Na
abordagem do tema, desde longa data, prevalece a emoção
sobre a razão. Prova disso, são os debates acalorados,
conflitos, ações repressivas e de pistolagem,
sem esquecer a recente satanização
do integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
MST, promovido, sobretudo em maio último, por alguns
veículos da chamada grande imprensa, talvez numa tentativa
de tirar as mazelas tucanas do foco central dos noticiários.
Essa crucificação de ex-bóias-frias
provocou a reação da igrejas, através
da CNBB, que entre outras coisas, lembrou o cunho social das
reivindicações> No início do terceiro
milênio, o País recua ás primeiras décadas
do século XX e trata reivindicações sociais
não só dos agricultores excluídos
como assunto de polícia. Para alguns, isso é
modernidade.
O presidente da Federação da Agricultura do
Estado de São Paulo Faesp, Fábio de Salles
Meirelles, critica o pleito dos sem terra e cobra ações
enérgicas do governo. Num editorial publicado no boletim
da entidade (maio/00), admite que a política agrária
deixa desejar quanto á ampliação da participação
dos pequenos produtores no processo produtivo e aponta a existência
de um fosso em relação á política
agrícola. Ambas, segundo ele, deviam ser aplicadas
simultaneamente. A Constituição prevê
isso. Porém, como parece haver dificuldades para
essa previsão se concretizar, Fabio Meirelles não
tem dúvidas em afirmar que a execução
da reforma agrária é conduzida por movimentos
políticos, ideológicos e anárquicos,
coordenados por lideranças o acesso á terra,
passando a ser contestação da lei e do sistema
de governo, que se mostra omisso diante das provocações.
Afirma, ainda, que a subserviência do processo
de distribuição de terras ao desejos de grupos
ideológicos gera a redução de investimentos
e, sob última análise, o acirramento da violência
no campo.
Para ele, os vários grupos que lutam por um pedaço
de terra têm conotações meramente
políticas, não só contra os produtores,
mas contra o Estado democrático de direito, esquecendo-se,
provavelmente , que democracia implica a ocorrência
de ruídos, inclusive populações. Lembra,
mais adiante, que os direitos dos agricultores têm sido
frontalmente atacados, estimulando perigosos movimentos
nacionais. Medidas mais enérgicas, acrescenta,
somente foram adotadas após a invasão
de prédio públicos, fato que já ocorreram,
além de desrespeitos, depredações
e verdadeiros abusos, aos milhares nos últimos anos,
no meio rural. Meirelles não centraliza sua insatisfação
no MST, mas acusa os integrantes dessas mobilizações
de incorrerem, diariamente, em diversos crimes, entre
eles violação de domicílio, danos, formação
de quadrilha, fruto, corrupção de menores, cárcere
privado, crimes contra o meio ambiente e lesão corporal.
Ocupar
prédios públicos, um ato legal ou ilegal?
O
presidente da Faesp cobra providências jurídicas
severas contra esses desrespeitos, enfatizado que direito
não se discute é alertando que crimes
comuns estão sendo tratados como se fossem políticos.
Adverte, ainda que essa reforma agrária tem que
deixar de ser reação a movimentos dos sem terra
e tornar-se um programa concreto para quem realmente tem aptidão
com as práticas agrícolas e deseja trabalhar
no setor. Para ele, o projeto de embutir condições
de geração de renda por meio de atividade rural
e, no médio prazo, permitir que haja uma emancipação
da tutela do governo. Finalização, afirma
que os direitos dos cidadãos agricultores devem
ser garantindo com igual afinco que se garantem os dos cidadãos
urbanos urbanos.
Um dos coordenadores nacionais do Movimento dos Trabalhadores
Rural Sem Terra-MST, João Pedro Stédite, discorda,
Segundo ele, numa entrevista á revistas Caros
Amigos (jun/00), a ocupação do
prédio público é legítima, é
uma forma de pressionar o governo. Afirma, ainda que
os prédios ocupados pertencem, na quase totalidade,
á Receita Federal e o objetivo é fazer pressão
sobre o Ministério da Fazenda, núcleo central
do governo. Garante que não houve depredações
ou cárcere privado, durante essas operações.
O funcionário permanece nas instalações
até para evitar que alguma coisa desapareça
e n[os sejamos responsabilizados. Ele também
admite que houve um crescimento no número de ocupações,
desde o início do governo Fernando Henrique Cardoso.
Ao que diz, até 1995, o total de ocupações
girava em torno de 100/120, por ano. Da atual administração
para cá, aumentamos a média para 400/500,
por ano, pois o maior fomentador do MST é o governo,
cuja política cria pobres no campo, cada vez mais.
Essa pobreza, conforme Stédile, acontece em função
do projeto tucano que quer a agricultura brasileira
igualzinha aquelas pradarias do Mississipi (EUA), com grandes
fazendas computadorizadas, produzindo grãos para a
exportação. Os técnicos do governo pertencem
da tese que, no mundo moderno capitalista, só as grandes
empresas são capazes de abastecer mercado. Além
disso, acrescenta, há um estudo feito por instituições
governamentais revelando que nenhuma propriedade do
Brasil, com menos de 50 hectares, está conseguindo
renda equivalente a um salário mínimo e alerta
que, se não mudar a política agrícola,
será instalada uma bomba migratória, nos próximos
anos. Segundo ele, de 8 a 13 milhões de pessoas
que vivem no meio rural, sobretudo no Nordeste, irão
para as cidades, vai um caos.
Essas situação caótica parece já
ter começado, no entender do deputado Waldomiro Fioravante
(PT/RS), que no plenário da Câmera Federal não
só criticou os pacotes agrícolas lançados
pelo governo por não surtirem efeitos significativos
e até agravarem o problema. Isso porque, segundo ele,
nos últimos anos a irresponsabilidade de Fernando
Henrique Cardoso para com a agricultura brasileira já
produziu o sumiço de 1 milhão de estabelecimentos
rurais com menos de 100 hectares. Em função
dessa política distorcida adotada pelo governo, acrescenta,
4 milhões de pessoas abandonaram o campo em
direção ás cidades provocando o inchaço
das periferias e, por conseqüência, o aumento da
criminalidade.
Planalto
articula críticas na grande imprensa
O
fogo cerrado mantido na chamada grande imprensa, na opinião
de Stédile, é resultado de articulação
precisa do Palácio do Planalto com os órgãos
que ele tem sob controle e de jornalista, individualmente.
Para nós, essa operação, ao invés
de mostrar força, demonstra fragilidade. Pois o governo
sabe que a insatisfação popular é crescente
e ele não tem mais mecanismos de políticas econômica
ara poder contra-arrestar a gravidade do problema social.
O neoliberalismo ou globalização, acrescenta,
está sendo um fracasso na América Latina
inteira. Nos países com melhor nível de organização
social ou territorialmente menores, ocorreram reações
populares e as elites tiveram que adotar um discurso de esquerda
para ganhar as eleições.
Para Stédile, que coordena as reivindicações
de 4 milhões de famílias, no Brasil a frustração
da sociedade com o governo é muito grande e há
condições para que as movimentações
de massas saiam do refluxo em que se encontram. Por isso,
embora sejamos pouco representativos , ele resolve bater no
MST porque somos um mau exemplo com as nossas manifestações,
nas quais pregamos: Ó, que é pobre, trabalhador,
só tem um jeito, se organize e vá para a rua
protestar. A única saída do governo é
abafar, apagar esse fogo antes que ele se alastre. Independentemente
dessa tentativa governamental, a semente parece ter germinado
e, segundo ele, o que antes era Movimento dos Sem Terra pela
reforma agrária e contra a política do governo,
se multiplicou em outros movimentos como o de pequenos agricultores,
mulheres rurais alguns setores do sindicalismo, em várias
regiões do País, todos reivindicando melhores
condições de vida.
Na mesma linha de raciocínio, o presidente da Associação
Brasileira de Reforma Agrária Abra (em fase reestruturação),
Plínio de Arruda Sampaio, também assessor da
FAO Organização para Agricultura e Alimentação,
das Nações Unidas, acredita que a atual política
de assentamento do governo Fernando Henrique Cardoso não
vai mudara estrutura fundiária nunca. O número
de assentamentos é menor que o necessário para
operar essa transformação no campo. Pelo
Índice de Gini, as alterações já
ocorridas mostram um nível infinitesimal em relação
ás reais necessidades. No mais, o assentamento fica
inviabilizado pela falta de crédito, preço pago
ao produtor e os valores cobrados pela indústria de
insumos. É preciso criar instrumentos de proteção
aos manifúndios. São 5 milhões de pequenos
produtores que não têm milhões financiamento,
acesso ao mercado, sem seguro rural, entre outras condições
básicas, carências que podem justificar
as ocupações de instalações públicas
como forma de pressão ao governo para liberar recursos.
Em
dez anos, conflitos mataram quase mil pessoas
Normalmente
frios, os números mostram um quadro meio adverso da
situação e reforçam a eloqüência
tanto das ações repressoras (de iniciativa pública
ou privada), como das reivindicações que, nos
últimos tempos, têm sido rotulados de fascistas
e badernas quando, em épocas não
muito remotas, eram classificadas de comunistas.
Entre 1985 e 1986, a Comissão Pastoral da Terra- CPT,
da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB, registrou
966 assassinatos decorrentes de conflitos fundiários
no País. Essa guerra não declarada ocorre em
todo o território nacional mas, com especial ênfase,
no Oeste do Maranhão e no Leste do Pará, seguidos
de perto pelo Norte do Mato Grosso e Rondônia. A tática
de ocupar terras ocorre em outras regiões, mas sem
a intensidade verificada nas áreas mencionadas. Em
São Paulo, o Pontal do Paranapanema, tempos atrás,
foi palco de um combate, com trocas de tiros e agressões
verbais, entre a União Democrática Ruralista-UDR
e o MST, que atualmente vivem um período de trégua,
supõe-se. A recente e questionável prontidão
do Exército em Buritis (MG), para bloquear uma suposta
ocupação da fazenda pertencente a parentes do
presidente da República, também ajuda mostrar
o clima em que o assunto é tratado.
Os dados da CPT constam de um trabalho realizado pelo Ipea-
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, do Ministério
do Planejamento, sobre a Situação social
e demográfica do beneficiários da reforma agrária:
um Atlas. O Estudo foi elaborado pela professora adjunta
da Faculdade de Ciências Econômicas, da UERJ,
e integrante da diretoria de pesquisa do Ipea, Maria Beatriz
Albuquerque David, com a colaboração de dois
franceses estudiosos da questão agrária. Em
sua análise, lembra que, nas últimas décadas,
foram implantados programas de colonização ,
regularização fundiária e desapropriações
para enfrentar a questão do acesso á terra,
no País. Porém, constata, essas medidas têm
sido empregadas mais para atender a pressões
sociais e políticas, freqüentemente explosivas,
não objetivando um desenvolvimento rural duradouro,
relacionado a incrementos sustentados da produção,
produtividade e do emprego, que resultariam em melhoras na
qualidade de vida da população. Para ela,
é preciso um plano de reforma agrária que transforme
as condições de vida agrária que transforme
as condições de vida de seus beneficiários
e esteja inserido numa estratégia produtiva para assegurar
a sustentabilidade dessa agricultura. A agropecuária,
acrescenta, deve ser pensada não só como meio
de sobrevivência das famílias, mas, principalmente,
como fonte geradora de excedentes que permitam novos investimentos
e a ampliação tanto do volume de produção
quanto da produtividade do setor.
Mencionando os vários programas implantados, Maria
Beatriz recua ao Governo Sarney (1985/98) que previa beneficiar
1,4 milhão de famílias, mas assentou apenas
90 mil, menos de 6% da meta. Abrindo um parenteses,
diz a lenda que a ocasião o presidente José
Sarney pediu a um dos coordenadores do projeto de reforma
agrária, José Gomes da Silva, que elaborasse
um mapa dos conflitos existentes no País. Ao receber
o documento com as regiões assinaladas em vermelho,
Sarney teria dito: Caramba, o Brasil está menstruado.
Já o Governo Collor (1990/92), prometeu terra
para 500 mil famílias, mas, na prática, interrompeu
tanto o processo de inscrição de novas terras
ao cadastro como as desapropriações. Na seqüência,
o Governo Itamar Franco (1992/94), anunciou que assentaria
20 mil famílias, em 93, e outras 60 mil, em 94, contemplando
apenas 12,6 mil no período em que ocupou a Presidência.
Com relação a Fernando Henrique Cardoso, Maria
Beatriz lembra que, em seu programa de governo, havia promessa
de conceder 400 mil títulos de propriedade. Porém,
após eleito, a meta da campanha foi reduzida para 260
mil famílias, nos quatro primeiros anos de mandato
(1995/98). No primeiro ano foram assentadas 42.912 famílias
(95), no segundo, 62.044 (96), no terceiro, permitindo prever
que a meta fixada, de 80 mil famílias, dificilmente
seria alcançada. No total, foram assentados 125.956
famílias, o maior número numa só administração,
desde o início do processo. Maria Beatriz, ressalta
como importante o fato que os assentados receberam títulos
de propriedade.
O trabalho da professora da UERJ teve como base o Primeiro
Censo da Reforma Agrária do Brasil Relatório
Final, feito em 1.460 projetos oficiais delimitados pelo Incra,
existentes em 31/10/1996, foram identificados 1992.218 beneficiários,
dos quais 161.556 estavam presentes em seus lotes e foram
entrevistados. As operações de campo foram realizadas
por 29 universidades coordenadas pela UNB. A diferença
entre os números de beneficiários e o de entrevistados,
decorre de uma estimativa do Incra sobre a capacidade total
do projeto de assentamento e a totalidade de pessoas efetivamente
assentadas. Dessa forma, nos vários locais 25% das
famílias, em média, não foram encontrados
porque simplesmente não foram assentados; em outros,
pela dificuldade de acesso aos módulos; ou ainda pela
recusa em responder ao questionário, observa
Maria Beatriz.
Sobrevivência
precária nos assentamentos.
A
existência de falhas no levantamento, entre elas a falta
de informações sobre a utilização
das terras, se com culturas ou pastagem, deu origem a uma
pesquisa complementar, por amostragem, em 9 mil explorações,
avaliando os recursos disponíveis e os aspectos produtivos,
incluindo as condições sociais, como acesso
a serviços médicos e educativos, entre outros.
Neste aspecto, afirma que as condições de habitação
e saúde são precárias, sendo que as enfermidades
mais comuns estão relacionadas á inexistência
de saneamento básico e á contaminação
dos lençóis freáticos.
Com relação ao plantio, o milho é a lavoura
mais freqüente nos assentamentos, seguindo, com menor
destaque, do arroz, feijão, cana-de-açúcar,
mandioca e café. A produção, na quase
totalidade, é comercializada com intermediários,
embora atacadistas e varejistas tenham uma participação
menor. Exceto na região Sul, onde as cooperativas recebem
o maior volume das colheitas, nas demais partes do País
agricultores recorrem muito pouco a esse sistema de comércio.
No tocante á pecuária, predominam as aves, com
um estoque médio de 28,7 animais por família,
seguidas pela criação de ovinos, caprinos, suínos
e bovinos, com um rebanho médio de 4 cabeças
por família.
Quanto ás técnicas modernas de produção,
a utilização com mais freqüência
ocorre nas regiões Sudeste e Sul, onde 34% dos assentados
elogiam a assistência técnica prestada, geralmente,
por órgãos públicos. Essas duas áreas
são contraponto ao Centro Oeste, Norte, onde essa assistência
inexiste ou é de má qualidade. A amostra indica
que o ganho médio dos assentamentos supera dois
salários mínimos e que o Sul e o Centro
Oeste apresentam maior concentração da renda.
Outro aspecto que chama atenção, segundo ela,
é o acesso dos beneficiários ao crédito
oficial, pois a pesquisa mostra que o Procera Programa Especial
de Crédito para Reforma Agrária, não
tem funcionado, tanto para custeio como para investimento.
Essa escassez de financiamento, acrescenta. dificulta
e torna precária a inserção do produtor
no mercado, uma vez que há problemas no escoamento
da safra e na agregação do valores ás
mercadorias comercializadas. A comercialização
produção é feita através de associativismo,
sendo que, no Sul e Sudeste, entre 20% e 30% dos contemplados
estão organizados em cooperativas.
Baixada
escolaridade condiciona avanços mais expressivos
Maria
Beatriz faz alerta sobre a existência de agregados (pessoas
que não constavam nos cadastros iniciais, mas ocupam
o lote junto com o beneficiário direto da posse), especialmente
em áreas da região Sul, em alguns casos superando
o número de inscritos desde o início; o abandono
dos lotes mais antigos, na região Norte, chega a 30%;
a maioria dos ocupantes tem a agropecuária como atividade
principal tem a agropecuária como atividade principal
e a exploração é majoritariamente
individual. Porém, no geral, é possível
constatar que, no universo pesquisado, 54% dos assentados
são tradicionais agricultores e camponeses, enquanto
outros 8% atuam no setor como trabalhadores rurais.
A técnica observa que grande parte dos assentados (53,27%)
está envolvida com alguma associação
e em estreita ligação com a igreja.
Quanto á formação dos beneficiários,
Maria Beatriz constata que é globalmente ruim,
pois cerca de 30% são analfabetos. No Nordeste, especialmente
no Ceará, esse índice bate em 60% dos assentados
e no resto da região, a situação é
deplorável. Nos demais Estados os níveis
são mais diferenciados. São melhores no Sul
do que na frente pioneira do Pará. No eixo de colonização
Oeste, Mato Grosso do Sul mostra uma posição
intermediária, mas não muito boa.
Já em Mato Grosso e uma parte de Rondônia, uma
parte superior a 50% dos assentados possui nível de
escolaridade acima da média. Isso ocorre porque 80%
dos entrevistados afirmam ter outra atividade como principal,
sobretudo em Mato Grosso.
Em linhas gerais, conforme Maria Beatriz, a analise das características
dos beneficiários da política de reforma agrária,
mostra, claramente, alguns resultados significativos.
No entanto, são insuficientes qualitativa e quantitativamente.
Nos aspectos quantitativos, como condições
de vida, economia e sociais, o levantamento apresenta
dados poucos expressivos, mesmo com a inclusão
de um conjunto de informações bem agregadas,
mas não regionalizáveis, obtido
pela amostragem complementar. Para ela, o censo apresenta
uma primeira aproximação quantitativa, notadamente
sobre o uso do solo. Entretanto, não permite
uma avaliação definitivamente dos resultados
do plano adotado pelo governo e, menos ainda, identificar
o que mais precisa ser feito nesse sentido.
Modelos
apenas faz remanejamento dos excluídos
Mais
enfático, o ex-presidente do Incra e atual deputado
federal pelo PSDB, Francisco Graziano Neto, afirma que o Brasil
está fazendo a maior e a pior reforma agrária
do planetas. Para ele, é preciso repensar
o modelo que está enriquecendo o MST e deixando os
pequenos agricultores mais pobres. Por mais que esforce,
acrescenta, o governo não vai conseguir fazer
o programa funcionar. A reforma agrária acabou,
disse ele ao jornal O Estado de S.Paulo (22/05/00),
assinalando que os dados oficiais são gigantescos e
incontestáveis.
Recorrendo a dados atualizados, diz que só na atual
administração foram assentados 370 mil famílias
que, somadas ás 150 mil contempladas por Sarney, Collor
e Itamar, além de outras 90 mil aquinhoadas em planos
anteriores, perfazem um total superior a 600 mil famílias.
Essa multidão ocupa mais de 2,3 mil
assentamentos, em várias partes do País, numa
área de 25 milhões de hectares. Só no
atual governo foram distribuídos 12 milhões/ha
e gastos mais de R$ 12 bilhões, um investimento
que não trouxe nenhum resultado. O IBGE, assinala,
não consegue determinar com que percentual os assentados
contribuem para o produto da agricultura brasileira. Tanto
isso é verdade, diz Graziano, que o líder do
MST, João Pedro Stélile afirmou recentemente
que houve um engano ao imaginar que um pedaço
de terra ia melhorar a vida das famílias do campo.
Para o deputado, o MST está sem rumo e
não é mais um movimento social, mas sim político
que quer tomar pela força os meios de produção
e o poder.
O parlamentar tucano acredita que, se o programa continuar
na forma atual, não trará resultado algum, pois
não adianta tirar excluídos da periferia
das cidades para excluídos na zona rural. A
saída, conforme pensa, é elaborar um novo projeto
e fazer com que os recursos sejam aplicados na produção.
Para isso, ele tem uma proposta. O governo usaria uma determinada
área, não importa se desapropriada, arrendada
ou comprada, e criaria unidades de produção
irrigada, de leite ou hortaliças, empregando entre
50 a 100 pessoas. O produto obtido seria canalizado para merenda
escolar do município, dando origem a um projeto casado
de emprego e consumo. Para ele, o velho modelo de reforma
agrária, nos moldes da cepal e da Aliança para
o Progresso já acabou, pois é uma reforma
distributivista, de idéia burguesa, arcaica e superada.
Gastos
com reforma limitam-se a 20% crédito agrícola
João
Pedro Stédile nega e garante que quem politizou o tema
foram as elites que não a querem fazer nem no
sentido clássico quem politizou o tema foram as elites
que não a querem fazer nem no sentido clássico,
a que a burguesia fez no início do século.
Segundo ele, todos que lutam pela distribuição
de terra no Brasil, automaticamente enfrentam o poder,
as elites. Reiterando que não aceita a tarja
de ter feito a politização, enfatiza que o
problema fundiária foi transformado em questão
política pelas elites que se recusam em resolver, concretamente,
a falta de terra, do trabalho r da pobreza do campo.
Talvez o deputado use algum exagero ao afirmar que já
foram destinados R$ 12 bilhões para o programa. Um
outro estudo do Ipea, sobre Financiamento da Reforma
Agrária no Brasil, de 1999, afirma que, nas décadas
de 70 e 80 os gastos com a política fundiária
representavam, em média, apenas 2% do que se
aplicava em agricultura. O trabalho, feito por José
Garcia Gasques e Carlos Monteiro Villa Verde, ambos da diretoria
de Planejamento e Política Públicas do instituto,
acrescenta que, nos anos 90, essas despesas são crescentes
e passam de 4,16%, em 90, para 20,7%, em 96, caindo
para 18,25% em 98. Porém, ressalta que, no contexto
dos vários programas de governo para a agricultura,
a Organização Agrária, rubrica que inclui
o assentamentos, tem sido o terceiro mais importante,
nos últimos 3 anos.
Na pesquisa Gasques e Villa Verde dissecam os gastos com os
vários subprogramas que compõem a rubrica e
mostram, numa tabela, que o programa de distribuição
de terras recebeu, em 95, US$ 1,22 bilhão. No ano seguinte,
96, foram canalizados US$ 1,25 bilhão; em 97, US$ 1,29
bilhão, e, em 98, US$ 1,50 bilhão, valores que
perfazem 82,8% dos gastos totais. O projeto considerado mais
importante, é o de indenização de imóveis
rurais que consumiu, apenas em 1997, US$ 827,1 milhões.
Gasques e Villa Verde afirmam que o subprograma Assistência
Financeira assume importância, a partir de 1995, por
representar o Crédito para a Reforma Agrária
ou Crédito de implantação, utilizado
para dar condições iniciais para os assentados,
compreendendo recursos para alimentação, habitação
r fomento. Ressaltam, ao mesmo tempo, que a maior concentração
de gastos decorre da indenização de imóveis,
através do pagamento ou quitação dos
Títulos da Dívida Agrária _TDA, em 1997,
pela terra nua (78,18%), e benfeitorias (21,82%), feito em
cash pelo governo.
Tesouro
garante 86% do total das despesas
Os
técnicos também apontam como três as fontes
de financiamento do programa, como três as fontes de
financiamento do programa, com os recursos tendo origem no
Tesouro Nacional, verbas arrecadadas diretamente pelo Incra
e os fundos constitucionais, com o total sendo direcionado
para o custeio das atividades o instituto, para o crédito
de implantação e o Procera-Programa Especial
de Crédito para a Reforma Agrária. Segundo afirmam,
o dinheiro do Tesouro é arrecadado através da
emissão de TDAs e da rubrica recursos ordinários,
que são receitas do governo sem destinação
específica, não são vinculados e podem
ser programados livremente. Essa verba é responsável
por 68,86% do total de recursos direcionados por 68,86% do
total de recursos direcionados ao programa e responsável
pela sustentação financeira de 86% das operações.
Quanto ao uso de empréstimos externos, apontam uma
parcela muito baixa, em 97, apenas US$ 29,13 milhões.
Na receita própria do Incra, Gasques e Villa Verde
indicam, como as principais, o adicional de contribuição
previdenciária, que cobra 0,4% sobre a folha salarial
das empresas em geral, e a contribuição industrial
rural, que arrecada 2,5% sobre a folha de pagamento emitida
pela agroindústria. Sobre os TDAs, os técnicos
não informam os técnicos informam os valores
arrecadados. Mas afirmam que, em 26 anos de existência
do papel, foram emitidos, até 98, 75,02 milhões
de títulos, dos quais 30,6 milhões, até
1992. Chamam a atenção, no entanto, para salto
existente no resgate desses títulos: em 94, a União
pagou US$ 12,3 milhões aos portadores e, em 97, essa
cifra bateu em US$ 1.02 bilhão. As previsões
para 99 calculavam que a liquidação do TDA (emitido
pelo Tesouro)exigiria R$ 533,03 milhões e, em 2000,
R$ 584,9 milhões. Já os títulos emitidos
sob responsabilidade do Incra exigiriam, para 99, R$ 25,9
milhões e, em 2000, US$ 11,3 milhões. Ao que
dizem, esses papéis têm grandes aceitações
e financiam mais de 30% da reforma agrária.
O técnicos do Ipea destacam que os proprietários
indenizados questionam na Justiça e ganham
os valores das desapropriações, fazendo com
que os custos iniciais previstos, para esta medida, sejam
quintuplicados. Diante disso, as estimativas de gastos
com indenização giram em torno de US$ 2,7 bilhões,
em 99, pulando, em 2000, para US$ 2,9 bilhões.
ITR
sem vínculos com o programa agrário, um erro
Para
eles, um confronto entre a receita e a despesa permite afirmar
que, sem exagero, de certo modo há um grau aceitável
de eficiência na condução do atual processo
de redivisão da terra. Porém, alertam
que o financiamento com recursos do Tesouro tem a estabilidade
e permanência condicionadas a dois fatores: nível
de atividade econômica e prioridade política.
Gasques e Villa Verde acreditam que o conjunto de receitas
depende do desempenho macroeconômico, que pode ou não
comprometer o a evolução dos níveis de
arrecadação. No geral, acrescentam o conjunto
de fontes de financiamento do programa tem forte dependência
do nível de atividade econômica. A retração
da economia afetará diretamente o volume de recursos
arrecadados, sobretudo ser for levado em conta que as contribuições
previdenciária e industrial/rural das empresas, têm
posição relevante e, com baixa atividade, caem
o emprego e os gastos com a folha salarial.
Com relação ao ITR-Imposto Territorial Rural,
os técnicos do Ipea afirmam que esse instrumento deveria
ser uma fonte natural de financiamento da reforma agrária.
No entanto, não é, o que mostra um desvirtuamento
lamentável, pois a maior parte dos recursos destinados
ao programa não tem vínculos diretos com o processo
de redistribuição fundiária, criando
uma instabilidade financeira, sobretudo ser for considerado
que a alocação de verbas depende de prioridade
política, finalizam.
Na opinião do deputado federal Adão Pretto (PT/RS),
essa ótica prioritária parece inexistir nas
esferas governamentais. Segundo o parlamentar, o governo vai
destinar, neste ano, mais de US$ 150 bilhões para pagamento
de juros e amortização da dívida externa.
Isso é preocupante, pois o Executivo fará
esse acerto cortando recursos da reforma agrária e
do financiamento do Pronaf, sistema de crédito para
pequenos produtores. Para o deputado, esses cortes
seguem á risca a orientação de estrategistas
da segurança nacional, para desmobilizar a luta pela
redistribuição fundiária e estancar a
pressão social por parte dos pequenos produtores.
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