Edições Anteriores


ALCACHOFRA - AS EUROPÉIAS DE SÃO ROQUE
rev 128 - outubro 2008

Flor tradicionalmente européia e que chegou ao Brasil há mais de cem anos, como iguaria, a alcachofra – conhecida pelo sabor único e de extrema versatilidade –, está deixando de ser um artigo de luxo e se popularizando em todo o País. Isto, pelo menos, para 12 produtores da hortaliça da cidade de São Roque (60 km da cidade de São Paulo). A maioria deles está na segunda ou terceira geração de agricultores que iniciaram a lavoura, sem fins comerciais, há mais de 60 anos. A produtora, Ana Lídia de Camargo Ortmann, e o seu esposo, José Ortmann, por exemplo, fazem parte deste grupo. Nos dois hectares, do Sítio Cacique, no bairro Sorocamirim, é possível ver nestes meses, um jardim de flores roxas (justamente, conhecida como alcachofra “Roxa de São Roque” – uma variedade desenvolvida pela Embrapa Hortaliças –, e que se adaptou muito bem ao clima da cidade).

Lá, eles transformam 560 da safra colhida de 2.500 pés, em conservas de alcachofra. “No início, vendíamos a flor in natura, mas com o preço em queda não ficamos mais satisfeitos. Então, há uns quatro anos, investimos na produção de conservas. E deu certo”, justifica Ana Lídia, que se tornou produtora comercial há 12 anos.

Como vende as alcachofras em conservas, a produção requer um trabalho artesanal e muita mão-de-obra – já que não existe nenhum tipo de máquina capaz de extrair o miolo da flor – a produtora instalou uma cozinha industrial e contratou 12 funcionários bem treinados. Hoje, os Ortmann afirmam que até diminuíram a produção de alcachofras e agora compra de terceiros. Tudo para atender a demanda da fabricação das conservas, que além das alcachofras, tem berinjela, alho e tomate seco.

Atualmente, o casal produz 37 mil vidros por ano só da flor em conservas (à base de sal, óleo de milho), que saem de São Roque diretamente para grandes mercados da capital. Cada vidro é vendido para o atacado na média de R$ 14 e chegam a ser revendida, no varejo, por valores acima de R$ 20. “Por não conter conservantes, elas estão prontas para serem consumidas em vários pratos. A alcachofra é capaz de enriquecer pratos doces ou salgados, graças ao seu sabor original. Hoje, além de fornecemos aos nossos clientes fixos, que vem buscar diretamente aqui, atendemos a muitos restaurantes, pizzarias e empórios finos de São Paulo”, diz.

Segundo a produtora, a cultura da alcachofra é muito delicada. Elas são muito suscetíveis às pragas e doenças. A planta exige clima ameno (não tolera frio intenso e úmido), prefere solo em declives, não suporta encharcamento, mas necessita de irrigação quase que diariamente. O plantio de março a abril é feito após a colheita, que acontece entre setembro e novembro, com os brotos ou as mudas que surgem no verão ao redor das plantas adultas. Por ser uma cultura perene, produz por quatro a sete anos, sem a necessidade de novos plantios. As folhas são grandes, bastante recortadas de cor verde com tendência para cinza-clara. “Dizem por aí, que a alcachofra é cara, mas na verdade ela dá muito trabalho para ser produzida”, argumenta a Ana Lídia Ortmann.

Cada pé chega a produzir de 8 a 10 flores de alcachofra. Atualmente, são quatro as variedades mais encontradas no mercado: Roxa Comprida, Roxa Romana e Verde Redonda, sendo que a mais consumida e a mais plantada é a Roxa de São Roque.

Por reunir boas condições, o plantio de alcachofra em São Roque ocupa 37 hectares de terra, equivalentes a 74 campos de futebol, área 37% menor do que a ocupada pela cultura da uva. “Produzimos uma vez por ano a alcachofra Roxa, mas nós nos orgulhamos, pois somos os únicos a produzir a hortaliça no seu tempo certo, de forma natural, sem uso de hormônios que forçam uma produção durante todo ano”, menciona Ana Lídia. Segundo ela, o consumo nos últimos anos tem aumentado bastante. “Graças à boa divulgação, promovida pela festa realizada na cidade, a alcachofra está sendo mais conhecida”, finaliza.

Em Nome do Roxinho

Dario Antonio de Moraes, um dos maiores produtores da região, apostou na lavoura da alcachofra há muito tempo atrás. Lá, em sua propriedade o plantio é diferenciado, ou seja, as flores são ensacadas. De longe, o cultivo até parece uma “plantação de jornal”. Mas todo este cuidado tem explicações: “A medida valoriza os botões, que são embalá-los individualmente com sacos de papel, servindo para protegê-los do sol direito e impossibilita que a flor mude de cor. O sabor não muda, mas quanto mais roxo for o produto, maior o seu valor de venda”, diz o produtor, que revela o segredo para as flores ficarem bonitas, protegidas de chuvas, doenças e da aplicação de agrotóxicos.
Na propriedade do Dario, que começou há mais de 15 anos com apenas 100 mudas, hoje são aproximadamente três hectares de alcachofra, produzindo 15 mil pés. Além disso, há também uvas de vinho e hortaliças. No entanto, nas terras adubadas e bem irrigadas, as vedetes são mesmo as flores da alcachofra. Ao contrário dos Ortmann, a flor é vendida ‘in natura’ e o preço comercializado chega em média a R$ 1,50 reais. “Hoje, comercializamos para restaurantes, hotéis e para as feiras da cidade”, menciona o produtor que também é feirante. “Em média, os preços das alcachofras são razoáveis, mas dá pra se manter”, diz.

Na época da safra, Dario emprega entre três e cinco funcionários para auxiliar no trabalho. Lá, também como a maioria dos produtores conta basicamente, com a mão-de-obra familiar.

Tudo Aproveitado

Como terceiro produtor de alcachofras do Estado, perdendo apenas para Piedade e Ibiúna, o cultivo da alcachofra (além de trazer divisas para a cidade de São Roque), atrai todo ano um grande número de turistas para a Expo São Roque – Alcachofras, Flores e Vinhos –, que este ano chega à sua 16ª edição. Durante o evento, a alcachofra é colhida e vendida no mesmo dia. Os produtores, além da venda da flor in natura, comercializam as folhas da alcachofra para indústria farmacêutica, para a fabricação de produtos de beleza e medicamentos e as conservas, tanto de botões – o saboroso coração da iguaria – como os fundos.

Neste ano, a cidade espera colher 500 mil unidades da hortaliça e aguarda um público de 70 mil visitantes, durante o mês de outubro. “São pessoas a fim de degustar diversos tipos pratos preparados com alcachofra como risoto, pastel, strogonoff, patê, entre outros”, conta o coordenador da Expo São Roque, Antonio Roberto Renzo. Na opinião dele, a cidade de São Roque se transformou em uma das maiores produtoras de alcachofra, por um motivo especial: “O clima e o solo ajudaram, mas sem dúvida nenhuma, a mão do produtor contribuiu para este status”, diz Renzo.

A alcachofra é uma flor imatura pertencente à mesma família das margaridas e dos girassóis – a família das Compostas. A flor possui propriedades nutricionais e medicinais. A cada 100 grama comestível é possível encontrar vitaminas do Complexo B, potássio, cálcio, fósforo, iodo, sódio, magnésio e ferro. Além disso, o leve amargor da flor estimula a digestão e surpreende os olhos de qualquer um, quando em sua fase final oferece uma beleza e cor à plantação.

De acordo com Lina Sgueglia de Góes, proprietária do Restaurante Cantina Tia Lina, a parte mais saborosa da flor é o miolo, bastante usado na produção de conservas e para a preparação de vários pratos. “Das pétalas, come-se à parte mais carnuda, e os talos também podem ser aproveitados. Para comer a alcachofra o jeito mais simples é cozinhá-las em água, retirar os espinhos e depois saborear as pétalas com um azeite, vinagre, sal e cebola”, completa Lina.


Edicões de 2008
Volta ao Topo
PROIBIDA A PUBLICAÇÃO DESSE ARTIGO SEM PRÉVIA AUTORIZAÇÃO DOS EDITORES