Mais
uma vez, a doença foi um dos maiores motivos de preocupação
dos produtores, e deu as caras em todas as principais regiões
produtoras do país. Segundo dados do Consórcio
Antiferrugem, responsável pelo monitoramento da dispersão
da ferrugem asiática da soja pelo país, foram
notificadas nesta safra, até o fechamento desta reportagem,
2.371 ocorrências, principalmente nas regiões
Centro-Oeste e Sul, mas também com números significativos
no Sudeste e no Nordeste. Embora este número seja inferior
ao registrado na safra passada, que atingiu 2.884 notificações
de ocorrência, ainda deve ser considerado alarmante.
Início assustador
Tomando como base o número de ocorrências nos
primeiros meses da safra, até que o resultado obtido
até agora surpreendeu positivamente. O número
total de relatos manteve-se acima do registrado nas safras
anteriores durante boa parte do ciclo. Segundo analistas do
Consórcio Antiferrugem, isso se deveu principalmente
à antecipação da ocorrência da
doença em lavouras comerciais. Em dezembro, já
se registrava o dobro do número de focos comparado
à safra 2006/2007, considerada uma safra referência
de condições de epidemia.
A partir de janeiro, o Consórcio Antiferrugem passou
a fazer prognóstico de risco semanalmente, por intermédio
de mapas de risco climático para cada grande região.
Isso facilitou a indicação para áreas
onde precisou ser intensificado o monitoramento ou a prevenção
da doença. As informações foram passadas
para os produtores através de um informativo. A publicação
foi elaborada pelo Laboratório de Epidemiologia da
UFRGS com a colaboração dos demais membros do
Consórcio.
A maioria dos relatos de ferrugem asiática da soja,
em área comercial, ficou concentrada na região
Centro-Oeste, destacando-se Mato Grosso, com 624 casos; Goiás,
com 501 casos; e Mato Grosso do Sul, com 333 notificações.
O Paraná registrou 265 relatos, o Rio Grande do Sul
405, Santa Catarina 116, São Paulo 32 e Minas Gerais
12. Bahia e Tocantins tiveram ocorrências mais tardias,
mas terminaram com 33 casos e 10 casos, respectivamente.
Problema é sério
A ferrugem asiática é considerada uma das doenças
mais severas que incidem na lavoura de soja e pode ocorrer
em qualquer estádio fenológico da cultura. as
plantas infectadas apresentam desfolha precoce, comprometendo
a formação e o enchimento de vagens, reduzindo
o peso final dos grãos. Nas diversas regiões
geográficas onde a ferrugem asiática foi relatada
em níveis epidêmicos, os danos variaram de 10%
a 90% da produção.
Medidas de controle
Considerando a gravidade da doença, diversos estados
adotaram o vazio sanitário, período
de 60 a 90 dias sem plantas de soja no campo, como uma estratégia
para reduzir a quantidade de inóculo (esporos) na entressafra.
Outra medida de manejo que pode ser adotada é o escalonamento
de semeadura, em relação ao ciclo da cultura.
As plantas precoces passam menos tempo no campo, são
colhidas mais cedo e, desse modo, podem escapar
da doença ou serem menos atingidas. Como na maioria
das regiões não se tem soja no inverno, nas
primeiras semeaduras o fungo iniciaria sua multiplicação,
e a tendência é que o inóculo aumente
com o evoluir da safra. Desse modo, as semeaduras mais cedo
também apresentam um mecanismo de escape quanto à
concentração de inóculo.
A forma ideal de controle da ferrugem é através
da resistência genética, porém, até
o momento, não haviam cultivares disponíveis
comercialmente. A estratégia que tem sido usada
com maior freqüência é o monitoramento da
doença e o controle químico com fungicidas.
A decisão sobre o momento de aplicação
(sintomas iniciais ou preventiva) deve ser técnica,
levando em conta os fatores necessários para o aparecimento
da ferrugem (presença do fungo na região, idade
das plantas e condição climática favorável),
a logística de aplicação (disponibilidade
de equipamentos e tamanho da propriedade), a presença
de outras doenças e o custo do controle. O atraso na
aplicação, após constatados os sintomas
iniciais, pode acarretar em redução de produtividade,
caso as condições climáticas favoreçam
o progresso da doença. O número e a necessidade
de re-aplicações vão ser determinados
pelo estádio em que for identificada a doença
na lavoura e pelo período residual dos produtos.
Efeito colateral
A sojicultura no Brasil teve um marco importante como o aparecimento
da ferrugem asiática. As aplicações de
fungicidas e herbicidas passaram a ser mais freqüentes
durante o ciclo da soja em épocas mais ou menos pré-estabelecidas.
Muitos agricultores, na tentativa errônea de tentar
aproveitar as aplicações de herbicidas em pós-emergência
no início do desenvolvimento e posteriormente de fungicidas
no período reprodutivo, acabam por adicionar inseticidas
em mistura de tanque, sem qualquer consideração
com a real infestação de insetos-pragas na lavoura.
Dessa forma, não necessariamente em decorrência
direta do uso de herbicida e/ou fungicida, mas sim do uso
errôneo de inseticidas em mistura com estes produtos,
os problemas com pragas têm aumentado nas lavouras de
soja nos últimos anos. Para piorar ainda mais esse
cenário, muitas vezes os produtores menos preparados,
ao perceberem uma baixa infestação de pragas,
decidem usar doses de inseticidas abaixo do registrado para
uso na cultura o que é popularmente conhecido como
cheirinho que, segundo a percepção
do produtor, é utilizado na tentativa de prevenir o
surgimento da praga.
Entretanto, é importante salientar que nunca é
recomendada a aplicação preventiva de produtos
químicos para o controle de pragas da soja e nunca
deve ser utilizado nenhum tipo de controle, quando o custo
deste for maior do que o prejuízo causado pelo inseto.
Esse nível de infestação é o que
chamamos de nível de ação (NA). O NA
para lagartas ou desfolhares em geral é de 20 lagartas/metro
de linha de soja ou quando a desfolha for igual ou superior
a 30% no período vegetativo, ou 15% no período
reprodutivo da soja. No caso do complexo de percevejos, em
qualquer cultivar de soja, somente deve-se iniciar o controle
quando houver 2 percevejos (ninfas ou adultos) maiores do
que 0,4 cm por metro de fileira de soja destinada à
industria. Esse nível de ação deve ser
reduzido pela metade quando a finalidade da soja for para
semente. Sendo assim, a única maneira de se saber o
momento certo de usar inseticidas na lavoura é através
do monitoramento com o uso do pano-de-batida.
LUZ NO FIM DO TÚNEL
A partir da próxima safra estará disponível
para comercialização ao produtor uma nova cultivar
da Embrapa que tem resistência parcial à ferrugem
asiática. A BRS 7560, lançada no ano passado,
vai começar a ser plantada em cultivo comercial nesta
safra 2010/2011. Para o pesquisador da Embrapa Cerrados
unidade da Embrapa localizada em Planaltina (DF) Austeclínio
de Farias Neto, a cultivar tem grande potencial na luta contra
a doença que gerou um custo de US$ 1,74 bilhões
na safra 2008/2009, segundo o Consórcio Antiferrugem.
A principal vantagem dessa cultivar é que ela
apresenta uma boa resistência à ferrugem,
comenta Austeclínio, que atuou na pesquisa de desenvolvimento
da BRS 7560. Como conseqüência, ela apresenta menores
danos e perdas de rendimento diante da doença. Em
contato com a ferrugem, a planta desenvolve um tipo de lesão
de resistência, em que quase não há esporulação
do fungo, explica.
Devido a essa característica, a cultivar tem mais estabilidade
de produção em situações de presença
da doença, especialmente quando as condições
climáticas não permitem que fungicida seja aplicado
no momento mais propício. Com a BRS 7560, o produtor
não deixa de usar o produto, mas há uma redução
do número de aplicações, disse.
Outra vantagem é que a cultivar tem ciclo precoce e
é bem adaptada à região do Cerrado.
Outras cultivares Para o plantio na safra 2010/2011,
também chegam ao mercado outras duas cultivares da
Embrapa: BRS Juliana e BRS Gisele. Ambas são transgênicas,
possuem boa resistência a nematóide de galha
e são bem adaptadas a regiões de baixa latitude,
como a Bahia, Maranhão e Piauí. Segundo Auteclínio,
as duas têm o ciclo tardio, com grau de maturidade em
torno de 9.0. Temos boas perspectivas de que elas sejam
bem plantadas na região, enfatiza o pesquisador.
Inimigo
relativamente novo, mas de longa biografia.
A
ferrugem da soja tem como agente etiológico duas espécies
do gênero Phakopsora: Phakopsora meibomiae, agente causal
da ferrugem americana e Phakopsora pachyrhizi,
agente causal da ferrugem asiática. Phakopsora
pachyrhizi é a espécie responsável pelas
recentes epidemias da doença no Brasil, tendo sido
relatada pela primeira vez no Japão, em 1903. Desde
então se disseminou rapidamente pelo continente
Asiático, permanecendo endêmica, porém
com surtos epidêmicos esporádicos.
Na década de 1990 foi relatada pela primeira vez no
continente Africano, em 2001 na América do Sul, no
Paraguai e Brasil e em 2004 nos Estados Unidos. O fungo P.
pachyrhizi pertence ao filo Basidiomicetes, Ordem Uredinales
e família Phakopsoraceae. A espécie foi descrita
com base nas características das estruturas das fases
uredinial e telial.
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