Não
é de hoje que os problemas gerados pelo ataque de pragas
e doenças na fruticultura formam o calcanhar de Aquiles
para as exportações brasileiras de frutas junto
aos mercados mundiais. As barreiras que hora são de
ordem econômica, hora fitossanitárias, funcionam
como uma espécie de estratégia dos grandes mercados
internacionais para se protegerem do processo de globalização
da economia mundial, que tem como regra principal a produção
obtida a baixos custos. Nos países da União
Européia, EUA e parte da Ásia, essas exigências,
de fundo protecionista, são ainda mais rigorosas. Esta
realidade, na última década, obrigou o Brasil
a tomar medidas austeras de prevenção e controle
sobre sua produção. Dados do ministério
da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, garantem
que, nos próximos anos, o país deve aumentar
em 50% seus investimentos, que hoje são de R$ 30 milhões,
no financiamento de pesquisas para tornar a fruta nacional
sem restrições dessa ordem no mercado mundial.
Antônio
Souza do Nascimento, pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura,
de Cruz da Almas, BA, fala que o, MIP, Manejo Integrado de
Pragas, é atualmente, a ferramenta mais eficiente que
o país dispõem para o controle de pragas e doenças
na produção agrícola. Criado há
pouco mais de 15 anos, na época para controle das lavouras
de grãos, o programa conseguiu expandir seus conceitos
para outros segmentos da produção agrícola,
inclusive a fruticultura, que absorveu em larga escala a maior
parte de suas técnicas. "A produção
integrada é um sistema de exploração
agrária no qual são produzidos alimentos e outros
produtos, mediante o uso de recursos naturais e de mecanismos
reguladores". explica. "Assim é possível
minimizar o uso de insumos e contaminantes pela integração
de práticas de manejo das plantas, assegurando uma
produção agrícola mais sustentável",
conclui.
De
acordo com o técnico da Embrapa, o programa é
formatado para considerar tanto o contexto sócio-econômico
dos sistemas de produção, quanto o ambiente
associado e as dinâmicas populacionais das principais
espécies de pragas. Didaticamente, os agentes são
classificados em dois grupos, sendo as pragas primárias
as que infestam em grandes quantidades e causam danos econômicos
e, portanto, requerem medidas de controle. E as pragas secundárias,
que normalmente ocorrem em infestações menores,
sem causar maiores danos, podendo ser combatidas com medidas
menos agressivas. Em ambos os casos, porém, é
recomendável utilizar todas as técnicas e métodos
compatíveis, buscando adequá-los abaixo dos
níveis de danos econômicos, explica o pesquisador.
O
monitoramento das infestações por pragas e de
inimigos naturais das plantas, (insetos, ácaros e fungos
benéficos) através do uso de agroquímicos
(inseticidas e acaricidas), seletivos, aliado à utilização
da adubação verde com matos plantados no sistema
de consórcio, são algumas prática utilizadas
com sucesso por esse modelo. No entanto, no caso do controle
por meio de produtos químicos é muito importante
que o produtor leve em conta alguns aspectos, como por exemplo
a idade do pomar, explica o técnico. "Desse modo,
quando houver a necessidade de um inseticida não seletivo,
a aplicação deve ser feita direto no foco da
praga ou em ruas alternadas. Para todos os casos, o mapeamento
da área para o conhecimento aprofundado dos organismos
existentes é ponto chave para os bons resultados de
controle".
Preocupação
ambiental
A
realização de pesquisas científicas e
tecnológicas no sentido de contribuir para o desenvolvimento
sustentável da agricultura brasileira é uma
das principais linhas de atuação estabelecidas,
em termos de política ambiental, pela Embrapa Meio
Ambiente de Jaguariúna, SP. Entre os trabalhos da unidade
destacam-se a implantação de projetos para a
formação de agentes multiplicadores de educação
agroambiental. Nesse contexto, vale ressaltar que do ponto
de vista do produtor, os sistemas agroecológicos de
frutas também apresentam vantagens não apenas
porque proporcionam um maior valor agregado, mas também
porque conduzem a uma maior racionalidade no uso de recursos
físicos, naturais e humanos, dentro da propriedade,
valorizando-a como um todo pela melhoria de seus diversos
aspectos: estético, ambiental, econômico e social.
A
redução do uso de gradeamento no solo, aliada
ao manejo consorciado dos matos, inclusive com o uso de leguminosas
nas entrelinhas do pomar, são práticas que contribuem
para favorecer a reprodução e manutenção
de inimigos naturais. Essa técnica, relativamente simples,
diminui o efeito prejudicial da poeira sobre as plantas e
insetos úteis, e evita o corte de raízes que
têm como consequência a infecção
por doenças de solo, por exemplo. O pesquisador da
Embrapa Mandioca e Fruticultura, faz um alerta para o uso
da pulverização com agrotóxicos em volta
do pomar. Segundo ele, essa prática deve ser evitada,
pois agindo assim, o fruticultor estará dando chance
aos inimigos naturais para se estabelecerem no pomar de forma
mais rápida, explica.
No
sistema de agricultura convencional, as práticas de
campo se direcionam para o efeito do desequilíbrio
ecológico existente. Este desequilíbrio gera
a reprodução exagerada de insetos, fungos, ácaros
e bactérias, que acabam se tornando "pragas e
doenças" das lavouras e das criações
de animais. O combate é feito por meio da aplicação
de agrotóxicos nas culturas, buscando exterminar esses
organismos. Contudo, o desequilíbrio quer seja no metabolismo
das plantas, quer seja na constituição físico-química
e biológica do solo permanece. E permanecendo a causa,
os efeitos (pragas e doenças) cedo ou tarde reaparecerão,
exigindo mais aplicações ou maiores doses de
agrotóxicos.
Seguindo
essa linha de raciocínio um questionamento se faz pertinente.
O que é melhor curar? A febre ou a doença que
a provoca? Responder a essa pergunta significa optar pelo
tratamento do efeito (a febre) ou da causa (doença)
de um determinado problema. Assim como no corpo humano habita
uma série de microorganismos que coexistem pacificamente
conosco, na lavoura esses organismos também se encontram
no solo, nas plantas e nos organismos dos animais. Só
quando o corpo e a agricultura se tornam fracos e desequilibrados
em seu metabolismo, é que esses organismos oportunistas
atacam, tornando-se um problema. Isso significa que a origem
do problema não é a existência desses
organismos, mas o desequilíbrio presente ou no corpo
humano ou no ambiente agrícola.
Entretanto,
vertentes que defendem uma agricultura mais orgânica
dizem que o Manejo Integrado de Pragas, nos moldes que ele
se apresenta, com medidas voltadas apenas para otimizar o
uso desses produtos no sistema, atacam apenas os efeitos,
permanece as causas à medida em que todas as práticas
se voltam para o controle de pragas e doenças e não
para o equilíbrio ecológico do sistema. Segundo
os métodos agroecológicos, é possível
aplicar o princípio da prevenção, fortalecendo
o solo e as plantas através da promoção
do equilíbrio ecológico em todo o ambiente.
Seguindo essa lógica, o controle agroecológico
de insetos, fungos, ácaros, bactérias e viroses
é realizado com medidas preventivas, tais como: plantio
em épocas corretas e com variedades adaptadas ao clima
e ao solo da região, rotação de culturas,
adubação verde, uso da adubação
orgânica, cobertura morta e plantio direto.
Resultados
na prática
A
produção integrada é um sistema de exploração
agrária que mostra resultados excepcionais em todas
as regiões do país. Quanto à distribuição
de ações de pesquisa, em nível da atuação
de subprojetos, dentro dos diferentes eixos nacionais de integração
e desenvolvimento, tem-se, em ordem decrescente, a seguinte
concentração de esforços: Vale do São
Francisco (31,0%), Circuito Transnordestino (29,8%), Rede
Sudeste (9,9%), Sul (7,9%), Araguaia-Tocantins (5,6%), Arco
Norte (4,8%), Madeira-Amazonas (4,8%), Oeste (3,2%) e Sudoeste
(3,2%). Segundo dados da Companhia de Desenvolvimento do Vale
do São Francisco e do Parnaíba, CODEVASF, a
fruticultura no Vale do São Francisco tem experimentado,
nos últimos anos, um vertiginoso crescimento. A área
plantada atinge cerca de 100 mil hectares, incluindo as áreas
privadas, tendo essa atividade apresentado, nos últimos
três anos, um crescimento médio de 9 mil hectares
ao ano. O crescimento verificado tem-se mostrado particularmente
expressivo no caso das culturas de banana, coco, goiaba, manga,
pinha e uva. Na verdade, o mercado é o grande sinalizador
dessas tendências, e os fruticultores, atentos, acompanham
esta movimentação, sempre em busca de melhores
oportunidades.
A
região Sudeste representada pelos estados de São
Paulo e Minas Gerais, possuem um circuito de fruticultura
também bastante promissor. Os inúmeros projetos
abastecem na sua maioria o Ceagesp, que redistribui para diversas
regiões do país e do exterior. Nico Benassi,
produtor de uva no município de Jundiaí, SP,
mantém uma produção de cerca de 400 mil
pés da variedade niagara. Benassi conta que com algumas
medidas simples no manejo ele aumentou em 50% a produtividade
do parreiral, além de garantir o controle sobre a infestação
das principais pragas e fungos. O adensamento entre os pés,
passando de 80 para 60 cm, mais a diminuição
dos brotos nos cachos, são práticas que segundo
o produtor, melhoram sensivelmente a qualidade dos frutos.
A
cobertura morta próximas aos canteiros, é outra
técnica utilizada com bastante sucesso na propriedade
para manter a umidade do solo em período de pouca chuva.
Nos 70 mil pés mantidos no sítio São
João, o produtor faz cobertura em praticamente todos
os lotes. Na comparação com outras épocas,
o produtor diz que a realidade da propriedade é completamente
outra, tanto na produtividade por área quanto na qualidade
da uva que vai para o mercado. "As vantagens de se utilizar
as técnicas da produção integrada o produtor
sente no momento da comercialização do produto",
observa o produtor. Quanto a aplicação de defensivos,
Benassi fala que a profissionalização que envolve
a atividade, nos dias de hoje, não possibilita que
nada transcorra fora das normas de controle fitosanitário.
Os produtos são aplicados seguindo receituários
iguais ao de um médico, tudo inspecionado periodicamente.
Antônio
Donizetti de Oliveira proprietário do Sítio
do Tanque, no município de Jarinú, SP, é
produtor de pêssego, ameixa e nectarina, mantendo uma
produção de 25 hectares, fala que sem profissionalismo
é impossível sobreviver dentro da fruticultura.
É preciso obter uma infra-estrutura que possibilita
ao produtor um controle rígido sobre todas as etapas
da produção, desde o plantio com mudas especiais
até a armazenagem em câmaras frigoríficas
e processo de seleção e distribuição,
tudo seguindo normas rígidas de inspeção.
Segundo Donizetti, um pessegueiro se torna economicamente
viável a partir do terceiro ano após seu plantio.
Com a utilização de técnicas de fertirrigação
por gotejamento, cobertura vegetal junto aos pomares e práticas
como a ralhação, o produtor mantém uma
produção anual de 35 mil quilos de frutas por
hectare plantado.
Segundo
ele, a ralhação do frutos é uma prática
bastante utilizada e consiste em arrancar cerca de 80% dos
pêssegos do pé, como forma de diminuir a competição
por nutrientes entre frutos na planta. Dessa forma, as frutas
que ficam crescem em média 50%, elevando a produtividade
por área. O controle biológico se dá
pelo aumento da oferta de cobertura orgânica no solo,
atraindo a atenção dos fungos que deixam o pessegueiro
em paz. Além dessa técnica o produtor controla
a ação de outros agentes, mais visíveis
como o morcego frutífero e um caramujinho que ataca
os frutos do pessegueiro com técnicas simples mas eficazes.
Para os morcegos, o produtor preparou uma plantação
de bananas, estrategicamente localizada, que serve como isca
para atraí-los. Para acabar com o caramujinho, um galinheiro
repleto de galinhas d'Angola (comumente utilizadas no controle
natural da cigarrinha) dá conta do recado.
Na
lavoura do morango, a produção utilizando o
manejo integrado, também se mostra presente nas práticas
do dia a dia. Além da aplicação de defensivos,
rigorosamente controlados, o produtor Élcio Spinassi
diz que o manejo diário dos canteiros é indispensável
para garantir a saúde do morango. Bastante sensível
a ação de fungos que se proliferam com excesso
de umidade, a irrigação por gotejamento também
faz parte da paisagem do canteiros. Spinassi conta que houve
épocas em que safras inteiras foram perdidas pela ação
devastadora de pragas como o mofo cinzento ou a rizoctônia.
Além desses, as formigas e os pulgões também
causam sérios danos em grandes infestações,
explica o produtor.
Os
14 hectares plantados na fazenda Santa Inês, no município
de Jarinú, SP, garantem no pico da colheita uma produção
diária de 8 mil caixas, sendo que a produtividade média
anual, segundo o produtor, varia de 800 gramas e 1 quilo por
pé. O período de colheita que teve início
em agosto deve se estender até final de outubro.
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