Revista
Rural No mês de maio, a ExpoZebu demonstrou alguns
projetos com o foco na sustentabilidade. Na sua opinião,
por que este é um dos temas hoje mais abordados em
todas as cadeias produtivas e qual a relevância do agronegócio
nesse cenário?
José Olavo Borges Mendes A ExpoZebu é
toda realizada dentro de um projeto sustentável, que
inclui reciclagem de resíduos, uso racional da água
e plantio de árvores. É preciso deixar claro
que a sustentabilidade não deve ficar restrita às
cadeias produtivas. O produtor não pode ser considerado
o grande e único causador das agressões ao meio
ambiente. O crescimento desordenado de muitas cidades brasileiras
é uma ameaça à preservação
dos rios. O lixo, por exemplo, é outro grande problema
das cidades e que causa grande impacto ao meio ambiente, porém
as pessoas preferem ficar com o discurso de que o produtor
rural é o vilão dessa história. É
preciso valorizar o campo. O agronegócio é um
setor de grande impacto positivo na economia nacional. Sabemos
que não basta contribuir economicamente. A produção
precisa ser de forma sustentável para que no futuro
continuemos tendo condições de produzir alimento
para o mundo. A cadeia produtiva do agronegócio tem
consciência disso e vários segmentos, como é
o caso da pecuária, já desenvolvem projetos
sustentáveis.
Rural De que forma a ABCZ analisa a questão
da pecuária sustentável? O que o País
necessita realmente fazer dentro e fora da porteira para se
alinhar a esse tema?
Mendes A ABCZ vem buscando há alguns anos
unir a ciência à produção de carne,
leite e genética, pois somente com dados científicos
poderemos superar as suposições baseadas em
dados inconsistentes sobre o impacto da pecuária no
meio ambiente. Durante as últimas edições
da ExpoZebu, realizamos o Simpósio de Pecuária
Sustentável para apresentar estudos relevantes sobre
o tema. Um dado importante divulgado este ano é que
o Brasil foi o país que mais reduziu a emissão
de metano entre 1988 e 2007. A recuperação de
pastagens degradadas poderá contribuir também
significativamente, pois, além de evitar que novas
áreas sejam abertas para produção de
alimentos, ajuda no sequestro do carbono. Além de debater
o tema, a associação vem vivenciando a sustentabilidade
na prática.
Rural E por falar nisso, a produção
pecuária no Brasil tem sido apontada como uma das maiores
causadoras da emissão de gases de efeito estufa (GEEs).
Tecnicamente, quais os mitos e verdades que essa acusação
esconde?
Mendes Entre os dez maiores exportadores de carne
do mundo, o Brasil foi o que mais baixou emissões de
metano entérico por quilo de carne produzida nos últimos
20 anos. Isso foi comprovado durante o estudo coordenado pelos
professores Paulo Mazza e Paula Meyer que calculou a taxa
média anual de crescimento das estimativas de produção
de metano, entre 1961 e 2007. O País apresentou a maior
taxa de crescimento de produção de carne e mesmo
assim conseguiu ter o valor negativo mais baixo para a taxa
de crescimento das emissões de metano por unidade de
produto, medida pela divisão entre o quilo de metano
e o quilo de carne. Esses dados comprovam que não somos
os vilões da história. E à medida que
os criadores brasileiros forem investindo mais em genética
para aumentar a produtividade por animal, poderemos reduzir
ainda mais as emissões de metano.
Rural E qual tem sido a contribuição
da entidade no fomento desse conceito? De que forma tem trabalhado
junto à cadeia produtiva?
Mendes Além dessas ações desenvolvidas
durante a ExpoZebu, também participamos de grupos de
discussão, como, por exemplo, o Grupo de Trabalho da
Pecuária Sustentável que reúne
ambientalistas, a cadeia produtiva, bancos, setor varejista.
Outra ação importante tem sido democratizar
a genética zebuína de qualidade, fazendo com
que pequenos e médios produtores tenham acesso a animais
geneticamente superiores. Com isso, as pequenas propriedades
poderão produzir mais, em menor tempo e utilizando
a mesma área. Pesquisas sobre o tema são divulgadas
regularmente nos meios de comunicação da ABCZ,
site, revista, programa de TV, blog e twitter, para que o
produtor possa se informar melhor sobre o tema.
Rural Neste ano, os pecuaristas pediram a revisão
do Código Florestal. O que vocês esperam dessa
proposta?
Mendes A revisão do Código Florestal
precisa ser feita com base em dados científicos e de
forma racional. A proposta ainda tramita na Câmara dos
Deputados. O relatório do deputado Aldo Rebelo contempla
pontos, como: os pequenos produtores (com propriedades de
até quatro módulos rurais) fiquem isentos da
reserva legal em suas fazendas; a responsabilidade de delegar
a respeito das áreas de reserva legal que ficará
a cargo dos Estados; os médios e grandes proprietários
poderão fazer compensações em áreas
de preservação coletiva, a serem definidas pelo
Estado. Esperamos que as alterações no Código
não limitem a produção de alimentos,
o que traria enormes prejuízos ao Brasil.
Rural No assunto política, a ABCZ também
falou em algumas entrevistas sobre reivindicações
importantes do setor em prol do desenvolvimento da pecuária
brasileira para o futuro presidente. Que reivindicações
foram feitas?
Mendes Não podemos aceitar que o agronegócio,
setor de grande relevância para a economia nacional,
ainda sofra com invasões de terra, com um código
florestal que limita o crescimento da produção
de alimentos, com a falta de investimentos em logística
e tantos outros problemas. Na parte de meio ambiente, nos
preocupa o fato do produtor rural ser obrigado a arcar praticamente
sozinho com os custos de uma produção ecologicamente
correta. É preciso ainda encontrar uma solução
para o problema da falta de crédito rural e do endividamento
do setor, que vem se arrastando desde a década de 1980.
Diante da necessidade de desenvolver uma pecuária sustentável,
o financiamento precisa contemplar outras áreas como,
por exemplo, a abertura de linhas de crédito para recuperação
de pastagem. A segurança no campo também deve
ser garantida, coibindo as invasões de terra, pois
esse tipo de ação desrespeita o direito de propriedade
e traz prejuízos ao sistema produtivo. Outro ponto
considerado fundamental para o crescimento do setor é
a sanidade. É preciso dar continuidade ao programa
de erradicação da febre aftosa do governo atual
e ampliar os recursos destinados ao combate à doença.
Há necessidade de maior empenho do governo federal
nas revisões dos protocolos sanitários com países
que são considerados mercados importantes para genética
bovina, animais vivos, carne e leite.
Rural Na Feicorte 2010 vocês debatem assuntos
relevantes para a pecuária como Aftosa - Futuro
do Programa de Erradicação, promovido
pelo Conselho Nacional de Pecuária de Corte (CNPC).
O que vocês pretendem com essa ação?
Mendes A carne brasileira deixa de ser exportada
para mercados que pagam mais, como, por exemplo, o Japão,
devido ao fato de ainda não termos erradicado a febre
aftosa. Muitas vezes os países usam uma questão
sanitária para impor barreiras, que na verdade são
econômicas. Daí a necessidade de erradicar a
doença. Só assim teremos acesso a todos os mercados.
Temos um custo de produção bem menor que nossos
principais concorrentes. Comparado aos Estados Unidos, o custo
brasileiro chega a ser 66% menor. Por outro lado, o preço
pago pela arroba no Brasil deixa o produtor com uma margem
de lucro muito pequena. Só com investimentos para aumentar
a produtividade poderemos oferecer ao mercado um produto de
maior qualidade e atender as exigências de mercados
que pagam mais pela carne.
Rural
Uma das mais recentes parcerias da ABCZ com o Governo
de Minas Gerais foi a criação do Polo de Excelência
Genética Bovina. Como está a evolução
deste projeto e quais são as perspectivas para o futuro?
Mendes O Pólo de Excelência em Genética
Bovina atua de forma conjunta com seu Comitê Gestor,
composto por 21 entidades representativas, incluindo instituições
de pesquisa, universidades, empresas públicas, e a
ABCZ, que vem trabalhando em parceria em projetos articulados
pelo Polo. Um dos projetos é a Análise
do Genoma de Zebuínos Leiteiros com Sequenciamento
de Nova Geração para Prospecção
de Marcadores SNP, a ser realizado pela Embrapa Gado
Leite, em parceria também com a Universidade Federal
de Minas Gerais e outras instituições de pesquisa.
Um valor total de R$ 2,5 milhões em recursos já
foi destinado aos projetos apoiados. Atualmente, o Pólo
também vem desenvolvendo ações em prol
de seu acesso aos mercados nacional e internacional, junto
ao Pró-Genética da ABCZ e à Brazillian
Cattle, na definição de missões internacionais
para divulgação da genética do melhoramento
animal mineiro e brasileiro. Vale lembrar que em 2003 a entidade
criou o projeto Brazillian Cattle para divulgar as raças
zebuínas no exterior e incentivar as exportações
de produtos agropecuários. Com o apoio da Apex-Brasil,
o consórcio participa de várias negociações
para revisão de protocolos sanitários com países
interessados na importação da genética
zebuína brasileira. Em 2009, as empresas do projeto
exportaram um total de cem milhões de dólares.
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