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CANA - Bons ventos passam no canavial
rev 148 - junho 2010

Apesar de toda a cautela, o setor sucroalcooleiro vive um 2010 de retomada de negócios. Muitos estão de olho na elevação dos preços e outros à espera da sinalização do mercado externo.

O Grupo USJ produz álcool combustível (etanol), açúcares de diversas especificações e energia elétrica. Com duas usinas em operação – S. João (SP) e S. Francisco (GO) – e mais uma em construção (Cachoeira Dourada, também em Goiás), o Grupo USJ está hoje entre os principais grupos sucroenergéticos do Brasil. Possui 96 mil hectares de terras cultivadas (próprias e arrendadas). O número de moagem de cana na safra 2009/2010 (estimado) em oito milhões de toneladas.

Os ventos parecem estar soprando a favor do setor sucroalcooleiro. Apesar de lidar com as inconstâncias climáticas que influenciaram a colheita da safra e as sombras que ainda cercavam a economia pós-crise – pelo menos nesse primeiro semestre do ano – o setor hoje só tem a comemorar. A alta dos preços dos produtos relacionados, tanto para o mercado interno quanto ao externo são os responsáveis por esse bom resultado.

No início de 2010, a manutenção da alta demanda de açúcar pela Índia apontava que o setor seguiria com o alto preço do etanol no mercado interno e a boa quantidade captada pelas usinas deveria apresentar alta, apesar de ninguém palpitar o volume antecipadamente. Na opinião dos especialistas, isso ocorreu porque em boa parte de 2009 foi de preços baixos, as usinas sem crédito colocaram mais álcool à venda, depreciando ainda mais os preços. A queda refletiu na renda dos produtores. Entretanto, em janeiro de 2010, os cifrões voltaram a subir bastante, chegando a média de R$ 1,13. Se comparado à cotação de R$ 0,78 do início do ano passado, o preço do álcool nas usinas subiu consideravelmente. Já no mercado do açúcar, a média de preços ficaram em R$ 63,66 a saca de 50 quilos, ao passo que em abril de 2009 registrava-se uma média de R$ 46,48 a mesma saca. “O mercado ainda está em recuperação. Em 2010, as usinas começaram vendo perspectivas em seus dois produtos: o açúcar e o etanol. É bom frisar que, o que se vê agora é uma queda nos preços, porém, a nova safra está sendo colhida e o produto novo está com uma qualidade superior, resultando na elevação dos preços. Porém, sem dúvida nenhuma, a atividade está remunerando e as perspectivas são boas, até o momento, o que permitiu as indústrias respirarem”, analisa o representante da União da Indústria de Cana de Açúcar (Unica), em Ribeirão Preto (SP), Sérgio Prado.

Se no início da safra 2009/2010 havia um reflexo de pessimismo, meses depois houve uma transição para o otimismo, especialmente entre os meses de agosto e setembro de 2009, quando os preços do açúcar dispararam no mercado interno e externo. As usinas conseguiram produzir, financiar e exportar tendo fluxo de caixa. “Obviamente, não foram todas. Há muitas renegociando dívidas. Outras ainda enfrentam problemas de liquidez, de falta de crédito e não conseguem obter financiamento para construir estoques ou outros investimentos, apesar da mudança no cenário”, aponta sócio-diretor da Archer Consulting, Arnaldo Luiz Corrêa.

Na opinião dos usineiros, ainda é cedo para dar respostas sobre a situação do mercado. De acordo com o diretor de Novos Negócios do Grupo da Usina São João, Narciso Bertholdi, não há uma uniformidade da situação em que se encontram as unidades produtoras nas diversas regiões do Brasil. “Acredito que só vamos ter uma noção mais correta sobre este tema no final da safra 2010/2011, o que acontece em março ou abril do próximo ano”, diz ele, que representa hoje um dos principais grupos sucroenergéticos do Brasil. “No início de 2010, os preços do açúcar foram influenciados de forma positiva pela grande demanda e pouca oferta. A quebra de safra na Índia, aliado ao baixo processamento de cana no Brasil por causa das condições climáticas desfavoráveis, elevou os preços. Por outro lado, já há uma forte pressão sobre os preços da commodity no mercado mundial neste momento, por conta da previsão de moagem de 600 milhões de toneladas no Centro-Sul do País, e da recuperação da produção indiana, cuja safra se iniciará em setembro de 2010”, conclui. Ainda segundo Bertholdi, em relação ao etanol, muitas usinas brasileiras têm, neste início de ano, vendido a maior parte de seus estoques no mercado interno a preços abaixo do custo de produção, por causa da necessidade de caixa para financiar a safra atual. “Isso é preocupante para o setor”, argumenta.

Cenário da Safra

O fato é que o setor vive um cenário bom para o açúcar, cuja oferta está menor do que a demanda. Já o etanol, as usinas mostraram que há uma necessidade urgente da construção de um estoque regulador, a fim de se evitar escassez do produto e a consequentemente flutuação de preços no mercado. “O Brasil precisa crescer 11% da sua produção de cana nos próximos quatro anos. No entanto, é necessário investimento de US$ 35 bilhões e isso é muito investimento. Isso faz com que nos próximos anos o mercado sofra por algum problema de oferta do etanol e afetarão preços futuros”, analisa Corrêa.

No entanto, as previsões confirmam que há um processamento de cana maior nesta safra. “Mas, muito mais porque a safra passada foi fraca, por causa do excesso de chuvas, e não porque houve aumento da área plantada no canavial”, explica Bertholdi, do Grupo da Usina São João.

Hoje 90% da safra nacional vêm da região do Centro-Sul do País. Nesta área, a moagem de cana-de-açúcar na alcançou 35,13 milhões de toneladas na primeira quinzena de maio deste ano, um crescimento de 4,20 milhões de toneladas em relação à segunda quinzena de abril. No acumulado desde o início da safra, a moagem totalizou 93,86 milhões de toneladas, contra 73,85 milhões para o mesmo período da safra passada, segundo dados divulgados no início do mês de junho, pela Unica. Na primeira quinzena de maio, a proporção da cana destinada à produção de açúcar alcançou 43,89%. Em relação à quantidade de Açúcares Totais Recuperáveis (ATR), por tonelada de cana, na primeira quinzena de abril, foram 126,96 quilos (kg) de ATR/t, cifra praticamente idêntica a do mesmo período de 2009 (126,46 kg de ATR/t). No acumulado desde o início da safra 2010/2011, a concentração de ATR ficou em 118,30 kg por tonelada de cana, contra 117,32 kg obtidos na safra anterior, segundo dados da entidade.

Etanol

Dados da Unica apontam que as vendas de etanol pelas unidades produtoras da região centro-sul do Brasil cresceram 5,39% em relação à quinzena anterior, totalizando 1,02 bilhão de litros, contra 965,17 milhões observados na segunda quinzena de abril desse ano. Desse total, 920,00 milhões de litros foram destinados ao mercado doméstico, um crescimento 3,33% em relação à quinzena anterior, quando foram vendidos 890,32 milhões de litros. Na primeira quinzena de maio, as vendas de etanol hidratado no mercado interno totalizaram 666,40 milhões de litros. Já as vendas de anidro, estimuladas pela volta da mistura de 25% do produto na gasolina, apresentaram um crescimento de 18,66% em relação à quinzena anterior, alcançando 253,59 milhões de litros.

E as perspectivas para o setor são boas e são a longo prazo. Para o consultor da Archer, as perspectivas são as melhores para o próximo ano. “Existe um crescimento de consumo bastante elevado. Se olharmos o consumo de etanol, estimado para os próximos anos, haverá a necessidade de consumo de etanol no mercado interno estimado em mais de 40 bilhões de litros e em função de uma realidade, com mais de 70% dos veículos vendidos com a tecnologia flex-fuel, com motores funcionando a gasolina ou etanol”, conclui Corrêa.

Já para o diretor do Grupo da Usina São João, depois de um período de entressafra com oferta escassa de etanol, devido à acentuada queda de produção do último ano provocada pela grande intensidade de chuvas no período produtivo no centro-sul do País, voltou-se a ter ofertas adequadas no mercado. “Levando à estabilidade nos preços ao consumidor final, bem como à reestruturação dos estoques reguladores. Com preços mais competitivos na bomba, a demanda voltou aos níveis históricos do último ano. Além disso, há uma projeção de aumento de 8% nas vendas de automóveis no Brasil em 2010, e a maioria desses veículos será flex-fuel, o que gera uma expectativa de aumento de consumo de etanol da ordem de dois bilhões de litros”, aponta Bertholdi.

Açúcar

Quanto ao açúcar, na primeira quinzena de maio a produção totalizou 1,86 milhão de toneladas. Já a de etanol neste período foi de 1,46 bilhão de litros, sendo 384,80 milhões de etanol anidro e 1,08 bilhão de hidratado. No acumulado desde o início da safra, a produção de açúcar chegou a 4,43 milhões de toneladas, e a de etanol alcançou 3,78 bilhões de litros, sendo 829,0 milhões de etanol anidro e 2,95 bilhões de etanol hidratado. “No ano passado, houve uma recuperação do preço do açúcar devido à queda de exportação na Índia e a demanda de consumo pelo produto no mercado interno, reflexo dos bons resultados da economia, fez com que o Brasil se beneficiasse. Agora o rumo dos preços, até outubro, dependerão mesmo do andamento da safra. Além disso, dependerá do mercado indiano que pode voltar comprando”, analisa Corrêa.

De fato, no início da safra 2009/2010 havia muita preocupação com a real demanda de açúcar no mundo, e isso deixou os preços em patamares baixos. “Contudo, ao longo do período, duas coisas aconteceram: de um lado, percebeu-se que a safra indiana seria bem menor do que o esperado. De outro, choveu excessivamente no País no segundo semestre de 2009, o que dificultou e até impediu o processamento de grande quantidade de cana, diminuindo sensivelmente a oferta de açúcar e etanol. Muitas usinas puderam antecipar o início da moagem na safra 2010/2011 porque ainda tinham cana para processar da safra passada, que não havia sido colhida. Com relação ao próximo semestre, o momento ainda é de cautela, pois precisamos observar como vai ser a evolução da produção no Brasil e nos demais países produtores, bem como o comportamento do mercado consumidor, tanto de etanol quanto de açúcar”, adverte Bertholdi.


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