Vermes
parasitas [calma, que não é nenhum insulto]
referem-se a uma distinta categoria de agentes que
ora são classificados como insetos, dentro da Entomologia,
ora são destacados como a doença em si. Trata-se
dos nematóides, um tipo de verme bem pequeno
alguns chegam a ser microscópicos mas que em
grande volume podem frear qualquer lavoura. O habitat dele
é o solo, e é nas raízes das plantas
que encontra todo o alimento para garantir a multiplicação
dele. Não chegam a infectar uma área completamente,
mas onde ocorre, em reboleiras, podem dar cabo de toda a produção.
Em média acredita-se que chegam a causar perdas de
5% a 10%.
Variadas são as espécies existentes no Brasil,
e todas bem distribuídas em todas as regiões
produtoras. No caso da soja, há cinco principais
Meloidogyne javanica e Meloidogyne incognita (ambos causadores
da meloidoginose, ou simplesmente, nematóides de galhas);
Heterodera glycines (nematóide de cisto); Rotylenchulus
reniformis (nematóide reniforme); e, por fim, Pratylenchus
brachyurus (nematóide das lesões radiculares).
À medida que o agricultor vai fazendo o monocultivo
de variedades suscetíveis, a população
deles vai aumentando no solo, então eles começam
a causar danos na soja, pondera o especialista em nematóides
e pesquisador da Embrapa Soja, Waldir Pereira Dias. Qualquer
um desses, a exemplo também da ferrugem, podemos dizer
que são parasitos obrigatórios. Se tirássemos
o alimento deles, eles poderiam morrer de fome, e, assim acabaríamos
com praticamente 95% a 99% da população de nematóides.
No entanto, Dias aponta que o grande problema para o controle
dessa classe de patógenos do solo está no uso
intensivo da terra. Para maiores ganhos, o produtor faz a
soja como a safra de verão e o milho, a de inverno,
na maioria das vezes. Se por um lado ele garante melhores
rendimentos, por outro, acaba criando um sistema favorável
à multiplicação desses vermes.
Descanso
A ideia primordial de manejo, seja para qualquer uma das cinco
espécies, é o estabelecimento de um descanso
do solo, ou seja, deixar de cultivar a soja no período
de verão, e instalar, no caso, uma cultura que conferisse
resistência ou mesmo uma que não seja hospedeira
do nematóide, assim, impedindo-o de se multiplicar.
Chegando a cerca de 12 meses sem o alimento, a população
cai, e aí na próxima safra, o agricultor pode
voltar a fazer o plantio da soja.
Provavelmente quem for um ativo sojicultor esteja agora repudiando
a ideia de ter de parar com a produção mais
rentável que há no País, em termos de
grãos; e não é por menos, pois a soja
é a commodity que chega ter o escoamento mais rápido
entre todas as outras produzidas no campo logo que
é colhida, é praticamente embarcada aos portos
para a exportação.
Se prejuízo é o que se nota em curto prazo,
a médio e a longo, a análise que se faz é
que a fórmula tem resultados positivos para quem quer
conter o crescimento populacional dos nematóides, além
de fortalecer o solo com incremento de nitrogênio (N)
e, ainda, favorecer o desenvolvimento de demais espécies
inimigas desses parasitos, que acabariam controlando-os de
forma mais eficaz.
Agora, quando eu faço só a sucessão,
explica Dias, ou seja, quando eu só planto culturas
não hospedeiras na safrinha esse tempo é
muito curto. Seriam quatro a cinco meses, no máximo,
seis meses sem soja. Além disso, nessa época
a temperatura é mais baixa e o solo está muito
seco, e isso não contribui para que a população
de nematóide caia o suficiente para se evitar danos
na safra de verão.
Agricultura de precisão
Para lidar com esses agentes de doenças é necessário
que o produtor os conheça previamente bem. Nesse sentido,
o pesquisador da Embrapa Soja destaca a adoção
da ferramenta de agricultura de precisão para obtenção
de melhores rendimentos na lavoura, justamente para a aplicação
no controle de nematóides.
Através de uma análise laboratorial de amostragem
do solo e de raízes de soja, o produtor saberá
qual das espécies ocorre em maior número e se
elas ocorrem uma, duas ou todas as cinco simultaneamente a
cada talhão, por exemplo.
Quem não tem notado nematóide numa área,
tem de procurar não ter para não gastar depois
para contê-lo, destaca Dias. Tirando os
cinco principais, praticamente todos os demais existem na
maioria das propriedades do País. Com o mapeamento
dos talhões se identifica quais espécies ocorrem,
e só aí é que o agricultor poderá
tomar a decisão da forma de controle adequada, pois
para cada uma há uma forma específica de manejo,
e o produtor não pode generalizar. É preciso
tratar os nematóides individualmente, alerta.
Diante da safra de verão, quando for identificada a
presença de M. javanica, M. incognita, Heterodera glycines,
Rotylenchulus reniformis ou Pratylenchus brachyurus, só
se poderá tomar as providências na safra de verão
seguinte. Nesse sentido o produtor terá de fazer o
uso de integração de tecnologias para conter
o crescimento populacional de nematóides que se baseia
em rotação de culturas e a utilização
de cultivares de soja resistentes.
Nematóides de galhas
M. incognita e M. javanica são as espécies mais
importantes para a cultura da soja no Brasil este último
possui ocorrência generalizada, enquanto que o primeiro
predomina em áreas cultivadas anteriormente com café
ou algodão.
No caso da rotação, por exemplo, se for
M. javanica é relativamente fácil fazê-la,
porque tem muito milho à venda no mercado que tem resistência,
e ainda posso colocar o algodão, porque ele também
não irá se multiplicar, atesta.
No entanto, se a ocorrência maior for de M. incognita,
tanto o algodão como o milho já não poderão
ser utilizados para compor a rotação, pois permitirão
que essa espécie se multiplique.
Há mais ou menos umas 100 cultivares de soja no País
que possuem um grau de resistência ao nematóide
de galhas. Mas, segundo o pesquisador da Embrapa Soja, essa
característica não é para os dois ao
mesmo tempo. Nesse sentido tem de se analisar bem qual é
a que deve ser usada, conforme a ocorrência dessas pragas
do solo.
Nematóide de cisto
Heterodera glycines se difere dos demais, segundo Dias, porque
não é nativo do Brasil foi introduzido
lá por volta da safra de 1991 ou 1992. Por ele ser
muito específico da soja e de poucas leguminosas, torna-se
fácil estabelecer uma rotação, pois a
gama de hospedeiros dele é muito restrita.
Estima-se que a área infectada por essa espécie
no País seja superior a três milhões de
hectares, de acordo com estudos da Embrapa Soja, entretanto,
existem muitas propriedades isentas do patógeno, localizadas
em municípios considerados infestados. Assim, a prevenção
ainda é importante.
Avaliações sobre o impacto do cultivo de espécies
botânicas, de verão, não hospedeiras de
H. glycines (arroz, algodão, sorgo, mamona, milho e
girassol) na população do nematóide,
mostraram que a substituição da soja por uma
delas, por uma safra, reduz a população a nível
que permite o retorno da soja na safra seguinte, na maioria
das condições.
Nematóide reniforme
O algodão é a cultura mais afetada por Rotylenchulus
reniformis. Entretanto, dependendo da cultivar e da população
do nematóide no solo, também podem ocorrer danos
na cultura da soja. A partir do final da década de
1990, esta espécie, segundo estudos da Embrapa, vem
aumentando em importância na cultura da soja, em especial
na porção centro-sul de Mato Grosso do Sul.
Já é considerado um dos principais problemas
da cultura em Maracajú e Aral Moreira e está
disseminado em outros 19 municípios sul-mato-grossenses.
Estima-se que, atualmente, o nematóide ocorra em altas
densidades populacionais em municípios que respondem
por 29% da área cultivada com soja no Estado.
No verão, a rotação pode ser feita com
milho, arroz, amendoim e braquiária esta última
com potencial de utilização num esquema de Integração
Lavoura-Pecuária (ILP). Das plantas cultivadas no outono/inverno
e utilizadas como coberturas em sistemas de semeadura direta,
são resistentes a braquiária, o nabo forrageiro,
o sorgo forrageiro, a aveia preta, o milheto e o capim pé
de galinha. Cultivares resistentes de soja deverão
também compor este manejo de controle ao nematóide.
Nematóide das lesões radiculares
Pratylenchus brachyurus talvez seja a espécie que mais
esteja causando danos às lavouras do País, pelo
fato de ser a grande esfomeada de todas se alimenta
de várias culturas, inclusive espécies gramíneas,
o que limita o produtor na hora de se pensar num sistema de
rotação para conter esse mal.
Por que esse nematóide se tornou tão importante?
indaga Dias, ao que ele responde É
que o agricultor atualmente faz o plantio de soja muito cedo,
aí colhe lá em dezembro e janeiro. Daí
já entra logo com o milho no mesmo dia que colhe a
soja. Nisso, o nematóide faz uma ponte de uma cultura
para outra. Ele se aloja na raiz do milho. Passa o inverno
e ele não morre. Na hora que o agricultor plantar a
próxima safra de soja, ele adiantará essa colheita
para poder entrar com o milho mais cedo. Isso faz com que
a lavoura sempre pegue uma alta população de
nematóides no solo. É o que sempre falo... Se
mesmo P. brachyurus fizer uma greve de fome, o agricultor
nunca vai deixar porque este sempre estará dando comida
ao nematóide.
Algumas espécies de Crotalárias, um tipo de
forrageira que funciona como um adubo verde, é o que
serviriam no caso de uma rotação, pois são
praticamente imunes a P. brachyurus, e, além de controlá-lo,
esse adubo verde auxiliaria na fixação de N
no solo. A questão mais pesarosa e a que mais
conta, na visão do agricultor é que a
planta não oferece nenhum atrativo econômico.
Recomendações
O convívio com essa categoria de vermes do solo terá
de ser a prática do agricultor, em detrimento às
características de algumas espécies. Nesse sentido
o produtor terá de estabelecer as práticas de
adoção do sistema de rotação e
o uso prioritário de espécies que atribuam certa
resistência para cada nematóide se realmente
o que se quer é por o fim a disseminação
desses parasitos.
O diagnóstico é de extrema importância
para isso. Deve ser feito num laboratório de nematologia.
De acordo com o pesquisador da Embrapa Soja, o período
ideal para a coleta de amostras de solo e de raízes
de soja se dá ao florescimento da planta até
mesmo próximo à colheita, com foco sempre nas
áreas que apresentarem os sinais dos nematóides.
No caso da rotação, ela não precisa ser
feita necessariamente em toda área. Ao longo das safras,
é possível fazer a divisão dos talhões
os que realmente mereçam a atenção,
se confirmado a infestação. Daí, pode
se fazer uma gradual rotação, ano a ano, para
beneficiar o solo e contribuir para a redução
populacional desses parasitos.
Uma prática válida, visto que é pela
ação do homem que o nematóide se espalha
mais pela área cultivada, seria que o plantio fosse
feito primeiramente das áreas sadias e, por último,
as que estão infectadas. Atenção também
ao cultivo de espécies forrageiras, pois, pelas sementes,
pode-se trazer nematóides a áreas sadias.
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