A
mesma situação se repetiu em vários outros
municípios de Mato Grosso do Sul, que destinavam sua
produção de milho a outras cidades das Regiões
Norte e Nordeste. Se o preço do milho no Nordeste
girava em torno de R$ 14, como é que se chega lá
com outro, com o custo de frete, ao preço, por exemplo,
de R$ 44?, indaga o economista e consultor rural, Leonardo
Lúcio Amorim Mussury, de Dourados (MS). Quem
pagou essa remoção? Não foi a Companhia
Nacional de Abastecimento (Conab)? Quem pagou o milho na época
de R$ 12 a R$ 18, não foi a Conab? Então estou
presumindo que a Conab pagou R$ 44 a saca de milho para entregá-lo
lá no Nordeste. Isso é um absurdo!, exclama
o especialista sobre a política de logística
e de realocação de grãos nos armazéns
brasileiros adotada pela empresa estatal, ligada ao Ministério
de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
O estopim de toda essa polêmica sobre o milho começaria
com o resultado final da safra 2007/2008, na qual os estoques
do grão saltaram de 2,5 milhões de t para 11,3
milhões. As safras seguintes se mantiveram nesse patamar,
e agora o excesso do grão prejudica os preços
e abarrota os armazéns do País já
não há quase mais espaço para comportar
tanto milho. Sem uma demanda interna capaz de consumir todo
o grão produzido e muito menos uma demanda externa
interessada pela compra, restou ao governo federal realocar
a produção para haver espaço às
novas safras de grãos que é justamente
às chamadas remoções, organizadas pela
Conab.
Trajeto inverso
Para Mussury, já que a remoção tem de
ser feita, o ideal seria fazê-la entre regiões
mais próximas. No entanto, prevaleceu a escolha pelo
trajeto mais longo. A Conab tirou o produto de Mato
Grosso do Sul para levar para o Nordeste, pagando um pouco
mais de R$ 400 a tonelada, e tirou o produto de Mato Grosso
e mandou para o Paraná. Ora, qualquer leigo sabe que
de Mato Grosso do Sul para o Paraná é muito
mais perto do que de Mato Grosso para o Paraná.
Assim, também seria mais prático e menos oneroso,
a remoção de milho de Mato Grosso para as Regiões
Norte e Nordeste, por estarem mais próximos.
Hora errada
Outro problema causado pelas remoções de milho
foi o atraso ou a escolha mais inadequada para se fazê-las
de janeiro a março deste ano. Nessa mesma época,
a soja tinha de ser escoada aos portos ou mesmo para as indústrias.
Isso ocasionou o encarecimento do frete em cerca de 50%
pelo menos foi o que ocorreu em MS. Segundo Mussury, o frete
que se pagaria em fevereiro, com destino a Paranaguá
(PR), em torno de R$ 100 a tonelada, chegou-se ao custo de
R$ 150 sobre a mesma quantidade. Esta diferença
foi em função de uma demanda muito forte por
frete, e acabou sobrando no preço do produtor, reduzindo
mais ainda a margem dele.
Incentivo a preços mais baixos
Apesar de todo excesso do grão no País, o governo
optou por aumentar o preço mínimo. Segundo a
Conab, nas Regiões Sul e Sudeste, além do Distrito
Federal e dos Estados de Mato Grosso do Sul e Goiás,
a saca saía de R$ 16,50 para R$ 17,46. Nos Estados
de Mato Grosso e Rondônia, o valor da saca, que era
de R$ 13,2 passou para R$ 13,98. Já nas Regiões
Norte (exceto Rondônia e Acre) e Nordeste, o preço
mínimo do milho que era de R$ 19, na safra 2008/2009,
passou para R$ 20,10 na safra 2009/2010. Se você
já vem atravessando duas ou três supersafras
de milho, com os armazéns abarrotados de milho, sem
ter lugar para armazenar tanto milho, seria hora de você
elevar preço mínimo? Você eleva preço
mínimo para estimular o produtor a plantar, mas quando
você tem excedente de produto não justifica aumentar
preço mínimo... E o que acontece agora? Se eleva
o preço mínimo, existe então uma superprodução
de milho, ninguém sabe para onde vai tanto milho, e
a Conab não garante o programa dela que é de
garantir o preço mínimo, porque não tem
recursos para isso, conclui Mussury.
Explicações
Foram necessários um mês e sete dias, entre conversas
com técnicos e representantes tanto da Conab como do
Mapa, para conseguir alguma explicação. E ambos
concordam houve atraso no repasse de verbas para serem
efetuadas as remoções.
No entanto algumas justificativas foram genéricas,
como por exemplo, o porquê de ter se optado pela logística
mais longa de transporte dos grãos. Segundo, Sílvio
Farnese, coordenador geral de Cereais e Culturas Anuais do
Mapa, a logística se justificou, primeiro, pela necessidade
de se esvaziar armazéns em regiões de grande
produção de grãos; e segundo, por atendimento
a necessidades operacionais ou mesmo por exigência judicial.
Quando há a necessidade de remoção
para atender a programas institucionais do governo, a Conab
interage as duas necessidades visando equalizar os custos
evitando, em vários casos, o retardamento das remoções
por falta de alternativa para armazenar em outros Estados
mais próximos, declara Farnese mas se
a ideia era evitar custos, mesmo assim projetou-se o caminho
mais longo.
Um argumento um pouco mais plausível foi dado por Paulo
Roberto Muniz de Carvalho, da Superintendência de Armazenagem
e Movimentação de Estoques (Suarm) da Conab.
A remoção liberaria armazéns que estivessem
com baixo nível de carga. Um exemplo dado foi sobre
uma unidade armazenadora que tem capacidade para 35 mil t
e estava ocupada com apenas oito mil. Calcula-se que
com esta providência foram abertos espaços no
Estado de Mato Grosso para aproximadamente 700 mil t, com
a retirada de 298 mil t dos estoques do governo, e 450 mil
t, com a remoção de 161 mil t dos estoques da
Conab de Mato Grosso do Sul, contabiliza Carvalho. Ao
todo são 17.247 armazéns espalhados pelo Brasil
e que comportam cerca de mais de 133,4 milhões de toneladas.
Um número que o governo estima crescer em virtude de
créditos disponibilizados para a safra 2010/2011
a soma, que não é exclusiva para setor de armazenagem,
gira em torno de R$ 3 bilhões.
Outra situação, que contribuiu para o milho
sul-mato-grossense fosse para as Regiões Norte e Nordeste,
foi a favor do Programa de Venda em Balcão, da própria
Conab, que tem como objetivo atender micro e pequenos criadores
que não tem como adquirir milho em grãos pelos
demais mecanismos de vendas do governo federal, e muito menos
comprar o produto nas regiões produtoras do insumo
nesse caso então, quem pagará pelo milho
mais caro (R$ 44 reais a saca) será justamente àqueles
não têm como pagar.
Já em relação ao aumento do preço
mínimo do milho, Farnese diz que eles foram reajustados,
considerando à época de sua elaboração,
os custos de plantio e as condições de mercado,
inclusive o mercado externo, que viabilizavam o reajuste ocorrido.
Quanto ao encarecimento do frete, não houve uma justificativa
sequer.
Os fretes mais caros que o milho (valor por saca)
São
Gabriel dOeste (MS) a Boa Vista (RR)
Distância 3.641 km
R$ 38,06
Dourados
(MS) a Maracanau (CE)
Distância 3.327 km
R$ 33,75
Bonito
(MS) a Açú (RN)
Distância 3.495 km
R$ 29,37
Bonito
(MS) a Russas (CE)
Distância 3.382 km
R$ 29,35
Ao
todo, foram 31.550 toneladas de milho que foram removidas
e que tiveram um custo de frete superior a R$ 23. Um gasto
de R$ 14.485.173.
Distribuição
de capacidade dos armazéns pelo Brasil (em toneladas)
Total 133.473.068 100,00%
Região Norte 2.408.595 1,80%
Região Nordeste 10.380.104 7,78%
Região Centro-Oeste 46.460.746 34,81%
Região Sul 53.404.669 40,01%
Região Sudeste 20.818.954 15,60%
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