um presidente de associação
aqui, um diretor de entidade ali. Assim vão se formando
as demandas.
Rural - A entidade a qual o senhor preside tem mais de
90 anos de existência. É uma história
que cresce junto com a do agronegócio brasileiro?
Ramalho - Com certeza absoluta, nesses 91 anos de existência
nós temos ajudado a contar a história do setor
no Brasil. Dela saíram três ex-ministros de Estado
da agricultura, Paulo de Moraes Barros, Renato da Costa Lima
e Roberto Rodrigues. O atual secretário da agricultura
do Estado de São Paulo, João Sampaio, foi o
presidente da entidade antecessor ao meu mandato. Já
tivemos ao longo da nossa história mais de dez secretários
da agricultura de São Paulo e vários diretores
nossos foram para entidades importantes do setor. Dentro da
entidade nasceram uma série de coisas, a exemplo da
Associação Brasileira do Agronegócio
(Abag), do Fundo de Desenvolvimento da Pecuária do
Estado de São Paulo (Fundepec). Surgiram também
as grandes questões dos subsídios internacionais
do açúcar e do álcool, a Federação
das Associações Rurais do Mercosul (Farm), entre
outras. Na constituinte de 1988, fundamos um órgão
especialmente para avaliar e propor sugestões envolvendo
vários grupos empresariais nacionais, entidades e associações.
Juntos, apresentamos um número significativo de trabalhos
aos constituintes dos mais variados setores, como o trabalhista,
de fomento, fundiário e agrário. Por tudo isso,
uma parte da agricultura brasileira com certeza passou pela
SRB. Com abrangência nacional, somos a entidade dos
grandes temas do Brasil, que pensa na agricultura de amanhã
e faz isso com objetivo de evitar um incêndio e não
de apagá-lo.
Rural - Quais são os objetivos de vocês?
Ramalho - O que queremos é proteger o agricultor
e a agricultura brasileira, de uma forma ampla. E quando falo
todos, engloba a defesa do micro, do pequeno, do médio,
do grande, do mega produtor e do trabalhador rural, em suas
questões trabalhistas, de segurança e etc. Defendemos
o produto rural brasileiro, o complexo de cada item, passando
desde os insumos que são usados na lavoura, pelo trabalho
de produção, pela indústria, comércio
internacional, o embarque, etc. Tudo o que de alguma forma
impacta nos segmentos do agronegócio estamos defendendo.
Rural - O senhor assumiu a presidência em 2006. Além
de filho, o senhor é neto e bisneto de agricultores.
Fale um pouco da sua 'relação' com esse meio.
Ramalho - Isso é uma coisa fácil... Eu nasci
e fiquei um bom tempo na fazenda. Minha família é
do campo, da região do Triângulo Mineiro (MG)
e a vida inteira, apesar de ser estudante, sempre estava ali
ouvindo, falando e conversando sobre as coisas do campo, sobre
a produção rural. Hoje tenho a alegria de ver
o Brasil sendo importante nesse setor e a sociedade respeitando
mais o produtor. Uma coisa que eu sempre ouvi desde que nasci
era o meu avô dizer que o Brasil é um País
agrícola e que precisamos dar importância a isso
e, até que enfim, chegou o dia! Estamos começando!
Em um futuro breve da agricultura, resolvendo essas questões
estruturais, o Brasil vai seguir crescendo. Estamos lutando
insana e intensamente para minimizar o problema do agricultor.
E quando falamos em agricultor o que mais se prejudica sempre
é o pequeno.
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