Não
acho justo avaliar o Código Florestal de uma maneira
maniqueísta impondo conflitos entre ambientalistas
e ruralistas. O maior interessado em preservar o meio ambiente
é o próprio agricultor, porque ele vive na terra
e dela vive.
Só
não participou quem não teve interesse nessas
discussões. Agimos da maneira mais transparente e democrática
possível
A reserva legal tem de ser mantida com percentuais estabelecidos
para cada um dos biomas: 20% na Mata Atlântica, 35%
no Cerrado e 80% na Amazônia; as propriedades rurais
de até quatro módulos fiscais (o módulo
varia de um a 100 hectares, dependendo da região),
área da agricultura familiar estão dispensadas
de manter a reserva legal.
No
dia 08 de junho, uma Comissão Especial que discute
mudanças no Código Florestal Brasileiro apresentou,
no plenário da comissão, um parecer ao Projeto
de Lei nº 1876/99. O documento mantém a obrigatoriedade
de manutenção da chamada Reserva Legal em um
percentual de 20% na Mata Atlântica, 35% no Cerrado
e 80% na Amazônia. Com o tema em discussão, o
deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR), engenheiro agrônomo
e administrador rural, concedeu neste mês uma entrevista
à Fátima Costa. Ele fala sobre as modificações,
resoluções do Código Florestal Brasileiro,
das propostas feitas e sobre a votação que promete
gerar muita polêmica.
|
|
Revista
Rural Desde 1965, quando foi criado, o Código
Florestal Brasileiro passou por diversas modificações
feitas por meio de leis, portarias, instruções
normativas, resoluções e medidas provisórias.
Por que somente agora o relatório da Comissão
Especial para as mudanças no Código Florestal
segue para a votação? Isso não poderia
ter ocorrido antes?
Moacir Micheletto Não. E explico o porquê.
O presidente da Câmara Federal, deputado Michel Temer
(PMDB-SP), em setembro do ano passado, teve a clarividência
de criar esta comissão especial, da qual fui indicado
presidente, e o deputado Aldo Rebelo (relator), justamente
para colocar uma ordem nessa confusão em que se tornou
a legislação ambiental brasileira. É
bom lembrar que existem cerca de 16 mil leis entre decretos,
portarias, instruções normativas, resoluções
e outras normas editadas ao longo dos anos por diferentes
órgãos, como o Ministério do Meio Ambiente,
Ministério da Agricultura, secretarias estaduais de
Agricultura, do Meio Ambiente e outros tantos. Por tudo isso,
era necessário trazer para dentro do Congresso Nacional
o debate e as discussões de um tema tão importante
para a sociedade brasileira em geral e o setor produtivo em
particular.
Rural Mediante a esses fatos, quando acontecerá
a votação?
Micheletto Nós da comissão especial
para reforma do Código Florestal estamos empenhados
em aprovar o mais breve possível. Acredito que ainda
neste semestre, o relatório do deputado Aldo Rebelo
(PCdoB-SP), seja encaminhado ao Plenário da Câmara
Federal para votação e aprovação.
Neste sentido, há um compromisso do presidente Michel
Temer em colocá-lo em votação para posterior
sanção do presidente da República.
Rural Quais são as expectativas da apresentação
do relatório sobre as mudanças no Código
Florestal?
Micheletto Estamos otimistas, mas sabemos das dificuldades
em aprová-lo ainda neste semestre por se tratar de
um tema por demais polêmicos. O que quero dizer é
que não dá mais para continuar com essa esdrúxula
e complicada legislação ambiental. Você
não imagina o transtorno que ela tem trazido para os
produtores. É preciso reconciliar a legislação
com a realidade e às necessidades do País. É
esse o objetivo da reforma que estamos propondo.
Rural Quais os principais pontos que o novo Código
Florestal propõe ao produtor?
Micheletto Não somente ao produtor, aquele
que vive da agricultura, mas também aquele que vive
na cidade. E no novo Código vai conter leis que dizem
respeito ao meio urbano também. Posso citar aqui, em
resumo, as propostas que geraram mais polêmicas e que
foram consideradas novidades no relatório. Por exemplo,
por um período de cinco anos, não será
permitido o desmatamento de novas áreas de mata nativa
para pecuária e plantios; áreas consolidadas
até julho de 2008 terão as multas e demais sanções
aplicadas suspensas; cada unidade da federação
terá autonomia para definir sua legislação
sobre o meio ambiente, desde que atenda os princípios
definidos pela Constituição Federal; a reserva
legal tem de ser mantida com percentuais estabelecidos para
cada um dos biomas: 20% na Mata Atlântica, 35% no Cerrado
e 80% na Amazônia; as propriedades rurais de até
quatro módulos fiscais (o módulo varia de um
a 100 hectares, dependendo da região), área
da agricultura familiar estão dispensadas de manter
a reserva legal. Haverá restrições para
lavouras em encostas de morros cuja inclinação
tenha entre 25 e 45 graus. As áreas de preservação
permanente em regiões urbanas serão definidas
por meio de leis municipais. Em resumo, é isso.
Rural Até junho, o deputado Aldo Rebelo garantiu
que o texto segue para a votação na comissão
para analisar as propostas. Isso é possível,
mesmo no período de recesso eleitoral e início
da campanha eleitoral?
Micheletto Essa é a nossa disposição.
Mas aqueles que se apresentam contrários ao parecer
apresentado pelo deputado Rebelo podem se utilizar de recursos
regimentais e adiar a sua aprovação. Eles se
apresentam sempre contrários a qualquer atualização
das normas ambientais.
Rural É verdade que os ambientalistas defendem
uma discussão mais ampla e fora do período eleitoral?
Na sua opinião, por que eles defendem essa questão?
Micheletto Sinceramente não. Sei porque
eles querem postergar a aprovação do relatório.
Não tem o menor sentido defender uma discussão
mais ampla. A comissão especial promoveu em 22 Estados,
em Brasília, e em todos os biomas cerca de 63 audiências
públicas. Foram ouvidas as organizações
não-governamentais estrangeiras e nacionais, a Embrapa,
as universidades, as autoridades dos órgãos
ambientais da União, de Estados e municípios,
governadores, prefeitos, vereadores, agricultores, grandes,
médios e pequenos, sindicatos e entidades de classe,
como a Confederação Nacional dos Trabalhadores
na Agricultura, Confederação da Agricultura
e Pecuária do Brasil, a Organização das
Cooperativas Brasileiras e tantas outras.
Rural Algumas reportagens mostram que como presidente
da Comissão Especial do Código Florestal, o
deputado é contra a publicação de um
decreto presidencial tratando de mudanças na legislação
ambiental? Por quais motivos?
Micheletto Pelo simples motivo de que é
a Câmara Federal e o Senado Federal que devem legislar.
A competência para tratar deste assunto é do
Congresso Nacional. Esta comissão especial está
trabalhando exaustivamente neste tema desde setembro do ano
passado quando foi criada. E estamos agora na reta final.
Por isso, não vejo motivos para publicação
de decreto ou qualquer outra norma.
Rural Entre as principais alterações
que esse novo texto propõe estão a autorização
do plantio em áreas já consolidadas de várzeas,
no topo de morros e em encostas e a compensação
de reflorestamento da reserva legal obrigatória em
outras áreas? Na sua opinião, o quanto isso
impacta em perdas ao produtor?
Micheletto Perdas? Que perdas? Pelo contrário,
na minha opinião representa ganhos para o produtor
rural.
Rural Na sua opinião, como é possível
mudar essa imagem que o produtor é o vilão?
E por que somente o produtor é o culpado, uma vez que
o senhor já mencionou que não vê contradição
entre a produção agrícola e a preservação
ambiental?
Micheletto Não acho justo avaliar o Código
Florestal de uma maneira maniqueísta impondo conflitos
entre ambientalistas e ruralistas. O maior interessado em
preservar o meio ambiente é o próprio agricultor,
porque ele vive na terra e dela vive. Se você comparar
os levantamentos de safra agrícola nos últimos
anos verá que o agricultor brasileiro aumentou significamente
a produção, mantendo, praticamente, mesma área
plantada. Não é conveniente para os agricultores
destruírem o meio ambiente. Eles precisam da biodiversidade
e do ecossistema para garantir a produtividade e o rendimento
de sua atividade. Esta visão é um artifício
utilizado pelas organizações ambientalistas
que querem atrapalhar os avanços do setor produtivo.
Não existe uma contradição entre a produção
agrícola e a preservação ambiental, o
que existe é uma contradição com a legislação
que criminaliza o agricultor. Pode, sim, haver mais produção
com mais proteção.
Rural
O que na verdade os ruralistas propõem?
Micheletto Estamos propondo o que está no
relatório do deputado Aldo Rebelo. Mudanças
na legislação ambiental, cujo Código
Florestal está vigorando desde 1965. Além disso,
o setor produtivo não tem condições de
cumprir e conviver com essas 16 mil leis hoje vigentes no
Brasil. Os brasileiros precisam de políticas bem equilibradas
para promover o desenvolvimento econômico e social com
um mínimo de dano ao meio ambiente. A agricultura e
a pecuária brasileiras já mostraram sua eficiência,
alcançando altos índices de produtividade, e
proporcionando ao mercado interno comida farta e barata, das
mais baratas do mundo, além de contribuir como grande
exportadora.
Rural O assunto acirra a rixa entre ambientalistas,
que lutam pelo cumprimento da legislação, e
ruralistas, que julgam impossível cumpri-la sob pena
de o País não produzir alimentos suficientes
e deixar um milhão de pequenos produtores sem trabalho.
Diante desta situação, que ações
estão sendo realizadas para ouvir tanto um lado quando
o outro?
Micheletto A comissão especial buscou o
equilíbrio entre o setor produtivo e os ambientalistas.
Ambos os lados foram ouvidos nas audiências públicas.
Só não participou quem não teve interesse
nessas discussões. Agimos da maneira mais transparente
e democrática possível. Um dos críticos
do nosso trabalho é o deputado Sarney Filho, do PV
do Maranhão. Ele sequer participou da audiência
pública promovida em seu próprio Estado.
Rural É possível buscar o consenso
e o bom senso para que a nova legislação ambiental
e que ela seja fruto do entendimento? O que é possível
fazer para que isso aconteça?
Micheletto É exatamente isso que buscamos
desde o início de nossos trabalhos. Nossa proposta
é balizada pelos interesses mais amplos do País.
|