Revista
Rural No início deste ano, a indústria
de defensivos agrícolas no Brasil apontava para um
cenário de recuperação do setor em 2010.
As estimativas indicavam um crescimento na economia mundial,
incluindo um saldo positivo para o País, com um Produto
Interno Bruto (PIB) em torno de 5% e 6%. Essa expectativa
realmente se confirma? Há uma recuperação
para as indústrias do setor?
Eduardo Daher Sim. Há uma expectativa de
crescimento do setor para 2010 de aproximadamente 4% sobre
a receita de 2009. Porém, esse resultado pode ser avaliado
como recuperação, pois houve um recuo de 7%
nas vendas do ano passado, caindo de US$ 7,1 bilhões
para US$ 6,6 bilhões, sendo o segmento de herbicidas
o mais afetado. Considerando que as culturas que mais demandam
defensivos estão tendo um bom desempenho, a perspectiva
até o momento é positiva.
Rural Em 2010, os números também confirmaram
uma queda generalizada nos preços dos produtos, favorecendo
a relação de troca do agricultor. As cestas
de defensivos, por exemplo, em outubro de 2009, registraram
decréscimo nos preços concorrentes (entre 0,3%
e 18,9%) em comparação a 2008. Essa queda ainda
é continua? Poderemos prever alta dos preços
até o final do ano?
Daher Esses números são baseados
no estudo realizado pelo Instituto de Economia Agrícola
(IEA), vinculado à Secretaria da Agricultura de São
Paulo. Contrariando todas as tendências de alta de preços
de insumos básicos verificadas mundialmente, o setor
de defensivos agrícolas no Brasil tem mostrado, nos
últimos anos, queda generalizada nos preços
de produtos. É o que mostram os dados do IEA. Os resultados
foram colhidos no Estado de São Paulo, mas podem ser
estendidos às outras regiões do País,
já que o Estado responde pelo maior índice,
20%, de todo o consumo de defensivos agrícolas do Brasil.
No estudo do comportamento de preços corrigidos de
79 defensivos analisados, entre 2003 e 2009, verificou-se
queda contínua e acentuada de abril de 2005 a abril
de 2008, quando atinge o menor patamar do período.
Em abril de 2009, comparado com o início do período
(abril de 2003), os preços corrigidos ficaram, em média,
40% inferiores.
Rural Hoje quais são as oportunidades no
mercado de defensivos brasileiros?
Daher O mercado de defensivos só tende a
crescer no Brasil. A cada ano, ainda são descobertas
novas doenças e pragas e, com a aceleração
das mudanças climáticas, a tendência é
que isso aumente ainda mais. O trabalho de pesquisa realizado
pelas indústrias de defensivos será ainda mais
essencial no futuro, contribuindo com o desenvolvimento de
novas tecnologias agrícolas. Para se ter uma ideia
da importância desses insumos no campo, a Organização
das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação
(FAO), atesta que a tecnologia de controle de pragas evita
a redução, em média, de 38% na produção
dos alimentos. Portanto, sem aplicação de inseticidas,
herbicidas, fungicidas e acaricidas na proteção
das lavouras, o País colheria menos cerca de 40%, isto
é, cerca de 58 milhões de toneladas na safra
atual.
Rural Em outubro do ano passado, a China enviou
representantes do conselho das indústrias químicas
para avaliar o mercado de defensivos brasileiro. Essa visita
foi para estreitar negócios com o Brasil ou teve algum
interesse especial?
Daher O agronegócio brasileiro tem exibido
desempenho magnífico e isso chama a atenção
dos demais países, tanto daqueles que concorrem diretamente
na produção de alimentos, como os Estados Unidos,
como daqueles que dependem da produção brasileira.
Este é o caso da China, um dos maiores demandantes
das nossas commodities. Por isso, as autoridades e empresas
chinesas olham com atenção para o setor como
um todo, em seus diversos segmentos produtivos. Por exemplo,
têm sido divulgadas notícias das aquisições
que empresas daquele país vêm fazendo em terras
agricultáveis no Brasil. Quanto ao setor de defensivos
agrícolas, as 15 empresas que atuam no País
em pesquisa, desenvolvimento e produção, representadas
pela Andef, vêem com naturalidade este interesse. O
nosso mercado de defensivos agrícolas adota os padrões
internacionais e é rigorosamente regulamentado. Para
que uma única nova molécula se torne o produto
herbicida, fungicida, inseticida ou acaricida
as empresas associadas da Andef pesquisam e desenvolvem em
laboratórios e estações experimentais,
durante cerca de dez anos, um volume entre 300 mil e 400 mil
moléculas. Esse trabalho científico consome
vultosos aportes de capital, entre US$ 200 milhões
e US$ 300 milhões. Somente os estudos toxicológicos
e ambientais respondem por cerca de 60% deste valor. Portanto,
aquelas novas companhias, de quaisquer países, que
se adequarem a essa rígida legislação
e trouxeram ao País investimentos diretos na pesquisa
e produção, serão bem recebidos.
Rural Recentemente, vimos que a Andef teve de dar
alguns esclarecimentos à imprensa. Segundo fiscalizações
da Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa), foi apontada uma não conformidade no uso
de componentes (aditivos e ingredientes inertes) utilizados
na formulação de alguns produtos. O que de fato
aconteceu?
Daher Ocorreram apenas alterações
na composição de formulações registradas.
A Anvisa apenas comparou documentos para constatar que os
produtos vinham sendo fabricados com componentes ou em quantidades
diferentes daquelas aprovadas no registro. Porém, o
órgão não levou em consideração
as mudanças inerentes ao processo produtivo, determinando
a interdição temporária de produtos,
pelo prazo de até 90 dias. As modificações
nas formulações ocorrem com frequência,
por diversas razões: indisponibilidade, alterações,
melhor performance, maior eficiência no processo produtivo,
segurança, entre outras. Na realidade, os fatos devem-se,
em grande parte, por uma deficiência da legislação
em vigor, que não trata especificamente das alterações
de componentes (ingredientes inertes e aditivos) nas formulações.
A necessidade de regulamentação específica
quanto às alterações de componentes nas
formulações de longa data vem sendo apontada
ao governo federal, pela indústria, e, de forma ainda
mais insistente, desde o início do atual processo de
fiscalizações, a partir de julho de 2009. Até
o momento, porém, não foi apresentada uma solução
definitiva ao problema.
Rural A Andef divulgou, publicamente, em janeiro
deste ano, o posicionamento assinado em conjunto com outras
entidades do setor de defensivos agrícolas, no qual
solicitou ao governo federal que publique uma normatização
sobre algumas alterações, de modo a estabelecer
critérios e procedimentos harmonizados que venham solucionar
a questão. Houve alguma resposta positiva a respeito?
Daher Reuniões conjuntas tem sido feitas
com o intuito de se esclarecer e obter avanços no tema
que trata da alteração na formulação
de componentes. Há uma proposta de Instrução
Normativa, que está sendo analisada, e esperamos que
em breve se alcance um consenso. Ao mesmo tempo, há
outras solicitações do setor que continuam em
pauta, como a necessidade de agilizar os registros de novos
ingredientes ativos. Com as fortes demandas mundiais para
o agronegócio brasileiro, a chave da competitividade
são as inovações.
Rural Na sua opinião, as novas tecnologias
que estão entrando no mercado não estão
sendo absorvidas, ou melhor dizer, catalogadas pelos órgãos
fiscalizadores?
Daher Elas são catalogadas, mas não
com a eficiência que a necessidade do mercado exige.
As análises de um produto passam por três ministérios
no Brasil, antes de receber o registro que permite a comercialização:
Agricultura, Saúde (por meio da Anvisa) e Meio Ambiente
(por meio do Ibama). Esse rigor é importante e deve
permanecer, até que companhias não capacitadas
deixem de atuar no mercado. O problema é que a lei
concede o período de até 120 dias para que esses
laudos sejam liberados, mas esperamos em média, atualmente,
cerca de 16 meses. E enquanto ele não é liberado
para o mercado, o agricultor tem uma opção a
menos para trabalhar com rotatividade nas lavouras ou mesmo
tratar novas doenças.
Rural Em maio foi veiculada uma matéria,
no Jornal Nacional (TV Globo), sobre o estudo da Academia
Americana de Pediatria, na qual apontava que a substância
organofosforado (grupo de compostos químicos amplamente
utilizados em agropecuária como inseticidas) poderia
causar o transtorno de Déficit de Atenção
Hiperativa. A Andef imediatamente tomou às devidas
providências de esclarecimento, na condição
de uma das entidades representativas do setor, para opinar
a respeito do tema. Houve algum retorno positivo quanto a
essa ação? De fato o que faltou a esclarecer
à população?
Daher Esclarecer a população é
de extrema importância, quando matérias com esse
viés sensacionalista são veiculadas na mídia.
Neste caso, por exemplo, a reportagem não tinha depoimentos
de cientistas, apenas relatava superficialmente sobre o estudo.
Focalizou o uso de organofosforados apenas na agricultura,
o que não é verdade. Ele também é
usado em residências, como composição
de diversos produtos, onde há contato com toda a família,
enquanto no campo seu uso é rigorosamente restrito.
Além disso, os produtos formulados a partir desse insumo,
no Brasil, representam apenas 3,4% dos defensivos do País.
Sobre o estudo, os próprios autores consideraram tratar-se
de apenas uma hipótese, mas o alarde pode causar receios
na população sem justificativas. Afinal, especialistas
afirmam que não há evidências científicas
de que, quando os defensivos são usados corretamente,
causam efeito à saúde dos agricultores e consumidores.
Rural Neste ano, algumas reportagens mostraram o
contrabando e o mercado ilegal dos defensivos agrícolas.
O que está sendo feito para deter esse tipo de operação,
que chega no Brasil por meio das fronteiras?
Daher O trabalho para deter o contrabando de defensivos
é realizado pelo Sindicato Nacional da Indústria
de Produtos para Defesa Agrícola (Sindag), em conjunto
com órgãos públicos de fiscalização
e segurança. Eles têm um programa importantíssimo
de capacitação aos fiscais de ministérios,
no combate ao comércio ilegal de defensivos, além
da comunicação direta ao agricultor, sobre o
risco e as consequências de se adquirir produtos ilegais.
O agricultor precisa se conscientizar que, ao invés
de levar vantagem, ele é sempre o grande prejudicado;
tanto no prejuízo que tem ao usar na lavoura um produto
falsificado, sem a menor garantia, quanto nas consequências
do crime, que é passível de prisão.
Rural Nos dias de hoje, se fala tanto em agricultura
moderna aliada à sustentabilidade. É possível
disponibilizarmos de tecnologia que melhorem a produtividade
agrícola e reduza os impactos sobre o meio ambiente?
De que forma?
Daher As tecnologias desenvolvidas pelas indústrias
de defensivos têm exatamente este objetivo, de proteger
as culturas de doenças e pragas, garantindo ao agricultor
a produtividade máxima que as sementes são capazes
de oferecer. Em termos de contribuição para
a agricultura brasileira, vê-se que a adoção
de tecnologias de base genética (sementes e mudas)
e química (fertilizantes e defensivos) está
diretamente ligada ao crescimento da produção
de grãos. A informação é comprovada
no relatório Organização dos mercados
de insumos e suas relações com a agricultura,
realizado pelo Centro de Conhecimento em Agronegócios
(Pensa), vinculado à Universidade de São Paulo.
Segundo o estudo, nos últimos 20 anos, a produção
aumentou em mais de 100% resultante do incremento tanto da
área cultivada quanto da produtividade, elevada em
mais de 60%.
Rural Que ações socioambientais estão
sendo levadas ao campo pela entidade?
Daher A Andef desenvolve diversas atividades de
sustentabilidade e educação desde sua criação.
Para se ter uma ideia, há 23 anos já era realizada
uma iniciativa com enfoque na agricultura sustentável,
o Sistema Integrado de Manejo na Produção Agrícola
Sustentável (Simpas), que leva conhecimentos técnicos
em manejo integrado de culturas aos profissionais de ciências
agrárias. Outra ação é o Prêmio
Andef de Mérito Fitossanitário, que neste ano
teve a 13ª edição. Ele reúne os
principais projetos de responsabilidade social, ambiental
e de uso correto de produtos, desenvolvidos pelas empresas
associadas à entidade.
Rural Em dezembro de 2009, a Andef lançou
um programa de educação e de conscientização
sobre a importância da agricultura e da defesa vegetal
para o desenvolvimento sustentável. Qual é o
objetivo deste programa?
Daher Trata-se do Eco Vegetal, lançado em
parceria com o Instituto Ambiental do Paraná (IAP)
e a Secretaria do Meio Ambiente do Estado do Paraná
(Sema/PR). O objetivo do programa é mostrar a importância
da agricultura para o País e disseminar informações
sobre as boas práticas agrícolas e sustentabilidade.
O interessante é que envolve tanto o público
adulto quanto as crianças, e acaba se tornando algo
bem divertido, com teatro e músicos que improvisam
canções sobre o assunto. Por isso chamamos de
Mostra Cultural. No Paraná, ele foi realizado em três
cidades e, este ano, em São Paulo, foi levado à
Agrishow, em Ribeiro Preto (SP).
|