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GESTÃO - PECUÁRIA PRODUTIVA E SUSTENTÁVEL - É POSSÍVEL?
rev 128 - outubro 2008

Tanto é possível que o Brasil naturalmente tem condições para isso. O que é necessário, então? A reposta está num manejo especializado e comprometido. Com um crescimento de 38,5% (comparando os meses de setembro deste ano como o do ano passado) e uma total de US$ 6,810 bilhões, as exportações do agronegócio do País, em setembro, dão o reflexo da força da produção brasileira no campo. No caso das exportações de carnes, o crescimento foi de 66,7% (de US$ 895 milhões para US$ 1,492 bilhão). O resultado deveu-se tanto aos preços mais elevados quanto ao aumento da quantidade exportada. As exportações de carne bovina in natura apresentaram incremento de 55,9% em termos de valor.

Esses foram os dados apresentados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), e que ainda revelam que a redução das exportações de carne bovina in natura para a União Européia foi mais do que compensadas pelo crescimento para outros destinos, com destaque para Rússia (114,3%), Irã (451,5%), e Venezuela (403%).

Nesse ritmo, a pecuária brasileira mostra as potencialidades de um negócio que tem muito ainda a desenvolver, seja sob técnicas melhores de manejo, controle rigoroso em sanidade, melhoramento genético, e sustentabilidade, que é atualmente a bandeira que se levanta para o agronegócio como uma tendência mundial, uma exigência do próprio mercado.

O conceito de sustentabilidade ainda não possui uma definição absoluta. O que se pode dizer de uma produção sustentável é que ela se caracteriza como economicamente viável, que respeita e valoriza as condições sociais (trabalho, cultura e educação), além de estar em equilíbrio com o meio ambiente.

Nesse sentido, pode-se pensar numa pecuária produtiva e sustentável? De acordo com diversos especialistas e personalidades da pecuária e agronegócio do País, isso é possível – e não é uma tarefa difícil. “Trabalhar a pecuária produtiva e sustentável é absolutamente possível, o Brasil tem condições favoráveis quanto a isso”, afirma Sebastião Costa Guedes, presidente do Conselho Nacional de Pecuária de Corte (CNPC). “Não precisamos derrubar mais nenhuma árvore no Brasil para termos pecuária moderna e produtiva. Estamos estabelecendo diretrizes para melhorar a sustentabilidade da pecuária brasileira e a imagem no mercado internacional”, aponta.

A busca do equilíbrio

Emissões de gases, a derrubada de árvores para abertura de pastagens, o tratamento dado ao rebanho são pontos de discussão que tem tomado em encontros, congressos e reuniões de debate sobre a sustentabilidade. Através de um estudo do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP), encomendado pelo Fórum Nacional Permanente da Pecuária de Corte da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), é a partir do investimento de recursos públicos e privados em recuperação de pastagens e a adoção de melhores tecnologias de manejo que está a resposta mais eficaz para neutralizar os impactos ambientais provocados pelas mudanças climáticas e os efeitos da emissão de gases efeito estufa (GEE) do rebanho bovino brasileiro.

Fala-se no mal das emissões de gases produzidas pelos animais. Há dados que, segundo Guedes, mostram um efeito de equilíbrio, no qual as pastagens absorveriam esses gases, garantindo a qualidade do meio ambiente [confira a tabela apresentada pelo Cepea sobre as emissões líquidas da pecuária de corte, que podem ser substancialmente reduzidas pelo seqüestro (absorção) de carbono pelas pastagens]. “Em termos de emissão de carbono, na atividade pecuária tem de se lembrar que há também a fixação de carbono através das próprias pastagens”, destaca. “Temos de trabalhar a questão a produção de pecuária através do balanço entre os índices de emissão e de fixação, e não somente pelas emissões. Se nós intensificarmos mais a pecuária, através de semi-confinamentos, reforma de pastagens, entre outras medidas vamos contribuir enormemente pela redução da emissão de gases”, analisa.

“A pecuária gera muito mais benefícios do que custos em seu processo produtivo”, explica o doutor em economia aplicada e coordenador do grupo de pesquisa em economia da produção pecuária (Cepea/Esalq/USP), Sergio De Zen. “Então a gente tem de mistificar a visão de que a pecuária só gera causas negativas, mas ela também gera efeitos muito positivos”. Para o especialista, para se alcançar a sustentabilidade da pecuária é preciso, primeiramente, melhorar o sistema produtivo, como o aumento dos investimentos na reforma e manutenção de pastagens. Pelas conta de De Zen, para reforma e manutenção de 100 milhões de hectares de pastagens são necessários R$ 58 bilhões. “Só que nesses R$ 58 bilhões a gente gera R$ 110 bilhões de receita, então a análise benefício-custo é positiva e dá 1,8, ou seja ela é quase 80% de retorno sobre aquilo que é investido”, conclui.

Debates como esse, segundo o presidente do CNPC, fortalecerão a discussão e esclarecerão melhor ao produtor o que se refere a sustentabilidade na atividade e o empenho em se investir numa pecuária economicamente mais ativa. Ainda há uma deficiência muito grande sobre do que se trata uma produção sustentável na pecuária. “Nosso objetivo é reunir esses cientistas da agronomia, da fisiologia, geologia, nos estudos de solos, entre outras áreas que possam juntos discutir formas para se alavancar mais a questão da produção da pecuária responsável”, destaca Sebastião Guedes.

A questão da Amazônia

Os conflitos para se estabelecer uma produção sustentável se agravou ainda mais com o Decreto 6.514, de 22 de julho deste ano, do governo federal – ele fala sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelecendo o processo administrativo federal para apuração destas infrações. Muito rígido, o documento impossibilita o desenvolvimento da atividade econômica, segundo especialistas. Para Monika Bergamaschi, diretora da Associação Brasileira de Agribusiness (ABAG), a revisão da legislação é necessária para garantia da viabilidade econômica do agronegócio, bem como a sustentabilidade que ele deve se pautar.

Durante o 7º Congresso Brasileiro de Agribusiness, realizado em agosto em São Paulo (SP) pela ABAG, muitos especialistas debateram sobre a questão da sustentabilidade. Concluiu-se que é por ela que deve se pautar a produção, mas que deve ser garantidos, na legislação, meios viáveis para se chegar nela. Em discurso no evento, o próprio ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes está preocupado com a rigidez do decreto, e com o comprometimento, cada vez maior, de áreas produtivas. “Sabemos que 38% da área brasileira está comprometida apenas com três itens: assentamentos e quilombolas, indígenas e reservas. Temos um estudo completo de todas as formas de reservas, inclusive legais e de preservação permanente. (...) Estamos com 70% da área brasileira congelada. Tenho medo de extinção da área agricultável do Brasil”, declara.

No caso da pecuária, ela não deve ser tomada como a grande propulsora de derrubada de árvores na floresta. O presidente do CNPC lembra que é importante ressaltar que existe um processo no qual, primeiro vem a ação de madeireiros no desmatamento. “Depois vem o minerador, daí vem o pecuarista e agricultura, geralmente familiar, por último”, enumera Guedes.

A pecuária, em especial a desenvolvida na região norte do País, segundo Guedes, fica caracterizada como a que está contribuindo com o desmatamento da Amazônia, lá fora. “Nós temos 30% de nossas florestas, enquanto que os europeus – se considerarmos a porção ocidental – não tem praticamente nada. E eles nos acusam de acabar com as florestas”, ironiza.

Outra questão relacionada ao desmatamento incide na abertura de estradas, de acordo com Virgílio Viana, diretor geral da Fundação Amazonas Sustentável (FAS), durante a exposição dele no congresso da ABAG. “A maior parte do desmatamento da Amazônia, 75%, está concentrado nas margens em um raio de 50 quilômetros das estradas. Sempre que ocorre uma construção ou asfaltamento de estradas há um aumento do desmatamento”, declara. A saída, segundo Viana, deve se pautar no melhor desenvolvimento da ferrovia e hidrovia.

“Conservar a floresta é fundamental para a sustentabilidade do Brasil, e do Agronegócio por duas razões”, explica Viana. “Primeiro, por causa da imagem. O agronegócio tem a incômoda imagem de ser o vilão da Amazônia. Segundo, pela importância do ponto de vista de produtividade de agropecuária, relacionada com a chuva”.


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