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DEDO DE PROSA - Moacir Micheletto (PMDB-PR)
rev 148 - junho 2010

“Não acho justo avaliar o Código Florestal de uma maneira maniqueísta impondo conflitos entre ambientalistas e ruralistas. O maior interessado em preservar o meio ambiente é o próprio agricultor, porque ele vive na terra e dela vive”.

“Só não participou quem não teve interesse nessas discussões. Agimos da maneira mais transparente e democrática possível”

A reserva legal tem de ser mantida com percentuais estabelecidos para cada um dos biomas: 20% na Mata Atlântica, 35% no Cerrado e 80% na Amazônia; as propriedades rurais de até quatro módulos fiscais (o módulo varia de um a 100 hectares, dependendo da região), área da agricultura familiar estão dispensadas de manter a reserva legal.

No dia 08 de junho, uma Comissão Especial que discute mudanças no Código Florestal Brasileiro apresentou, no plenário da comissão, um parecer ao Projeto de Lei nº 1876/99. O documento mantém a obrigatoriedade de manutenção da chamada Reserva Legal em um percentual de 20% na Mata Atlântica, 35% no Cerrado e 80% na Amazônia. Com o tema em discussão, o deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR), engenheiro agrônomo e administrador rural, concedeu neste mês uma entrevista à Fátima Costa. Ele fala sobre as modificações, resoluções do Código Florestal Brasileiro, das propostas feitas e sobre a votação que promete gerar muita polêmica.

Revista Rural – Desde 1965, quando foi criado, o Código Florestal Brasileiro passou por diversas modificações feitas por meio de leis, portarias, instruções normativas, resoluções e medidas provisórias. Por que somente agora o relatório da Comissão Especial para as mudanças no Código Florestal segue para a votação? Isso não poderia ter ocorrido antes?
Moacir Micheletto
– Não. E explico o porquê. O presidente da Câmara Federal, deputado Michel Temer (PMDB-SP), em setembro do ano passado, teve a clarividência de criar esta comissão especial, da qual fui indicado presidente, e o deputado Aldo Rebelo (relator), justamente para colocar uma ordem nessa confusão em que se tornou a legislação ambiental brasileira. É bom lembrar que existem cerca de 16 mil leis entre decretos, portarias, instruções normativas, resoluções e outras normas editadas ao longo dos anos por diferentes órgãos, como o Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Agricultura, secretarias estaduais de Agricultura, do Meio Ambiente e outros tantos. Por tudo isso, era necessário trazer para dentro do Congresso Nacional o debate e as discussões de um tema tão importante para a sociedade brasileira em geral e o setor produtivo em particular.

Rural – Mediante a esses fatos, quando acontecerá a votação?
Micheletto
– Nós da comissão especial para reforma do Código Florestal estamos empenhados em aprovar o mais breve possível. Acredito que ainda neste semestre, o relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), seja encaminhado ao Plenário da Câmara Federal para votação e aprovação. Neste sentido, há um compromisso do presidente Michel Temer em colocá-lo em votação para posterior sanção do presidente da República.

Rural – Quais são as expectativas da apresentação do relatório sobre as mudanças no Código Florestal?
Micheletto
– Estamos otimistas, mas sabemos das dificuldades em aprová-lo ainda neste semestre por se tratar de um tema por demais polêmicos. O que quero dizer é que não dá mais para continuar com essa “esdrúxula” e complicada legislação ambiental. Você não imagina o transtorno que ela tem trazido para os produtores. É preciso reconciliar a legislação com a realidade e às necessidades do País. É esse o objetivo da reforma que estamos propondo.

Rural – Quais os principais pontos que o novo Código Florestal propõe ao produtor?
Micheletto
– Não somente ao produtor, aquele que vive da agricultura, mas também aquele que vive na cidade. E no novo Código vai conter leis que dizem respeito ao meio urbano também. Posso citar aqui, em resumo, as propostas que geraram mais polêmicas e que foram consideradas novidades no relatório. Por exemplo, por um período de cinco anos, não será permitido o desmatamento de novas áreas de mata nativa para pecuária e plantios; áreas consolidadas até julho de 2008 terão as multas e demais sanções aplicadas suspensas; cada unidade da federação terá autonomia para definir sua legislação sobre o meio ambiente, desde que atenda os princípios definidos pela Constituição Federal; a reserva legal tem de ser mantida com percentuais estabelecidos para cada um dos biomas: 20% na Mata Atlântica, 35% no Cerrado e 80% na Amazônia; as propriedades rurais de até quatro módulos fiscais (o módulo varia de um a 100 hectares, dependendo da região), área da agricultura familiar estão dispensadas de manter a reserva legal. Haverá restrições para lavouras em encostas de morros cuja inclinação tenha entre 25 e 45 graus. As áreas de preservação permanente em regiões urbanas serão definidas por meio de leis municipais. Em resumo, é isso.

Rural – Até junho, o deputado Aldo Rebelo garantiu que o texto segue para a votação na comissão para analisar as propostas. Isso é possível, mesmo no período de recesso eleitoral e início da campanha eleitoral?
Micheletto
– Essa é a nossa disposição. Mas aqueles que se apresentam contrários ao parecer apresentado pelo deputado Rebelo podem se utilizar de recursos regimentais e adiar a sua aprovação. Eles se apresentam sempre contrários a qualquer atualização das normas ambientais.

Rural – É verdade que os ambientalistas defendem uma discussão mais ampla e fora do período eleitoral? Na sua opinião, por que eles defendem essa questão?
Micheletto
– Sinceramente não. Sei porque eles querem postergar a aprovação do relatório. Não tem o menor sentido defender uma discussão mais ampla. A comissão especial promoveu em 22 Estados, em Brasília, e em todos os biomas cerca de 63 audiências públicas. Foram ouvidas as organizações não-governamentais estrangeiras e nacionais, a Embrapa, as universidades, as autoridades dos órgãos ambientais da União, de Estados e municípios, governadores, prefeitos, vereadores, agricultores, grandes, médios e pequenos, sindicatos e entidades de classe, como a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, a Organização das Cooperativas Brasileiras e tantas outras.

Rural – Algumas reportagens mostram que como presidente da Comissão Especial do Código Florestal, o deputado é contra a publicação de um decreto presidencial tratando de mudanças na legislação ambiental? Por quais motivos?
Micheletto
– Pelo simples motivo de que é a Câmara Federal e o Senado Federal que devem legislar. A competência para tratar deste assunto é do Congresso Nacional. Esta comissão especial está trabalhando exaustivamente neste tema desde setembro do ano passado quando foi criada. E estamos agora na reta final. Por isso, não vejo motivos para publicação de decreto ou qualquer outra norma.

Rural – Entre as principais alterações que esse novo texto propõe estão a autorização do plantio em áreas já consolidadas de várzeas, no topo de morros e em encostas e a compensação de reflorestamento da reserva legal obrigatória em outras áreas? Na sua opinião, o quanto isso impacta em perdas ao produtor?
Micheletto
– Perdas? Que perdas? Pelo contrário, na minha opinião representa ganhos para o produtor rural.

Rural – Na sua opinião, como é possível mudar essa imagem que o produtor é o vilão? E por que somente o produtor é o culpado, uma vez que o senhor já mencionou que não vê contradição entre a produção agrícola e a preservação ambiental?
Micheletto
– Não acho justo avaliar o Código Florestal de uma maneira maniqueísta impondo conflitos entre ambientalistas e ruralistas. O maior interessado em preservar o meio ambiente é o próprio agricultor, porque ele vive na terra e dela vive. Se você comparar os levantamentos de safra agrícola nos últimos anos verá que o agricultor brasileiro aumentou significamente a produção, mantendo, praticamente, mesma área plantada. Não é conveniente para os agricultores destruírem o meio ambiente. Eles precisam da biodiversidade e do ecossistema para garantir a produtividade e o rendimento de sua atividade. Esta visão é um artifício utilizado pelas organizações ambientalistas que querem atrapalhar os avanços do setor produtivo. Não existe uma contradição entre a produção agrícola e a preservação ambiental, o que existe é uma contradição com a legislação que criminaliza o agricultor. Pode, sim, haver mais produção com mais proteção.

Rural – O que na verdade os ruralistas propõem?
Micheletto
– Estamos propondo o que está no relatório do deputado Aldo Rebelo. Mudanças na legislação ambiental, cujo Código Florestal está vigorando desde 1965. Além disso, o setor produtivo não tem condições de cumprir e conviver com essas 16 mil leis hoje vigentes no Brasil. Os brasileiros precisam de políticas bem equilibradas para promover o desenvolvimento econômico e social com um mínimo de dano ao meio ambiente. A agricultura e a pecuária brasileiras já mostraram sua eficiência, alcançando altos índices de produtividade, e proporcionando ao mercado interno comida farta e barata, das mais baratas do mundo, além de contribuir como grande exportadora.

Rural – O assunto acirra a rixa entre ambientalistas, que lutam pelo cumprimento da legislação, e ruralistas, que julgam impossível cumpri-la sob pena de o País não produzir alimentos suficientes e deixar um milhão de pequenos produtores sem trabalho. Diante desta situação, que ações estão sendo realizadas para ouvir tanto um lado quando o outro?
Micheletto
– A comissão especial buscou o equilíbrio entre o setor produtivo e os ambientalistas. Ambos os lados foram ouvidos nas audiências públicas. Só não participou quem não teve interesse nessas discussões. Agimos da maneira mais transparente e democrática possível. Um dos críticos do nosso trabalho é o deputado Sarney Filho, do PV do Maranhão. Ele sequer participou da audiência pública promovida em seu próprio Estado.

Rural – É possível buscar o consenso e o bom senso para que a nova legislação ambiental e que ela seja fruto do entendimento? O que é possível fazer para que isso aconteça?
Micheletto
– É exatamente isso que buscamos desde o início de nossos trabalhos. Nossa proposta é balizada pelos interesses mais amplos do País.


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