Agricultura

O trabalho dos insetos na lavoura

Projeto mapeou o impacto da polinização na agricultura e na segurança alimentar, que consequentemente influencia a economia e está diretamente ligado ao hábito de vida das pessoas e às mudanças climáticas.

O Fundo Brasileiro pela Diversidade (Funbio), e o Ministério do Meio Ambiente, por meio de uma iniciativa liderada pela ONU, coordenam juntos o projeto Polinizadores do Brasil, que tem por seu objetivo mapear o impacto da polinização na agricultura. A polinização é o transporte de pólen entre as flores que leva à reprodução das plantas. Esse transporte pode ocorrer pelo vento, pela água e principalmente pela ação de animais, os chamados polinizadores, que realizam um serviço gratuito. Ela asse-gura a alimentação, ajuda a manter o meio ambiente em equilíbrio e ainda oferece uma economia de US$ 12 bilhões, segundo dados da Universidade de São Paulo (USP) para os agricultores brasileiros por ano. Segundo Ceres Belchior, analista ambiental do Ministério, o projeto há uma relação com as mudanças climáticas, a segurança alimentar, a economia e o hábito de vida das pessoas. “Hoje, cerca de 75% da alimentação humana depende direta ou indiretamente de plantas polinizadas ou beneficiadas pela polinização animal, um serviço gratuito, que está em risco de desaparecer”.

Já Vanina Antunes, gerente do projeto no Funbio, diz que 78% dos brasileiros desconhecem a importância da polinização para a produção de alimentos, segundo pesquisa inédita do Ibope, encomendada pelo projeto. “Esta foi uma oportunidade importante de diálogo entre a academia e a sociedade. O projeto avançou no sentido de promover a discussão de um tema – polinização e polinizadores – que ficava restrito à comunidade acadêmica especializada no assunto. Levantou e disseminou informações que podem promover mudanças com base no conhecimento científico”, diz. Para ela, os dados contribuem para a promoção da conservação ambiental, com benefícios para a produção agrícola. Desde a década de 1970, o declínio das abelhas tem chamado a atenção de pesquisadores e tomadores de decisão em diversas partes do mundo. Este projeto foi fruto de uma iniciativa internacional, coordenada pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO). Em 2009, foram aprovados recursos do Fundo Mundial para o Meio Ambiente Global (GEF – Global Environment Facility) para apoiar a iniciativa em sete países. São eles a África do Sul, Brasil, Gana, Índia, Nepal, Paquistão e Quênia.

O Ministério participou da proposição e elaboração do projeto junto aos organismos internacionais. Após a aprovação do projeto pelo GEF, houve negociações para definir quem seria o agente financeiro do projeto no Brasil e o Funbio foi selecionado para esta atribuição. Então, o MMA atuou na coordenação técnica-política, enquanto o Fundo agiu na coordenação técnica-financeira do projeto. “Fazíamos o contato direto com a FAO, como envio de relatórios e prestação de contas e acompanhamento direto das atividades executadas pelos parceiros do projeto, Universidades e unidades da Embrapa, distribuídas em 15 Estados brasileiros”, declara Vanina.

Para Ceres é fundamental conscientizar as pessoas que o seu alimento depende de plantas polinizadas. “Sem a polinização animal, a segurança alimentar da humanidade fica claramente comprometida. Só as abelhas, por exemplo, ajudam na reprodução de mais de 70% das plantas cultivadas, que são utilizadas de forma direta ou indireta na alimentação humana”. Segundo ela, existem diversos fatores que colocam este serviço em risco, como o desmatamento, o aquecimento global e o uso indiscriminado de agrotóxicos. “Precisamos urgentemente reverter esta situação. Para saber como melhor agir, o projeto Polinizadores do Brasil realizou uma grande pesquisa sobre o tema”, declara. Vanina comenta que sendo o Brasil um País com forte produção agrícola, é essencial que o conhecimento sobre a importância e o papel da polinização na agricultura seja amplamente divulgado para aumentar a produção de alimentos e a segurança alimentar.

Resultados obtidos

Realizado entre 2010 e 2015, o projeto Polinizadores do Brasil rendeu ao todo mais de 40 publicações, incluindo um plano de manejo para cada uma das sete culturas estuda-das, com recomendações de práticas amigáveis aos polinizadores. Entre as conclusões, que comprovam a importância da polinização para o aumento da produção e a melhoria da qualidade final da colheita, vale destacar que no algodão, as flores polinizadas por abelhas apresentaram um aumento de 12% a 16% no peso da fibra e um incremento de 17% de sementes por fruto. No caju, áreas de plantio distantes no máximo 1 km de reservas de matas, com maior visitação de polinizadores, apresentaram produtividade superior às áreas distantes mais que 2,5 km. A visitação de abelhas aumenta a produção de canola entre 17% e 30%. Apenas 2,7% das flores manipuladas manualmente pelos pesquisadores na cultura da castanha geraram frutos, com índice de 75% de rejeição, enquanto as polinizadas por agentes naturais frutificaram em 10% com nenhuma rejeição observado após 70 dias.

Os gastos com a realização do projeto envolveram recursos de aproximadamente US$ 3,5 milhões, oriundos de doação do GEF e cerca de US$ 21 milhões de contrapartida do Governo Brasileiro.

E os resultados não param por aí. Na maçã, o uso de abelhas sem ferrão (Melipona quadrifasciata), em conjunto com as abelhas africanizadas (Apis Melifera), registrou um aumento de 44% na produção de frutas e de 67% na produção de sementes; na cultura do melão, nos testes realizados com a polinização adequada (uma colmeia de abelhas para cada 3 mil plantas) se constatou aumento de até 150% no número de visitas às flores, com um crescimento de até 15% na produtividade e 50% na qualidade do fruto. E por fim, nos campos de tomate, os tomateiros podem se auto-polinizar, mas, com a visita de abelhas, a frutificação subiu até 12%, os tomates pesam até 41% a mais e geram 11% a mais de sementes. Vanina diz que o projeto objetivou a mudança de hábitos das pessoas e a melhoria nos modos de vida. “Por isso, promoveu o conhecimento sobre o que é polinização e sobre a importância da conservação e uso sustentável dos polinizadores para garantir a segurança alimentar e manutenção da biodiversidade”. Segundo ela, o desconhecimento por parte da população, em especial dos trabalhadores e produtores rurais, sobre o papel dos polinizadores coloca em risco a manutenção deste serviço ambiental que é essencial para a nossa sobrevivência.

“O projeto é a maior iniciativa já realizada no país sobre o assunto e reforça a importância da polinização para a segurança alimentar. É um grande trabalho de pesquisa e análise de dados, que envolveu 18 instituições de pesquisa em mais de quinze estados brasileiros”, declara.

Boas práticas agrícolas

Entre as recomendações de boas práticas agrícolas para a manutenção dos agentes polinizadores, algumas são comuns para todas as culturas. “Manter a vegetação natural próxima às roças, recuperar a vegetação das Áreas de Preservação Permanente (APP) e Reserva Legal, ter plantios consorciados com outras culturas, disponibilizar fontes de água para os polinizadores e evitar práticas destrutivas dos seus ninhos trazem muitos benefícios”, declara Ceres. Segundo ela, se o uso de agrotóxicos for inevitável, que isso seja feito racionalmente, utilizando-se a dosagem recomendada nas instruções das embalagens. Além disso, recomenda-se não aplicar nos momentos em que forem constatadas visitadas de polinizadores no cultivo. “No geral, são ações simples, mas que favorecem muito o serviço de polinização e trazem um benefício direto para a produção agrícola, aumentando a segurança alimentar”.

Investimentos e próximos passos

O desenvolvimento dos vários componentes deste projeto, como geração e consolidação do conhecimento científico sobre conservação e uso sustentável de polinizadores de sete cultivos no Brasil, sistematização, divulgação e capacitação de público alvo a partir da informação gerada, e ainda a discussão de política públicas, envolveu recursos de aproximadamente US$ 3,5 milhões, oriundos de doação do GEF por intermédio do Pnuma e da FAO e cerca de US$ 21 milhões de contrapartida do Governo Brasileiro. Vanina comenta que com os resultados obtidos, será feita a divulgação da importância dos polinizadores na produção de alimentos para a sociedade, em especial crianças, e práticas amigáveis para os polinizadores para produtores rurais. “Também faremos a avaliação do estado de conservação das espécies e planos de ação para recuperação e conservação delas, cujas populações encontram-se em situação de risco”, diz. Já Ceres declara que para os próximos passos, haverá discussão envolvendo academia, setor produtivo e gestores para definição de critérios e revisão da normatização relativa aos polinizadores, especialmente o uso sustentável de meliponídeos – abelhas nativas sem ferrão. “Além disso, definiremos os critérios para priorização da avaliação e monitoramento do estado de conservação deste grupo funcional”.

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